Um passo importante foi dado na manhã desta segunda-feira (27) para a conquista dos direitos de merendeiras e merendeiros de escolas que operam com modelo de terceirização de funcionários de alimentação de Rio Grande do Sul. Em audiência com o governador Eduardo Leite (PSDB), uma comissão de representantes de escolas, liderada pela Associação Unidos Terceirizados e o 39º núcleo do Cpers, recebeu a confirmação de que o estado encaminhou um valor de R$ 537 mil para sanar uma parte da dívida. O montante é referente a salários e outros benefícios devidos pela empresa Benetton Serviços Terceirizados Ldta desde o mês de novembro.
Conforme o governador, embora o valor não represente a totalidade do salário devido pela Benetton, foi um caminho encontrado pela Procuradoria-Geral do Estado (PGE) para resolver parcialmente o assunto até que outras medidas jurídicas sejam implementadas. Atualmente, estima-se que a empresa deva cerca de R$ 938 mil a aproximadamente 250 merendeiras de escolas das cidades de Porto Alegre, Gravataí e Guaíba. Esse valor foi determinado pelo Tribunal Regional do Trabalho da 4º Região em audiência de conciliação em 25 de janeiro deste ano. Na ação, a juíza do Trabalho Ana Paula Keppeler Fraga determinou o arresto desse valor da conta bancária da Benetton, porém o processo segue tramitando.
O governador explicou que o valor será encaminho por depósito judicial. A partir de agora, a entidade vai intermediar o pagamento, mediante a confirmação de quais valores cada um dos funcionários ainda tem a receber.
“A gente conseguiu encontrar um caminho buscar acelerar o pagamento de uma parte das parcelas salariais vencidas, no qual a gente deposita em juízo esse valor e o juiz tem a capacidade de liberar mais rapidamente alvarás para que as pessoas tenham condições de retirar os valores. O que se fez foi o seguinte: quando o estado observou a dificuldade de pagamento para a empresa, ele negou o pagamento para fazer depósito judicial que será feito para o sindicato, que vai encaminhar individualmente para cada trabalhador”, destacou Leite.
“Um mal que afeta toda a comunidade escolar”
A diretora-geral do 39º núcleo do Cpers, Neiva Lazzarotto, considera a medida essencial para garantir a sobrevivência de famílias que passaram o Natal e Ano Novo sem receber salários. No entanto, ela cobrou do governador ações efetivas que mudem o atual enquadramento jurídico para a contratação de empresas terceirizadas.
“As merendeiras e merendeiros vivem um cenário dramático, no qual se encontram desempregadas e sem condição de pagar as contas, até as mais básicas. Esse é um dos motivos pelos quais consideramos a terceirização um mal que afeta toda a comunidade escolar, não somente os funcionários”, ressalta Neiva.
Para a presidente da Associação Unidos Terceirizados, Adriana da Silva Cunha, não existe outra alternativa senão prosseguir com as mobilizações, para garantir não somente o encaminhamento dos valores, mas sim para buscar uma reforma total na administração de escolas no Rio Grande do Sul.
“Isso tudo o que está acontecendo já está provocando efeitos profundamente negativos em muitas famílias. Queremos ações mais ágeis porque essas empresas só estão vindo sugar o dinheiro público e não estão preocupados com a qualidade do serviço que prestam. Os funcionários vão trabalhar muitas vezes pagando do próprio bolso, e chegam no fim do mês e não recebem. O estado é responsável e os contratos têm que ser modificados. As pessoas não são brinquedos”, reclama Adriana.
O depósito judicial foi realizado no último sábado (25) e pode ser recolhido pelos funcionários nos próximos dias.
“Neste momento, é importante que o sindicato faça um trabalho de discriminar os valores individualizados para que as trabalhadoras possam receber. O pagamento vai ocorrer desta forma para que o juiz consiga visualizar quais são os direitos de cada uma que estão pendentes e fazer o pagamento da forma mais adequada”, explicou o Procurador-Geral do Estado, Eduardo Cunha da Costa.
“Governador, são somos escravas”, desabafa merendeira
Uma das manifestações que evidenciou o cenário crítico pelo qual passam as funcionárias de escolas foi o da merendeira Tailise Camargo Silva Borges, que trabalha em uma escola de Porto Alegre. Ao questionar o governador, Tailise fez uma menção a práticas de exploração trabalhista que estão se proliferando no estado e que devem ser rechaçadas pelo governo.
“Governador, muitas de nós estamos numa situação muito difícil e até desesperadora. Não somos escravas, essa época já acabou. Olha só o que aconteceu em Bento Gonçalves agora. Não queremos que exemplos como esse se repitam. Precisamos de respeito e consideração”, desabafou.
A Benetton já rescindiu o contrato junto ao governo do estado, mas não está arcando com os valores da rescisão do contrato e atrasando parcelas acertadas na Justiça. A empresa descontou de forma indevida os salários de novembro depois de orientar os funcionários a não comparecerem ao local de trabalho após não pagar os salários.
“Governo tem responsabilidade”, avalia diretora
Um dos momentos de divergência na audiência ocorreu durante manifestação do Procurador-Geral do Estado, Eduardo Cunha da Costa, que tentou afastar a responsabilidade do governo o estado no assunto. Segundo ele, para que possam ocorrer mudanças na legislação que aprimorem a regulamentação de terceirizadas, é preciso efetuar mudanças em âmbito federal. Além disso, segundo ele, como o estado teria efetuado os repasses para a Benetton, existiriam limites da ação do estado para impedir que a empresa participe de novas licitações, por exemplo.
“Achamos que não houve negligência do estado e ele pagou a sua parte. Houve um tempo em que o estado atrasava os salários e as empresas tinham dificuldades de fazer os pagamentos. Hoje, a solução é mais profunda porque o mesmo sócio de uma empresa que é punida pode abrir uma outra empresa com laranja em outra licitação. Então, é preciso mudar a lei no Brasil punindo o sócio de uma empresa a fazer parte de outra”, assinalou.
Porém, para Neiva, o governo do estado é responsável e deve ter iniciativa política para modificar a atual legislação.
“As leis são feitas pelos políticos e podem ser modificadas. A responsabilidade do estado é solidária. Ele, como contratante por meio do modelo de licitação, tem essa prerrogativa e deve fiscalizar os contratos para que empresas com más práticas de gestão como a Benetton não sejam mais contratadas", avalia.
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Edição: Marcelo Ferreira