O sopapo é uma marca cultural viva que atesta a presença negra na construção econômica do RS
No dia 23 de abril de 2023, durante a realização do 3º Cabobu, a festa dos tambores em Pelotas, o músico Richard Serraria participou de uma mesa com Edu Nascimento, Kako Xavier, Raquel Moreira e Claudinho Pereira, com mediação de José Batista, sob o tema Cabobu passado, presente e futuro.
Serraria ressaltou que as edições do Cabobu 1 e 2 se materializaram via política pública do governo Olívio Dutra com execução da Sedac, via o secretário Luís Pilla Vares e Giba Giba, lotado na Casa de Cultura Mario Quintana à época, 1999/2000.
Também lembrou que o Projeto Giamarê Odara: Tambores do Sul, levou Mestre Baptista para realização de oficinas de sopapo em Salvador, em edital da Caixa Cultural, circulação nos espaços com execução de Caio Lopes, Alexandre Matos e mestre Dilermando no ano 2008.
Mais: a política Cultura Viva através da Ação Griô reconheceu mestres Baptista e Sirley Amaro mais Giba Giba na sequência dentre outros e outras mestras da cultura popular ali por 2007/2008.
Ainda como fruto da política pública em torno do sopapo houve ações dos Pontos de Cultura Chibarro (PC Oliveira), surgimento do Quilombo do Sopapo em Porto Alegre. Apoio ainda ao sopapo via Ventre Livre na Capital, bem como ao Odomodê e incremento de ações culturais através do Arte e Estação no Cassino.
Posteriormente Pampa sem Fronteiras, ponto de cultura em Bagé se juntou à movida. Desde o princípio do Cultura Viva estiveram juntos Coletivo Catarse de Porto Alegre mais Casa Brasil Dunas em Pelotas que tiveram papel fundamental na valorização do sopapo ao longo do século XXI.
O Grande Tambor, documentário foi realizado em 2009 e lançado em 2010 (Catarse/IPHAN) teve como ponto de partida ação do Quilombo do Sopapo (padrinhos Giba Giba, Mestra Griô Sirley Amaro, Mestre Baptista e Bataclã FC). Tal doc, reitero fruto da política pública, teve papel fundamental naquele momento histórico, uma espécie de balanço das ações feitas no Cabobu 1 e 2 e apresentando desafios para a permanência do sopapo no século XXI.
Dentro desse percurso de afirmação do sopapo é importante ressaltar as teses acadêmicas de Mário Maia em 2008 e Richard Serraria 2017, ambos na UFRGS, marcando presença do sopapo no ambiente acadêmico da universidade pública e gratuita. O TCC de Lucas Kinoshita no IPA em 2010, defendido em universidade privada sob orientação de Nisiane Franklin, também teve relevância nesse contexto de sedimentar a presença do sopapo no ambiente acadêmico.
Já perto do final desse levantamento esparso acerca do tambor central negro gaúcho, em 2019 se realizou no Ponto de Cultura Quilombo do Sopapo o projeto Pedagogia do Sopapo via política pública, FAC RS sob coordenação executiva de Lorena Sanchez com a presença nas atividades de José Batista, Bataclã FC, Sandro Gravador (neto de cacique de tribo carnavalesca porto-alegrense, ambiente onde haviam sopapos executando também a levada zuguiné) e Alabê Ôni, com coordenação pedagógica de Richard Serraria.
Também o livro ‘Sopapo Contemporâneo: um elo de ancestralidade’, de José Batista, é viabilizado mediante política pública via Lei Aldir Blanc em 2021 e ali estão contidas nesse sentido, as falas de Leandro Anton e Gustavo Turck dentre outros e outras artífices de destaque na trajetória do tambor charqueador.
Encerrando, destaco que a edição 3 do Cabobu também se viabilizou mediante política pública via lei de incentivo fiscal, a LIC, com patrocínio da Natura, a partir da articulação do Edu do Nascimento, José Batista e a produção da Sandra Narcizo.
Quis destacar com isso a importância da política pública que destina efetivamente recursos financeiros para a efetivação de ações que permitam o protagonismo desse conteúdo cultural de matriz negra e de relevância indiscutível na contemporaneidade já que é também potente agente no combate ao racismo.
Configura-se assim o sopapo, para além de um instrumento musical, também enquanto um artefato político já que atesta a presença negra na construção econômica do RS via presença da mão de obra escravizada. Portanto, o sopapo é uma marca cultural viva que confirma tal premissa histórica acima exposta.
Confira também o Podcast Gira Negra Gaúcha #01
Locução, edição de áudio e roteiro: Richard Serraria
Locução: André de Jesus
Gravado e mixado no Centro Cultural Lunar do Sopapo, altos da Vila Nova, Porto Alegre RS (maio 2023)
* Richard Serraria, poeta/cancionista e tocador de Sopapo, Dr. Estudos Literários UFRGS – André de Jesus, Ator/Ponteiro de Cultura, Locutor, ArteAtivista e Produtor Cultural.
** Este é um artigo de opinião. A visão dos autores não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.
Edição: Katia Marko