Nesse ano não foi diferente. No último dia da Expointer foi anunciado o seu resultado com pompa e circunstância. Mais uma vez despontam e são enaltecidos setores que sequer estavam presentes até a edição de 1999. Por algum motivo, um deles certamente de cunho ideológico, os motivos de tão redundante sucesso são omitidos. E é hora de refrescar a memória dos “esquecidos” e referenciar os protagonistas desse sucesso atual.
:: Agricultura familiar fecha Expointer com maior volume de vendas no século ::
Tudo começou na Expointer de 1999, a primeira sob o Governo Democrático e Popular coordenado pelo missioneiro Olívio Dutra. Até então o evento era uma exposição de animais que tinha uma longa história iniciada onde hoje é o Parque da Redenção, passando pelo Menino Deus e se alojando a partir da década de 1970 na Fazenda Kroeff, cuja compra se deu sob várias suspeitas, nos tempos pouco transparentes da ditadura militar. As minucias da compra foram até objeto de uma CPI no Parlamento gaúcho. Essa fazenda recebeu o nome de Parque Assis Brasil.
Fica evidente que até então a Exposição de animais era a expressão do poder político dos pecuaristas que a organizavam a seu modo e conforme suas conveniências. E aqui não nego a importância e a pujança da genética da pecuária gaúcha, muito antes pelo contrário. As raças europeias são o que são hoje no Brasil graças a essa evolução em solo gaúcho.
A compreensão do governo Olívio era de que o Parque Assis Brasil é um espaço público e como tal deve ser democrático e abrigar todo o complexo da agropecuária e não só o segmento animal. Essa compreensão, por óbvio, contrariou interesses estabelecidos por décadas e produziu um tensionamento esperado e um debate acalorado e por vezes irracionais. Até o ensaio de uma tentativa fracassada de boicote por parte da Farsul foi encenado.
Pela firmeza e determinação do governo prevaleceu o bom senso e 1999 marca a presença inédita da Agricultura familiar e também a estreia da Feira de Máquinas e implementos Agrícolas, contrariando a posição de quem defendia que aquele era um espaço só para animais e que assim deveria continuar. E aqui convém lembrar que as máquinas agrícolas tinham até então apenas um espaço acanhado para se exibirem. Era a exposição de meia dúzia de laranjas de amostra, sem o modelo de Feira. Nós tínhamos a compreensão de que um segmento industrial que representa cerca de 60% do parque nacional tinha que ser mais protagonista na Expointer.
A presença da agricultura familiar começou com 12 corajosas famílias que levaram seus produtos mesmo com infraestrutura precária e na incerteza quanto a possíveis vendas. O convencimento não foi fácil porque os próprios agricultores familiares nos diziam que aquele não era o espaço deles.
:: Cooperativas assinam adesão ao Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) na Expointer ::
A primeira edição foi sob uma lona preta e piso de uma camada de brita que não resistiu a chuva intensa e em pouco tempo virou um barral. Na semana passada lá no palco do Pavilhão da Agricultura Familiar tive a alegria de conversar com uma senhora pioneira da edição de 1999. Ela me relatava orgulhosa aquela difícil, mas compensatória experiência.
As edições seguintes já foram em condições menos precárias e com a participação mais numerosa, a de 2000 já registrou mais de 30 participantes. Em 2002 nas Assembleias do Orçamento Participativo a população priorizou recursos para a construção de um Pavilhão para abrigar as bancas de venda dos produtos da agricultura familiar e o orçamento de 2003 previa R$ 800 mil para esse fim. Infelizmente, o governo eleito em 2002 não executou o orçamento definido pela população no OP e o pavilhão acabou sendo construído e custeado pelo governo Lula no seu primeiro mandato.
Enquanto a Agricultura Familiar crescia na sua presença e pujança na Expointer, o setor de máquinas agrícolas não deixou por menos. Atualmente ela se soma a expo direto como o grande evento de promoção e vendas do setor em nível nacional.
A Expointer se tornou uma efervescência rururbana, onde os animais e sua incrível genética mantem seus atrativos e sua importância, a agricultura familiar virou uma espécie de point “planetário” e as máquinas agrícolas despertam a curiosidade do público geral e atração por negócios dos interessados diretos.
Os números do balanço apresentado no encerramento expressam isso. Os números anunciados de negócios somam R$ 7,9 bilhões. Mesmo considerando que parte disso ainda depende de concretização de venda, é um número muito expressivo do ponto de vista econômico. Tivesse prevalecido o modelo anterior ao governo Olívio, só 1,4% disso teria se concretizado, a parte referente a venda de animais (R$ 11,7 milhões).
:: Produção da reforma agrária está entre os destaques da Expointer ::
Os agricultores familiares por sua vez fizeram vendas próximo ao do segmento da genética (R$ 8,6 milhões), com o diferencial que beneficia muitas famílias e para muitas delas é a principal venda do ano com o escoamento da produção de meses e meses de trabalho.
A democratização daquele espaço público resultou numa Expointer muito mais representativa, com muito mais protagonistas e sobretudo valorizando quem produz o alimento saudável e proporcionando mercado para o alimento processado e industrializado em pequena escala e muitas vezes de forma associativa.
A edição de 2024 será a de número 25 sob esse formato implantado em 1999 e consolidado nos 4 anos do governo Olívio. Para não depender da grande mídia, que por vezes anda meio esquecida, que os protagonistas dessa história organizem uma celebração que ajude a eternizar mais uma das histórias que engrandece quem a construiu.
* Secretário da Agricultura do governo Olívio Dutra
** Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.
Edição: Katia Marko