O alerta precoce é um elemento importante diante da potencialidade de ocorrência de um desastre e, ao mesmo tempo, uma medida adaptativa diante dos impactos já conhecidos e esperados das mudanças climáticas.
De regra o alerta situa-se na fase de preparação para o desastre e serve para que órgãos de proteção e Defesa Civil, as comunidades em risco e a sociedade fiquem de sobreaviso e se movimentem a tempo de salvar vidas e mitigar perdas e danos.
Mas um sistema de alerta bem estruturado requer observância, no mínimo, de algumas regras básicas como: i) conhecimento do risco de desastre a partir da coleta de dados e sua avaliação; ii) investimento em temos de aquisição e manutenção de aparelhos necessários para a liberação de um alerta mais preciso; iii) serviço de monitoramento; iii) comunicação clara com a comunidade em risco; e iv) preparação em todos os níveis para responder às advertências recebidas.
Esses componentes interrelacionados precisam ser coordenados em vários níveis dentro da governança para que o sistema funcione de forma eficaz e inclua um mecanismo de feedback para melhoria contínua. A falha em um componente ou a falta de coordenação entre eles pode levar à falha de todo o sistema.
Alertas estão previstas na Política Nacional de Proteção e Defesa Civil
A regulamentação jurídica acerca dos deveres e responsabilidades dos atores envolvidos no processo de alerta também é elementar quando da definição dos sistemas de alerta. No Brasil, a Lei nº 12.608/12, que instituiu a Política Nacional de Proteção e Defesa Civil – PNPDEC e estabeleceu outras providências, traz o alerta precoce em diversos momentos. Primeiramente, “produzir alertas antecipados sobre a possibilidade de ocorrência de desastres” é um dos objetivos da Política Nacional de Proteção e Defesa Civil.
Esse objetivo se materializa na prática por meio do exercício das competências atribuídas a cada ente federado. Assim, uma das competências da União no âmbito do sistema nacional de proteção e defesa civil é (..) “produzir alertas sobre a possibilidade de ocorrência de desastres, em articulação com os Estados, o Distrito Federal e os Municípios”.
Aos Estados cabe “apoiar, sempre que necessário, os Municípios (...) na divulgação de protocolos de prevenção e alerta e de ações emergenciais.
Já os municípios têm a competência de “manter a população informada sobre áreas de risco e ocorrência de eventos extremos, bem como sobre protocolos de prevenção e alerta e ações emergenciais em circunstâncias de desastres”.
A Portaria nº 3027/20 representa um passo na regulamentação do sistema nacional de informações, especificamente no que diz respeito a procedimento, definição de papéis e organização das informações em matéria de alerta de desastre. “Define procedimentos para o envio de alertas à população sobre a possibilidade de ocorrência de desastres, em articulação com os órgãos e entidades estaduais, distritais e municipais de proteção e defesa civil, e para utilização do sistema Interface de Divulgação de Alertas Públicos para envio de alertas via mensagem de texto (SMS), televisão por assinatura ou plataforma de avisos públicos”.
Segundo as disposições gerais da portaria, a Secretaria Nacional de Proteção e Defesa Civil, por intermédio do Centro Nacional de Gerenciamento de Riscos e Desastres (Cenad), é o órgão responsável pela gestão, cadastro de instituições e responsáveis e pela auditoria de utilização do serviço de difusão de alertas de desastres. Para os fins de realizar sua competência, o Centro Nacional de Gerenciamento de Riscos e Desastres disponibilizará formulário em meio digital, no sistema Interface de Divulgação de Alertas Públicos (IDAPI), para registro das instituições e responsáveis que poderão cadastrar, enviar e gerenciar alertas, de acordo com o seu nível de atuação e instituição vinculada.
O envio de alertas de desastres à população deve ser realizado pelos órgãos de proteção e defesa civil dos municípios que detenham capacidade e estrutura operacional para sua operação. E, em caso de incapacidade dos órgãos municipais, os alertas serão enviados pelos órgãos estaduais de proteção e defesa civil. Na impossibilidade de envio de alertas por parte do órgão estadual ou municipal, ou em casos de desastres excepcionais, poderá o Centro Nacional de Gerenciamento de Riscos e Desastres fazer o envio de mensagens à população, reportando o envio de maneira prévia aos órgãos estaduais ou municipais.
O envio das informações de alerta e recomendações para a população deve compor o plano de contingência, ou demais planos operativos do município ou estado, visando a identificação dos responsáveis e os critérios adotados para a emissão. Na hora do caos, os papeis dos atores devem estar muito bem definidos. Além disso, os meios para que esses papeis sejam desempenhados também precisam ser oportunizados antes do desastre, com estrutura e financiamento. Se os municípios não têm estrutura ou condições, por determinação legal, o Estado deve apoiá-lo no levantamento das áreas de risco, na elaboração dos Planos de Contingência de Proteção e Defesa Civil e na divulgação de protocolos de prevenção e alerta e de ações emergenciais.
Estudo aponta que as defesas civis investem pouco em comunicação de riscos
Percebe-se assim que apesar do seu importante papel na preparação para o desastre, e de ser uma obrigação expressa no Brasil, o alerta não é o único instrumento à disposição da sociedade. A comunicação antecipada é mais eficaz.
Um estudo realizado com quase duas mil defesas civis no Brasil aponta que as defesas civis priorizam e investem pouco em comunicação de riscos. Esta comunicação também é um alerta, só que trabalhado ao longo do tempo, junto da comunidade, e não apenas no momento em que o desastre está prestes a acontecer. A eficácia de um sistema de alerta aumenta quando os cidadãos compreendem as informações e perceberem o nível do risco a que estão expostos.
Mas como o problema é muito mais complexo do que parece, há que se ter em mente que apenas comunicar um risco, destinar um ginásio como abrigo por um tempo, e depois permitir que as pessoas voltem para o mesmo lugar de exposição também não é a solução. Isso é a receita para o início de um novo ciclo de desastre, o que contraria diretamente um dos objetivos da Política Nacional de Proteção e Defesa Civil que é “combater a ocupação de áreas ambientalmente vulneráveis e de risco e promover a realocação da população residente nessas áreas”.
* Especialista em Direito Público com ênfase em Desastres e Direito Ambiental. Advogada, consultora e professora.
** Este é um artigo de opinião. A visão da autora não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.
Edição: Katia Marko