É consenso entre analistas que a eleição de 2022 retomou as bases democráticas do país, com a vitória de um candidato democrata, mas a vitória no Executivo nacional não foi a única mudança de parâmetros na política institucional. Nos parlamentos estaduais, as mudanças - que já vinham acontecendo nos últimos anos - consolidaram uma nova cara para a institucionalidade em todo o país.
É o caso de estados como Pernambuco, onde a deputada estadual advinda do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra) Rosa Amorim (PT-PE), se elegeu para a Assembleia Legislativa (Alepe) e do Rio Grande do Sul, onde Matheus Gomes (PSOL-RS), foi eleito como deputado estadual na ALRS. Os dois são os convidados desta edição do BdF Entrevista, gravado diretamente da 4ª Feira Nacional da Reforma Agrária, organizada pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) no Parque da Água Branca, em São Paulo.
Para além de estarem em seus primeiros mandatos legislativos, os dois carregam outras similaridades: são jovens (Rosa, 26 e Matheus, 32), negros, moradores das periferias de suas cidades e que carregam mandatos com importantes pautas progressistas.
Rosa Amorim explica que "uma das facetas na política hegemônica do nosso país é justamente a política ser ocupada por homens, em sua maioria de meia idade, brancos, autodeclarados heterossexuais".
“Estamos num momento que explode no nosso país, a necessidade da renovação na política e de mudança, porque a representatividade é muito importante. Ocupar o parlamento, ocupar a institucionalidade com novas caras, com pessoas jovens, pretas, LGBT’s, com sonhos novos, é muito importante", explica a deputada do PT.
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O mandato de Matheus Gomes também traz "ineditismo" para o Rio Grande do Sul. "A gente tem mais de 200 anos de Assembleia Legislativa e nunca tínhamos tido uma bancada negra. Pela primeira vez na nossa história elegemos, em 2022, não apenas eu, mas também a deputada Bruna Rodrigues (PCdoB-RS), a deputada Laura Sito (PT-RS). Estamos buscando fazer um equilíbrio entre a força política do movimento social negro do nosso estado, com a representação institucional", aponta o deputado gaúcho.
"Digo isso porque a nossa resistência sempre existiu. Nós sempre criamos alternativas de vivência dentro das periferias do nosso estado, alternativas políticas que repercutiram a nível nacional, como por exemplo, o Dia Nacional da Consciência Negra, o 20 de novembro, que surgiu lá em Porto Alegre, no Rio Grande do Sul, e isso nunca se expressou na política institucional da maneira como deveria", completa Gomes.
Os dois carregam ainda outra similaridade: seus mandatos estão sediados nos dois estados onde o PSDB ainda busca resistência. Antes consagrado como o principal partido de oposição ao PT, os tucanos governam apenas três estados da federação: Pernambuco, sob o comando de Raquel Lyra; Rio Grande do Sul, com Eduardo Leite; e Mato Grosso do Sul, com Eduardo Riedel.
Eduardo Leite e Raquel Lyra, inclusive, que travam, neste momento, a disputa para se estabelecerem como o nome nacional do partido e, por consequência, se alçarem à disputa presidencial de 2026.
"No Rio Grande do Sul, o interessante no caso do PSDB, é que nunca foi o partido tradicional da direita do nosso estado. O Rio Grande do Sul tem uma tradição que une alguns elementos do conservadorismo, de um segmento reacionário mesmo, já que uma boa parte dos ditadores da ditadura militar no Brasil são gaúchos", explica Gomes.
"O Eduardo Leite criou um perfil diferente, inclusive, teve um impacto a nível nacional, querendo se apresentar como um elemento da terceira via. Mas o que o governo demonstra, até o momento, é uma continuidade de uma política extremamente neoliberal, com a política de privatização de empresas públicas, nenhum investimento ampliado em educação, saúde, assistência social e o combate à pobreza. É uma situação gravíssima que a gente vive, para a comunidade negra, por exemplo", completa o deputado.
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Ao contrário de Leite, que já se postulou à disputa presidencial em 2022, Lyra ainda sofre a desconfiança dos próprios pernambucanos. Um levantamento divulgado pelo instituto Opinião Pesquisas aponta que apenas 38% da população aprova os primeiros 100 dias de seu mandato.
"O que é importante destacar é que esses partidos não abandonam os seus princípios de governança, são governos liberais, são governos de estado mínimo, são governos de baixa participação popular, assim como a gente encontra, por exemplo, em Pernambuco, eu acredito que no Rio Grande do Sul também temos a mesma consequência", afirma a deputada Rosa Amorim.
"Sofremos, de alguma forma, com a política desses governos que não são governos à esquerda, são governos de muita conciliação. E nessa tentativa de encaixar todo mundo, o povo fica de fora", completa a petista.
Fonte: BdF Nacional
Edição: Rodrigo Durão Coelho