É preciso ser profeta, fazer a denúncia da dor e do sofrimento, expulsar os vendilhões do templo
“Atrevo-me a dizer que o futuro da humanidade está, em grande medida, em vossas mãos, na vossa capacidade de vos organizar e promover alternativas criativas na busca diária dos ‘3T’, Terra, Trabalho e Teto, e também na vossa participação como protagonistas nos grandes processos de mudanças nacionais, regionais e mundiais.”
(Papa Francisco, no II Encontro mundial dos Movimentos populares).
“Produzimos comida suficiente para todas as pessoas, mas muitas ficam sem o pão de cada dia. Isso constitui um verdadeiro escândalo, um crime que viola direitos humanos básicos. Portanto, é um dever de todos extirpar essa injustiça de ações concretas e boas práticas, e através de políticas locais e internacionais ousadas.”
(Mensagem do Papa Francisco à pré-Cúpula sobre Sistemas alimentares da ONU).
As citações do Papa Francisco estão no Texto-Base da Campanha da Fraternidade 2023, número 57, página 37, promovida pela CNBB, Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, com o tema FRATERNIDADE E FOME, e dizendo “dai-lhes vós mesmos de comer!” (Mt, 14,16).
Estamos numa semana na qual alimentar o corpo e saciar o espirito está no centro da vida de cristãs e cristãos, refletindo-se sobre a paixão e revive-se a paixão, morte e ressurreição de Jesus.
Os famintos de pão, de vida, de amor, de cuidado estão hoje por todas as partes e lugares. Em primeiro lugar, os famintos de pão. Por isso, surgiram nos últimos tempos em todo Brasil os Comitês Populares contra a Fome, as Cozinhas Solidárias e Comunitárias. A falta de pão vem acompanhada da falta de vida, da ausência de amor e de cuidado para milhões de brasileiras e brasileiros.
Enfrentar a fome acontece, felizmente, com solidariedade, com partilha, a sociedade, os movimentos populares, as igrejas e pastorais organizando-se a partir de baixo, quando os governos estão ausentes e longe do povo, as políticas públicas não existem ou são extintas, como se viu em tempos recentes.
A multidão seguiu Jesus no deserto, era fim do dia, não havia o que comer. Os discípulos pediram-lhe que mandasse todas e todos de volta para a cidade. Jesus disse “dai-lhes vós mesmos de comer”. Mas como, perguntaram-lhe, se não há comida. “Recolhei tudo que tenham.” Juntaram cinco pães e dois peixes, o número sete, simbólico. Distribuíram tudo, e ainda sobraram muitos cestos de comida. A solidariedade e a partilha são o exemplo prático de que tudo é possível quando há amor, cuidado com a outra, o outro e a Casa Comum.
Jesus reuniu os mais próximos ao redor de uma mesa nos seus últimos dias de vida, partilhou pão e vinho, antes de ser preso, torturado, julgado pelos poderes de então e pregado numa cruz até a morte. Os poderes instituídos não conseguem admitir a igualdade, a justiça, o Bem Viver. Jesus mostrou o que deve acontecer e ser feito sempre por todas e todos que queiram e têm coragem e fé para seguir seus mandamentos de amor.
Os tempos atuais exigem: é preciso ser profeta, fazer a denúncia da dor e do sofrimento, expulsar os vendilhões do templo e de todos os espaços, fazer o anúncio da Boa Nova. A partilha do pão, a celebração de unidade ao redor da mesa são o exemplo de Jesus na semana de sua paixão, crucificação e morte. Assim, acontecem, e acontecerão, a vida e a ressurreição, ontem, hoje, amanhã, sempre. Sim à vida, sim ao amor. “Dai-lhes vós mesmos de comer!”
* Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.
Edição: Marcelo Ferreira