As palavras resistência e esperança foram pronunciadas muitas vezes no palco da 29ª edição da Feira Internacional de Cooperativismo e Economia Solidária, a Feicoop de Santa Maria (RS), na tarde chuvosa desta sexta-feira (7). Não tardou, durante as cerca de 2h30 da atividade, os substantivos serem convertidos em verbos, caracterizando que aquilo que era ideia se convertia naquele espaço em ação. “Resistimos ontem, para esperançar hoje.”
Singelamente chamada de “feira de Santa Maria”, a Feicoop demonstrava ali, naquela Praça de Alimentação cheia, apesar da chuva que insistia em cair com força, que é na verdade a feira das gentes e diversidade. É a feira do povo e de quem caminha com ele rumo ao horizonte da utopia, sem pisar em falso.
“Estamos em um tempo novo, reconstruindo a economia solidária e reconstruindo o Brasil”, afirmou Irmã Lourdes Dill, em mensagem de vídeo enviada para o ato oficial de abertura. Mesmo tendo passado mais de dois anos que a religiosa foi separada da obra que tocou ao longo de mais de três décadas de sua vida, ela segue sendo uma presença simbólica marcante no espaço e foi quem recebeu mais aplausos do público na abertura do evento.
“Nós saudamos a continuidade da metodologia, a forma como a Feicoop se mantém como um evento aprendente e ensinante”, afirmou a religiosa que no momento se recupera de uma cirurgia e em breve vai partir em missão para o continente africano, levando consigo o aprendizado construindo ao longo do tempo em que liderou as comissões de tantas feiras.
Outro ponto colocado em evidência na mensagem gravada por Irmã Lourdes é o chamado à ação do Papa Francisco, para “realmar a economia”. O movimento global proposto pelo sumo pontífice, chamado “Economia de Francisco e Clara” encontra justamente em eventos como a Feicoop terreno ideal para ser debatido, planejado e construído.
Ao final de sua mensagem, Irmã Lourdes fez questão de citar justamente uma fala do Papa: "Os rios não bebem sua própria água; as árvores não comem seus próprios frutos. O sol não brilha para si mesmo; e as flores não espalham sua fragrância para si. Viver para os outros é uma regra da natureza. A vida é boa quando você está feliz; mas a vida é muito melhor quando os outros estão felizes por sua causa".
O prefeito de Santa Maria, Jorge Pozzobon (PSDB), fez uma fala breve, reconhecendo a importância da feira que coloca Santa Maria como a capital mundial da Economia Solidária, agradeceu a todos os envolvidos e citou as equipes da prefeitura que se dedicaram ao trabalho do espaço e preparação da infraestrutura montada para bem receber os participantes.
Após a abertura o prefeito reforçou o convite através de suas redes sociais: "Esse é o maior evento de economia solidária da América Latina. A feira vai até domingo e a entrada é gratuita. Por isso, quero convidar todos para virem até o Centro de Economia Solidária Dom Ivo Lorscheiter, no Parque da Medianeira. O Rodrigo Decimo, meu vice-prefeito, e eu passeamos pelos estandes e tem muita coisa boa para ser vista".
José Carlos Peranconi, o Zeca, atual coordenador do projeto Esperança/Cooesperança e, por consequência, também da comissão organizadora da Feicoop, afirmou que ali todas as pessoas são sujeitos participantes, que colocam em prática a inclusão social e o comércio justo. "A Feicoop é uma feira onde se promove e conserva a vida, onde buscamos construir um mundo com justiça social, distribuição de renda e igualdade entre as pessoas."
Zeca agradeceu os esforços de modo especial de cada voluntário e voluntária que empregou sua força de trabalho e seu talento pessoal para levar adiante o ideal sonhado por Dom Ivo e Irmã Lourdes e cravou que o grande objetivo de tudo ali segue sendo “a construção da sociedade do bem viver a partir de uma ética planetária”.
Confira alguns trechos dos pronunciamentos
Rosiele Ludke, representante dos empreendimentos de economia solidária: “A Feicoop é como a terra, é fértil, abriga todas as sementes, dá a vida a toda diversidade. Nosso papel aqui é sermos sementes, é nos deixar ser espalhados com o vento levando conosco a mensagem do esperançar, afirmando sim que uma nova economia já está acontecendo”.
Valdeci Oliveira, deputado estadual (PT): “Aqui sabemos que é possível sonhar com um mundo melhor, com mais justiça social, com protagonismo dos pequenos. Aqui podemos ver neste momento que de verdade o Brasil voltou, esse Brasil que respira democracia”.
Luci Duartes, vereadora de Santa Maria (PDT): “Este é um empreendimento que deu certo e que faz a diferença na vida das pessoas. Gratidão é a palavra do momento. Irmã Lourdes Dill nos ensinou que a solidariedade é a salvação da humanidade”.
Reginete Bispo, deputada federal (PT-RS): “Este é um momento de retomada da esperança e da democracia, estamos aqui naltecendo o projeto de sociedade do bem viver e afirmando que a sociedade que nós queremos está absolutamente comprometida com a vida”.
Felipoe Teixeira, coordenador estadual do Movimento Negro Unificado: “A economia solidária vem da tradição do povo negro, ela é comprometida com o cuidado das pessoas, com a produção do alimento saudável, com o cuidado com meio ambiente e com a preservação da história e da cultura das diferentes pessoas e dos diferentes ovos”.
Carlos Alberto Campos, representante da Cáritas Brasileira: “A feira de Santa Maria é uma luz para Cáritas, mas eu quero dizer aqui que nós queremos construir não apenas uma nova economia e sim uma nova sociedade, quero pedir que vocês não se sintam organizadores de feira, se sintam construtores de uma nova sociedade”.
Vital Filho, diretor de Fomento a Economia Solidária do Ministério do Trabalho: “A economia solidária não deve ser tema de apenas um setor, de apenas um segmento, de um ministério ou mesmo de um governo, a Economia Solidária deve ser tema de um povo”.
Os gigantes seguem sendo gigantes e não pisam em falso
“Obrigado Dom Ivo, Gigante da Esperança. Obrigado Irmã Lourdes, gigante da economia solidária”, disseram a duas vozes os artistas do povo Antonio Gringo e Regina Wirtti, logo no começo do ato. E em nenhum momento se ouviu aplauso mais forte. Encerrada a cerimônia de abertura, reafirmados os ideais do Fórum Social Mundial e firmados os passos rumo a um novo mundo possível e uma nova economia que já acontece, fica uma certeza: há homens e mulheres que pela obra de sua vida podem ser sim considerados gigantes. E gigantes não pisam em falso quando caminham em meio ao povo.
A Feicoop ocorre até domingo (9) e Santa Maria segue até lá sendo a capital mundial da Economia Solidária. As sementes plantadas por Dom Ivo e cultivadas por Irmã Lourdes seguem frutificando através de outras mãos que se puseram em lavouro. Confira a programação completa da Feicoop no site (https://cooesperanca.wixsite.com/novosite) e também pelos links: Atividades formativas e Mostra de cultura, arte e diversidade.
Edição: Marcelo Ferreira