Rio Grande do Sul

Coluna

O pior dos legados do governo Bolsonaro

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Em 2022, Lira já falava em compartilhamento do governo: impacto é direto na relação do governo Lula com a presidência da Câmara - Foto: José Cruz/Agência Brasil
Uma deterioração ainda maior daquilo que já era ruim, a hipertrofia do chamado Centrão

Os efeitos e consequências do que pode se caracterizar como “política bolsonarista” são eloquentes e graves. Algumas delas se confundem com as próprias causas dessa política. No campo de governo, propriamente dito, citaria a destruição de políticas públicas e dos instrumentos de gestão e implementação delas; um quadro fiscal e orçamentário altamente deteriorado; uma crise humanitária das piores na história brasileira, envolvendo populações indígenas e consequências da pandemia de covid-19.

Há também os impactos sobre a cultura política dos brasileiros. A aspersão da virulência retórica e física como método de combate político; a deslegitimação pública da ideia de democracia; a exaltação do ideário e valores reacionários; a rejeição aos conceitos de direitos humanos e diversidade social; naturalização do racismo e misoginia, entre tantos outros contributos.

Mas no campo da política encontra-se um dos mais nocivos legados de Bolsonaro. Uma deterioração ainda maior daquilo que já era ruim, a hipertrofia do chamado Centrão. As fragilidades progressivas do governo Bolsonaro, que levaram à perda do apoio político majoritário inicial, o impeliram a acordos com o bloco parlamentar conhecido como Centrão, entre outros objetivos, para obstaculizar ou diminuir o risco de impeachment. O acordo feito por Bolsonaro em determinado momento resultou em uma ampliação e modificação das formas tradicionais de relacionamento entre o governo e a maioria do Congresso. O que tem sido caracterizado como o fim do “presidencialismo de coalizão”, depois de longa agonia.

Já em abril de 2022, Arthur Lira, antigo e atual presidente da Câmara dos Deputados, já anunciava que a relação política entre governo e Congresso deveria caminhar para um “novo sistema”. Lira já falava, à época, em compartilhamento do governo. O mais exato seria dizer uma partição de governo. Bolsonaro faria ‘motociatas” e ele distribuiria o orçamento.

O estabelecimento da impositividade das famigeradas emendas parlamentares, a criação das emendas de relator e a transferência da articulação política para o presidente da Câmara consolidaram o que o professor Fernando Limongi chama de “presidencialismo do descaso”. Um movimento síncrono de abdicação de responsabilidades institucionais levada a cabo por Bolsonaro e de usurpação de poderes levado a cabo por Lira.

O impacto é direto na relação do governo Lula com a presidência da Câmara. Lula faz movimentos para manter e recuperar suas prerrogativas políticas, mas seguirá enfrentando um Centrão fortalecido por esse pacto de cogoverno, não legitimado pelas eleições ou pela Constituição, criado na mediocridade de Bolsonaro.

* Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.

Edição: Marcelo Ferreira