Rio Grande do Sul

Coluna

A política pública da Cultura presente na ideia de cidadania e diversidade cultural no RS

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"O momento é de luta e mobilização para construir ações concretas de enfrentamento, via articulação e organização coletiva na cultura, ao extremismo e fundamentalismo" - Divulgação
Depois de seis anos de lutas e sofrimentos, estamos agora participando da recriação do MinC

As palavras de Richard Serraria, na coluna anterior de abertura da Gira Negra Gaúcha, antecipam a ideia de política pública como base da cidadania e diversidade cultural, no modo como as entendo na experiência do Ponto Africanidades, da Restinga, e na experiência de debate e convívio com a Rede Cultura Viva no RS.

As palavras que trago agora, como atuador de teatro, primeiro no Rio Grande do Sul e depois na estrada que levou meu grupo a diversos lugares do Brasil e do mundo, bem como palavras que trago do agente cultural, formado e ligado ao Programa Cultura Viva, trazem uma parte da vida marcada pelo meu empenho na luta pela cidadania e diversidade, sobretudo para homens negros e mulheres negras que trabalham em busca de reconhecimento e melhores condições de viver.

A história de nosso país mostrou, desde o início do século XXI, com a chegada de Luís Inácio Lula da Silva ao posto de presidente do Brasil, que a Cultura teria um papel enorme para a afirmação das diversas formações humanas aqui presentes. Foram 14 anos de uma política pública que trouxe dignidade e estruturas para fortalecer os cidadãos e cidadãs via ações e mobilizações culturais, considerando aqui a tomada de consciência para a acessibilidade de todos e todas junto ao constante esforço de chegar aos lugares mais distantes.

Veio um tempo de desesperança, após o golpe contra a presidenta eleita e as consequências tristes e maléficas para os brasileiros. Tudo se direcionou para o apagamento das conquistas voltadas aos interesses de fazedores de cultura e pequenos artistas, assim como contra a organização das minorias. O que se viu foi a dizimação de indígenas e cerceamento às expressões e vidas afro-brasileiras. Mataram a mulher negra Marielle Franco, buscando calar a voz de muitos a quem ela representava com sua brilhante carreira política.

Depois de seis anos de lutas e sofrimentos, de incertezas em todos os planos – local, estadual e nacional –, estamos agora participando da recriação do MinC, que tem o significado maior e mais profundo de recriação da vida inteligente e pulsante de nossos irmãos: jovens, crianças, idosos e idosas. E mesmo nesse tempo recente e infeliz da nossa história, não faltou luta em torno de duas batalhas travadas e vencidas: conquista de recursos públicos para o setor cultural, como nunca foi visto antes, simbolizadas em duas figuras gigantes do universo artístico nacional, o compositor e músico Aldir Blanc assim como o ator e ativista Paulo Gustavo, que deram seus nomes a duas leis de fundamental importância para o setor cultural do Brasil.

A Política Pública Nacional da Cultura, conforme foi pensada desde a gestão de Gilberto Gil, tem por base o tripé “conselho, plano e fundo”. Nesses anos de intervalo, entre a presidenta deposta e o retorno, por meio das urnas, do presidente Lula, o Plano ficou muito comprometido e o Fundo bastante reduzido, o que torna mais visível o recurso que agora chega pelas leis Aldir Blanc e Paulo Gustavo. É a realidade do Sistema Nacional de Cultura. E cada Estado precisa implantar os sistemas municipais, a fim de poder receber os recursos e executar o plano de cultura com particularidades de cada lugar.

Como agente cultural, acompanho o trabalho junto aos municípios, realizado pela Sedac, ressaltando o curioso fato de que o Rio Grande do Sul, no início do ano, tinha apenas 118 municípios com sistema de cultura implantados. Em pouco mais de um mês foram habilitados quase 312 municípios, de modo que 194 municípios colocaram o tripé da Cultura a funcionar neste curto período.

Apesar da problemática formação dos sistemas municipais de cultura, alguns construídos de forma pouco democrática e facilmente usados por interesses de eleição, eles garantem que o recurso chegue ao município, abrindo a perspectiva de que segmentos culturais como o artesanato, o teatro, o circo e o hip hop organizem sua atuação política para participar com outras expressões culturais de destaque.

O momento, portanto, é de luta e mobilização para construir ações concretas de enfrentamento, via articulação e organização coletiva na cultura, ao extremismo e fundamentalismo em suas diferentes esferas: religiosa, ambiental, direitos humanos, saúde, educação, comunicação e arte dentre outras áreas vitais ao desenvolvimento do Brasil contemporâneo.

Confira também o Podcast Gira Negra Gaúcha #02

Locução: Richard Serraria e André de Jesus

Gravação e edição no Lunar do Sopapo: Richard Serraria

Trilhas: Os Tincoãs, Gira deixa gira girar (remix) Voz de Dona Sirley Amaro retirada do doc O grande tambor (Catarse/ Iphan, 2010) Depoimento de Leandro Anton Trilha incidental: Samba Cabobu, gravado por Lucas Kinoshita, parte da trilha sonora de O grande tambor (Catarse/Iphan, 2010) Mercedes Sosa, Sudamericano en Nueva York (trecho de Pachamama Revolução, canção de Richard Serraria) Trecho de O bagulho é islâmico, canção de Richard Serraria e Kléber Albuquerque Negra Dai com Duke Jay (tocadiscos) e Bodi Lambari (teclados) no Lunar do Sopapo em Porto Alegre.

* André de Jesus, Ator/Ponteiro de Cultura, Locutor, ArteAtivista e Produtor Cultural.

** Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato. 

Edição: Katia Marko