O recente assassinato de Mãe Bernadete, líder quilombola, na Bahia, causou comoção nacional
Em homenagem à quilombola Mãe Bernadete e à militante Enid Backes
Os últimos acontecimentos no Brasil, na América Latina e no mundo acenderam um forte sinal de alerta. A democracia pode estar em risco.
No Brasil, as investigações da Polícia Federal, as revelações das CPIs, os julgamentos do STF, por um lado, deixam um rastro de verdade e de se saber o que aconteceu nos últimos anos. Por outro, como em tantos momentos da história brasileira, deixam preocupações sobre o que vai acontecer daqui para frente, como e se a democracia finalmente vai se consolidar, e o país voltar, finalmente, à normalidade democrática e institucional, o que nunca foi e continua não sendo fácil no Brasil.
Importante, fundamental, mais uma vez, estar atento ao papel cumprido pelas FFAA, Forças Armadas, nos últimos anos, quando, mais uma vez, respaldaram um golpe, respaldaram um governo neofascista, respaldaram o rompimento da democracia, respaldaram o ódio, a intolerância, a violência reinantes na sociedade e tudo que atingiu a sociedade em meio a uma pandemia que tirou a vida de milhares e milhões.
Infelizmente, não se vê nem se viu nada novo na história brasileira, especialmente neste mês de agosto. Nunca podem ser esquecidas, especialmente os mais jovens precisam saber e conhecer, duas datas, entre outras tantas da história brasileira do século XX.
A primeira, 24 de agosto de 1954, quando o então presidente Getúlio Vargas suicidou-se sob pressão dos militares e das forças de direita, sempre contra a soberania, os direitos do povo e a democracia. Na sequência, Juscelino Kubitscheck, eleito presidente democraticamente em 1956, quase foi impedido de tomar posse.
A segunda data, 25 de agosto de 1961, quando Jânio Quadros renunciou à Presidência da República, e os militares, aliados às forças conservadores de direita, tentaram impedir a posse do vice-presidente Jango, João Goulart. O governador Brizola lançou no Rio Grande do Sul a Campanha da Legalidade, exigindo a posse do vice-presidente, Campanha que logo alcançou o Brasil inteiro em grandes mobilizações. Jango acabou tomando posse, mas em 1º de abril de 1964 aconteceu o golpe militar, dado pelos militares, com apoio da grande mídia, em especial da Rede Globo, do latifúndio e das elites de direita, tudo contando com apoio dos EUA. Resultado trágico: uma ditadura militar instalou-se no Brasil, a democracia acabou por longos 21 anos, só voltando na metade dos anos 1980, com as Diretas-Já, muita luta e mobilização social.
Nos anos 2010, houve a farsa das pedaladas, um crime que não aconteceu, como a Justiça decidiu definitivamente esta semana, dez anos depois dos acontecimentos. Mas houve um golpe e o impeachment da presidenta Dilma Rousseff, com apoio das FFAA, da grande mídia, em especial da Rede Globo, e da direita latifundiária, escravocrata e ultraconservadora, e, como sempre, dos EUA.
Aconteceu o que aconteceu, na sequência do golpe e do impeachment: a eleição de um genocida, mais um governo de direita, agora neofascista e ultraneoliberal, levando o Brasil ao caos e ao completo isolamento internacional, só revertidos com a reeleição, pela terceira vez, de Lula Presidente da República. A eleição de Lula, como se descobre hoje, aconteceu sob condições desfavoráveis, mentiras e manipulações, e apoio da grande mídia, em especial da Rede Globo, do latifúndio, da direita e elite escravocratas.
O recente assassinato de Mãe Bernadete, líder quilombola, na Bahia, causou comoção nacional (no meu caso, fiquei tristemente famoso porque uma foto minha com Mãe Bernadete apareceu em diferentes espaços e jornais de circulação nacional, foto tirada na Conferência Nacional de Saúde em Brasília). Seu assassinato significa que, em 2023, quilombolas, população negra, indígenas, jovens, mulheres continuam sob a mira das armas e seguem perdendo a vida. Duas perguntas inevitáveis: Quem matou Mãe Bernadete? A democracia não está em risco?
Na América Latina, há os recentes acontecimentos e assassinatos nas eleições no Equador, felizmente parcialmente superadas com o resultado eleitoral no primeiro turno. Mas o narcotráfico ameaça e continua ameaçando a democracia no Equador e outros países, apesar do resultado das eleições no primeiro turno.
E não se pode esquecer a Argentina, que, no meio de uma profunda crise econômica, política e social, ameaça eleger um presidente ultraneoliberal, que é contra a democracia e a soberania nacional, que nem a Rede Globo consegue apoiar.
No mundo, a guerra Rússia/Ucrânia parece interminável, com consequências graves para a paz em plano internacional, além das graves consequências econômicas, políticas, sociais, ambientais.
Impossível não reiterar a pergunta: a democracia está em risco? Sim, está em grave risco. Todas e todos as-os democratas, mundo afora, todas e todos que se preocupam com a Casa Comum, como vive dizendo, escrevendo e pregando o Papa Francisco, entre outros líderes religiosos mundiais, têm que estar ´atentos e fortes´, como diz a canção. A luta, a mobilização social, seja no Brasil, seja na América Latina, seja no mundo inteiro, têm que ser permanentes, incansáveis.
Como diria Paulo Freire, apesar de tudo, ESPERANÇAR. Sempre. Viva Mãe Bernadete, presente! Viva Enid Backes, presente!
Viva a democracia! Longa vida à democracia!
* Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.
Edição: Katia Marko