Rio Grande do Sul

Educação

Artigo | Má gestão de recursos agrava os problemas nas escolas municipais de Porto Alegre

O que precisa ficar (ainda mais) evidente é que o que não temos: condições dignas de gerir as escolas e de ensinar

Brasil de Fato | Porto Alegre |
"Infelizmente, essa abertura democrática ao diálogo não parece ser a disposição da gestão do prefeito Sebastião Melo" - Foto: Caco Argemi/CPERS Sindicato

Em recente artigo para mídia de grande circulação, a secretária de educação de Porto Alegre, Sônia Rosa, destacou algumas das realizações de sua gestão frente à pasta. É bem verdade que temos recebido, nas escolas municipais, uma quantidade significativa de recursos tecnológicos, como telas interativas que qualificam aulas, bem como computadores pessoais para o uso de professores e estudantes. Igualmente destacável é seu recuo sensível em relação à reforma curricular promovida, de maneira autoritária, pela secretária anterior.

O artigo da atual secretária não peca pelo que enaltece em sua gestão, mas no que cala sobre o cotidiano das escolas municipais. Primeiramente, é preciso destacar os graves problemas de infraestrutura dos estabelecimentos de ensino. Por exemplo, a escola Heitor Villa Lobos, reconhecida no artigo pelo Pêmio Internacional em Robótica que conquistou, ficou mais de um ano e meio aguardando reparos em uma caixa d’água que, caindo aos pedaços, oferecia risco a estudantes e professoras/es dessa escola que simboliza o triunfo do esforço sobre a precariedade. A escola N. Sra. do Carmo está desde o início de março aguardando manutenção em seus ventiladores depois de um deles despencar do teto quase na cabeça de uma professora. E haveria exemplos em inúmeras outras escolas.

Outro aspecto a ser lamentado sobre o que não fala o artigo são os reiterados esforços empreendidos pelas duas últimas administrações municipais em liquidar o plano de carreira das/os servidoras/es municipais. A aplicação de recursos públicos em materiais didáticos de pouca ou nenhuma utilidade para o dia a dia - e que não chegam nas escolas -, conforme vem sido amplamente noticiado, agrava e expõe o descaso com uma categoria profissional que pede, há anos, para ser ouvida por meio de um Congresso Municipal de Educação, meio legal no qual deve participar, dando sua contribuição ativa para o futuro da cidade. Além do que, impacta no contexto de reajustes completamente defasados da categoria.

Infelizmente, essa abertura democrática ao diálogo não parece ser a disposição da gestão do prefeito Sebastião Melo, que penaliza as e os profissionais da educação pelos equívocos da própria gestão. Isso fica demonstrado na tentativa de transferência de responsabilidade ao declarar publicamente que vai investigar as direções de escolas e de que as/os professoras/es da Rede Municipal de Ensino não têm interesse na aprendizagem das crianças e adolescentes. Mais do que o desrespeito público a profissionais que já sofrem com seguidas desqualificações, o que precisa ficar (ainda mais) evidente é que o que não temos, de fato: condições dignas de gerir as escolas e de ensinar as crianças, mediante infraestruturas precárias, inoperância nas manutenções, falta crônica de RH de professoras/es e funcionárias/os e desvalorização profissional.

Importante relembrar que o resultado de gestões que se põem de costas para aquelas/es que trabalham na linha de frente do serviço público é o de trabalhadoras/es adoecidas/os, como atestam os altos índices de adoecimento profissional em diversas escolas da Rede. 

Ainda assim, com a esperança de que a secretária Sônia Rosa e a gestão Melo sejam sensíveis aos interesses das comunidades e das e dos profissionais da educação, ressaltamos, por fim e especialmente, a necessidade de um verdadeiro diálogo com quem está na ponta no atendimento do serviço público (que segue de qualidade pela qualidade de suas e seus servidoras/es). É somente por meio dele que é possível desenvolver uma Porto Alegre autenticamente democrática e inclusiva, como é a sua tradição.

*João Francisco de Siqueira Rodrigues é professor de filosofia

*André Pares é professor de filosofia, vice-diretor do Coletivo de Profs de Filosofia da RME-POA

** Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.

Edição: Marcelo Ferreira