Na noite de quarta-feira (22), uma operação conjunta da Secretaria de Inspeção do Trabalho do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) com o Ministério Público do Trabalho (MPT-RS), a Polícia Federal (PF) e a Polícia Rodoviária Federal resgatou trabalhadores em situação análoga à escravidão que atuavam na colheita da uva e no abate de frangos em Bento Gonçalves, na Serra Gaúcha. Caso foi denunciado por um grupo de trabalhadores que conseguiu fugir do esquema e procurar a PRF em Porto Alegre
Segundo o MPT-RS, cerca de 215 homens foram encontradas em más condições de alojamento. Já a PRF calculou em 150 o número de pessoas resgatadas. Eles trabalhavam para uma empresa que fornecia mão de obra para grandes vinícolas da região, que não tiveram os nomes divulgados pelos órgãos de inspeção.
De acordo com relato aos policiais, os trabalhadores foram cooptados por aliciadores de mão de obra, conhecidos como gatos, na Bahia e trazidos para a Serra Gaúcha para trabalharem para uma empresa terceirizada que presta serviços a uma vinícola.
Péssimas condições de trabalho
Na noite de quarta-feira, os agentes fizeram buscas em galpão, na Rua Fortunato João Rizzardo, no bairro Borgo, onde os trabalhadores estavam alojados. A força-tarefa constatou precariedade nas acomodações, com pouquíssimo espaço para acomodar muitos trabalhadores ao mesmo tempo. Também há relato de muita sujeira, desordem e mau cheiro.
Segundo os trabalhadores, eles trabalhavam diariamente, das 5h às 20h, com folgas somente aos sábados. Isso representa uma absurda jornada de 15 horas de trabalho. Também denunciaram que representantes da empresa ofereciam a eles comida estragada.
Os trabalhadores também informaram que só podiam comprar produtos em um mercadinho em frente à Igreja Nossa Senhora do Carmo, com preços superfaturados e que o valor gasto era descontado no salário. Desta forma, eles acabavam o mês devendo, pois o consumo superava o valor da remuneração. E que eram impedidos de sair do local e que, se quisessem sair teriam que pagar a suposta "dívida". Além disso, os patrões ameaçariam os familiares, que vivem no estado nordestino.
Proprietário preso
Segundo a PRF, o responsável pela empresa que mantinha os trabalhadores nestas condições foi preso e encaminhado para a Polícia Federal em Caxias do Sul. Ele tem 45 anos de idade e é natural de Valente/BA. A empresa possui contratos com diversas vinícolas da região.
O Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) irá analisar individualmente os direitos trabalhistas de cada trabalhador para buscar a devida compensação pelos trabalhos realizados no período.
Problema se repete anualmente na colheita da uva
De acordo com o MTE, já foram feitas operações do mesmo tipo, neste ano, em Nova Roma do Sul, Caxias do Sul, Flores da Cunha e também em Bento Gonçalves. Dois locais que serviam como alojamentos foram interditados por apresentarem problemas de segurança em instalações elétricas, superlotação e questões de higiene.
No total, foram vistoriadas 24 propriedades rurais nessas cidades e identificados 170 trabalhadores sem registro. As origens deles são, principalmente, baianos, argentinos e indígenas, alguns, inclusive, com menos de 18 anos de idade.
Segundo o gerente regional do MTE, Vanius Corte, o enfoque das ações fiscais, num primeiro momento, é a formalização dos contratos de trabalho e verificação das condições dos alojamentos.
“Em relação a outras culturas, a uva está muito atrasada nas questões das formalizações dos vínculos empregatícios”, disse o representante do MTE. A ideia do MTE é realizar uma audiência pública para buscar uma adequação do setor aos direitos dos trabalhadores. Nesta reunião serão chamados os representantes dos produtores, os sindicatos, as vinícolas e as secretarias municipais de Agricultura. Não há data marcada. Na próxima safra haverá também um incremento nas fiscalizações.
De acordo com o MPT, na tarde desta quinta-feira (23), ainda estavam sendo colhidos depoimentos pelas procuradoras, na região. A procuradora-coordenadora da PTM Caxias do Sul, Ana Lucia Stumpf González, e a vice-coordenadora regional da Conaete (Coordenadoria Nacional de Erradicação do Trabalho Escravo e Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas), procuradora Franciele D’Ambros, foram a Bento Gonçalves representando o MPT-RS na Força-tarefa.
Ao longo desta quinta-feira, as procuradoras colheram depoimentos de pessoas alojadas no local. O MPT-RS também foi chamado a auxiliar nos trâmites de regularizações e na negociação com empregadores para pagamento de verbas rescisórias e garantia de transporte de retorno para os trabalhadores, a maioria proveniente da Bahia.
* Com informações da CUT-RS, jornal Pioneiro, Sul21 e Extraclasse.
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Edição: Katia Marko