Rio Grande do Sul

PRIVATIZAÇÃO

Artigo | Gestão Leite/Barbuti na Corsan é reprovada na Câmara Técnica do TCE

Se depender da conselheira relatora, novamente deverá pagar multa pela sua gestão temerária na Corsan

Brasil de Fato | Porto Alegre |
"A venda da Corsan se configurava como um péssimo negócio que o governo Leite estava fazendo com o patrimônio público" - Foto: Arquivo Pessoal

No último dia 18, na sessão da 1ª câmara do Tribunal de Contas do Estado – TCE, a conselheira relatora Ana Moraes proferiu um voto histórico no processo 197280200-217 que tramita naquele Tribunal.

O processo apura a legalidade dos procedimentos adotados pelo governo Eduardo Leite e pela direção da Corsan, em especial a formatação do preço da Companhia (valuation), que redundaram em um leilão com uma única empresa interessada, que acabou por arrematar um valioso patrimônio do povo gaúcho por lance mínimo.

Aos fatos

O leilão foi marcado com preço da estatal estipulado em R$ 4,1 bilhões. Esse valor irrisório foi estabelecido após uma projeção de lucro da Corsan ser delineada por uma consultoria de “notório saber”, contratada por milhões, sem licitação, pela dupla Eduardo Leite, governador do RS, e Roberto Barbuti, presidente da Corsan.

A venda da Companhia não ocorreu na velocidade que o governador previa, já que foi anunciada em 18 de março de 2021 e o leilão foi efetivado somente em 20 de dezembro de 2022. Essa protelação se deu em virtude das inconsistências apontadas pelos órgãos de fiscalização. O adiamento reiterado fez com que a projeção do lucro líquido de 2022, previsto pela consultoria externa, pudesse ser confrontada com o lucro efetivamente realizado no ano de 2022 pela Corsan. Ou seja, a vida real desmentiu com larga margem a consultoria contratada a peso de ouro e paga pelo contribuinte gaúcho.

Com base nesse erro grosseiro, para dizer o mínimo, a conselheira relatora do TCE, Ana Moraes, demonstrou de forma cristalina que o preço estipulado, segundo suas próprias palavras, estava subvalorizado. A venda da Corsan se configurava como um péssimo negócio que o governo Leite estava fazendo com o patrimônio público, além de trazer um prejuízo enorme para os cofres do estado.

Na data do leilão, a diferença entre a projeção de lucro (que embasou o preço de venda) e o lucro realmente obtido já estava na casa dos R$ 460 milhões a maior.

A conselheira demonstrou em um gráfico que o descolamento entre a projeção e o que realmente a Corsan lucrava começou a ficar evidente ainda no primeiro trimestre de 2022. E, como ela mesma apontou em seu voto, o gestor público não tomou providências no sentido de atualizar a projeção e corrigir para cima o preço mínimo da estatal.

A relatora ainda questionou: se erraram para o momento imediato, como confiar no estimado para os próximos 40 anos de contrato?

Vale destacar que, mesmo não tendo custado milhões, a consultoria contratada pelo Sindiágua-RS, anexada ao processo, é que estava certa. E constata o óbvio, a Corsan não pode ter seu valor de venda na mesma cifra do seu faturamento de um ano.

Pelo voto da relatora, as contas de Barbuti na Corsan foram reprovadas e com determinação do pagamento de multa. E o restante da gestão Corsan? Cadê o compliance? E as melhores práticas do mercado? De que adiantou a gestão ter um egresso do TCE-RS como Auditor-Chefe na sua auditoria interna? Onde fica o gerenciamento de riscos? E os processos de governança? O diretor financeiro não quis ver a diferença abissal entre o que o seu setor estava entregando à Companhia como lucro líquido e aquilo que a consultoria havia projetado? Por que todos se calaram? Com todas essas perguntas sem resposta, podemos inferir que o objetivo político era maior do que o interesse público.

Foi preciso o Sindiágua-RS denunciar, o Ministério Público de Contas emitir pareceres alertando e a conselheira relatora manifestar-se em seu voto para demonstrar o grande prejuízo causado ao erário?

Resta saber agora qual a pirotecnia que os conselheiros do TCE tentarão fazer para desqualificar um voto técnico embasado em números. Os fundamentos do relatório final são robustos, factuais, tangíveis, não prestando-se a interpretações. É matemática pura.

Roberto Barbuti, para exercer tranquilamente o cargo de presidente da Corsan, já teve que pagar uma multa significativa em São Paulo para manter seu nome limpo da CVM. Agora, se depender da conselheira relatora, novamente deverá pagar multa pela sua gestão temerária na Corsan.

A vida como ela é.

* Diretor de comunicação do Sindiágua/RS

** Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.


Edição: Katia Marko