Rio Grande do Sul

ENSINO

UFPel pode abrir o primeiro curso de Medicina Humana para assentados no país

Antiga demanda do MST, primeira turma poderia começar já em 2023; Sindicato Médico do Rio Grande do Sul manda contra

Brasil de Fato | Pelotas |
A reitora da UFPel, Isabela Andrade, observa que a intenção é construir uma proposta coletivamente - Foto: Reprodução site Ufpel

Antiga demanda do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) pode ser atendida no ano que vem: a implantação de um curso de Medicina para assentados da reforma agrária. A Universidade Federal de Pelotas (UFPel), o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) e o MST estão discutindo o tema. “Já queremos iniciar no ano que vem com a primeira turma”, adianta Adelar Pretto, da direção estadual do movimento. Será o primeiro curso de Medicina deste tipo no Brasil.

“Oxalá a gente consiga formar muitos médicos para trabalhar nos municípios mais distantes, espalhados pelos rincões do nosso Brasil para atender nas comunidades pelo SUS”, diz Pretto. “É uma necessidade muito grande. É com esse foco que vamos pelear.” A primeira turma, segundo ele projeta, terá 60 alunos já que “a demanda é grande”.

139 formados

Curso para assentados e filhos de assentados da reforma agrária não é novidade para a UFPel. Através de convênio, a universidade gaúcha já formou 139 profissionais de Medicina Veterinária e tem mais duas turmas em andamento, uma delas com formatura agendada para 2023.

São estudantes que ingressaram na universidade pelo Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária (Pronera), que atua na promoção da educação para os trabalhadores e trabalhadoras do campo.

Simers é contrário

Em vez do Ministério da Educação, o novo curso seria financiado pelo Incra e Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA), também via Pronera. As turmas do Pronera contam com processo de seleção à parte e não reduzem as demais vagas oferecidas pela universidade.

A reitora da UFPel, Isabela Andrade, observa que a intenção é construir uma proposta coletivamente, envolvendo a unidade acadêmica que abrigará o curso, caso aprovado, e os movimentos que lutam pelo acesso a direitos sociais. Na semana passada, uma reunião tratou do assunto envolvendo representantes da Reitoria, da Faculdade de Medicina, Psicologia e Terapia Ocupacional (Famed) e a direção estadual do MST.

Porém, tão logo o debate veio a público, o Sindicato Médico do RS (Simers) largou nota condenando a iniciativa. “O Simers é contrário a qualquer processo de expansão de vagas sem parâmetros e pressupostos que garantam qualidade à formação”, enfatizou. Pedindo reunião com a UFPel, também defende que “o sistema de processo seletivo para instituições de ensino superior, contido na legislação vigente e considerado justo e legal, seja mantido e não sofra qualquer flexibilização para atender segmentos da sociedade”.

Na sua visão, tal fato redundaria em “redução da qualidade na formação médica”.

“O sindicato é corporativista. Não é ele que vai inviabilizar o curso”, entende Pretto.

“Gratuita contraposição”

“Percebo uma postura de gratuita contraposição a uma iniciativa que enfrenta um grave e histórico quadro de falta de profissionais médicos dispostos a atuar em espaços normalmente relegados”, reagiu a reitora respondendo à nota do Simers em declaração ao Diário Popular, de Pelotas.

Conhecido pelo conservadorismo, o Simers já saiu em defesa das médicas bolsonaristas Mayra Pinheiro, a “Capitã Cloroquina”, e Nise Yamaguchi, que também abraçou o chamado “tratamento precoce” durante a pandemia. Aconteceu quando ambas foram fortemente questionadas na CPI da Covid por proporem uso de drogas comprovadamente ineficazes contra o coronavírus.

“A entidade repudia veementemente constrangimentos submetidos às respeitadas cidadãs, mulheres experientes, profissionais com qualificados currículos e respeito profissional”, dizia a nota.

Tachou as críticas sofridas pelas duas como “desrespeito ao ato médico”. Na época, o Simers defendeu a liberdade dos médicos, se assim quisessem e com a anuência do paciente, recorrerem à hidroxicloroquina, embora estando ausente a comprovação da eficácia do tratamento.


Edição: Katia Marko