São 1.692 as fazendas com incidência em território indígena delimitado pela Fundação Nacional do Índio (Funai). É o que apurou o levantamento inédito "Os Invasores", realizado pelo observatório De Olho nos Ruralistas. Atrás das sobreposições estão gigantes do agronegócio, indústria armamentista e investidores dos cinco continentes.
Entre as multinacionais com fazendas incidentes em Terras Indígenas (TIs) figuram subsidiárias e sócios de alguns dos principais grupos do agronegócio como Bunge, Amaggi, Bom Futuro, Lactalis, Cosan, Ducoco e Nichio. Entre os setores econômicos, produtores de grãos, carne, madeira, açúcar e etanol e frutas são os principais responsáveis pelas sobreposições.
O estudo aponta ainda a participação de bancos e fundos de investimento na pressão econômica contra as TIs. Os principais nomes da lista são o Itaú (por meio da sua subsidiária Kinea) e o Bradesco. Também aparecem XP, Gávea Investimentos, IFC e Mubadala.
Das 1.692 fazendas, 452 estão sobre terras indígenas homologadas e regularizadas. Isto é – acentua o relatório – algo que constitui crime federal, com base no artigo 246 da Lei de Registros Públicos e no Estatuto do Índio.
Crime organizado também está envolvido
As conexões com o poder econômico não param por aí, assinalam os pesquisadores. Entre os casos abordados no relatório, há conexões diretas com o crime organizado. Das relações próximas de latifundiários no Amazonas com a Cosa Nostra, na Itália, a um ex-garimpeiro ligado ao maior contrabandista de diamantes do mundo.
“É o capital nacional e internacional, legal ou ilegal, que assina a violência”, afirma o diretor do observatório, Alceu Luís Castilho. “O planeta que olha para o Brasil a cobrar a preservação da Amazônia é o mesmo planeta que precisa conhecer melhor quem financia as destruições”, argumenta.
Ao longo de seis meses, uma equipe multidisciplinar composta por jornalistas, geógrafos, historiadores e um especialista jurídico se debruçou sobre as informações de imóveis rurais cadastrados e certificados pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), obtidos a partir de três bases de dados: o Sistema de Gestão Fundiária (Sigef), o Sistema Nacional de Cadastro Rural (SNCR) e o Sistema Nacional de Certificação de Imóveis (SNCI), informa o observatório.
A partir da lista inicial, foi realizado o cruzamento com os metadados de cobertura e uso do solo da plataforma MapBiomas - Coleção 7, com dados disponíveis até 2021, de modo a obter as informações sobre a destinação econômica das áreas sobrepostas.
Relação com a morte de indígenas
Ao todo, as sobreposições em terras indígenas englobam 1,18 milhão de hectares, uma área do tamanho do Líbano. Desse total, 95,5% estão em territórios pendentes de demarcação. Os dados também mostram que 18,6% da área sobreposta são utilizados para a produção agropecuária. Deste total, 55,6% são ocupados por pasto e outros 34,6% por soja.
Atrás desse avanço está a destruição da floresta. A partir do cruzamento das sobreposições com os dados de satélite do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), foi identificado o desmatamento de 46,9 mil hectares entre 2008 e 2021, considerando-se apenas as áreas de incidência em áreas indígenas.
Mato Grosso do Sul, Mato Grosso e Maranhão são os estados com maiores casos de sobreposições. Segundo o relatório, existe uma correlação direta entre a ocupação das TIs e os dados de conflitos e mortes de indígenas, com destaque para os territórios dos povos Kanela/Timbira, no Maranhão; Guarani Kaiowá e Terena, no Mato Grosso do Sul; e Pataxó na Bahia.
Fundado em 2016, De Olho nos Ruralistas acompanha os impactos sociais e ambientais do agronegócio no Brasil. Monitora desde o desmatamento até a expulsão de camponeses, da comida com agrotóxicos à violação de direitos dos povos indígenas e quilombolas.
O relatório "Os Invasores" pode ser acessado no site do observatório "De Olho nos Ruralistas".
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Edição: Marcelo Ferreira