Kelly Lidiane Carvalho Moreira, de 36 anos, foi morta na madrugada do último domingo, 12, em Uruguaiana, no Rio Grande do Sul, vítima de feminicídio, pelo companheiro Guilherme Pansardi Grisóstimo.
Horas antes do crime, Kelly havia acionado a polícia após ter sido agredida por Guilherme. A mulher morreu com golpes de faca logo após ele ter sido liberado da delegacia. Guilherme foi preso após o assassinato. Kelly estava grávida de cinco meses do investigado, com quem mantinha relacionamento há um ano. Ela deixou quatro filhos de uma relação anterior.
A gravidade do ocorrido deflagrou um movimento para denunciar e alterar os procedimentos do Estado para evitar o crescimento de feminicídios. Em 2022, este crime teve alta de 10,4% no Rio Grande do Sul, totalizando 106 mortes no ano passado – 10 a mais do que em 2021.
Uma hora após a divulgação do crime, o Levante Feminista Contra o Feminicídio RS redigiu o documento Até quando senhor governador?, com um conjunto de medidas para que este tipo de caso não ocorra mais.
“O fato é muito grave. O Estado agiu em desfavor da vida dessa mulher. Não foi só omissão”, acentua a integrante do Levante Feminista Contra o Feminicídio RS, Télia Negrão. “Foi uma ação do Estado que devolveu o agressor com Medida Protetiva para a casa da mulher para matá-la. Essa ação do Estado resultou no assassinato de Kelly na residência onde estavam seus quatro filhos menores”.
Entre as reivindicações está a instalação de políticas públicas previstas da Lei Maria da Penha, a reestruturação da rede de atendimento às mulheres, a capacitação dos servidores e a ampliação do orçamento. “Trabalhe para que nenhuma mulher morra pela omissão do Estado e nenhuma morte de mulher seja tolerada”, enfatiza a carta dirigida ao governador.
O documento vem ganhando um conjunto de apoios e foi entregue nesta terça-feira, 14, em mãos ao governador Eduardo Leite pela deputada Bruna Rodrigues, além de manifestações de parlamentares na Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul.
Inquérito em andamento sobre o feminicídio
De acordo com o Boletim de Ocorrência (BO), da Delegacia de Polícia de Pronto Atendimento (DPPA), foram encaminhadas medidas protetivas de urgência a favor da vítima. Entretanto, após o registro de violência doméstica, a delegada plantonista Amanda Andrade encaminhou à justiça pedido de medida protetiva de urgência e liberou o agressor. Logo depois de solto, Guilherme Pansardi Grisóstimo matou a mulher com quatro facadas nas costas.
Em nota após o assassinato, a delegada informou que não havia registro anterior de ocorrência entre eles e que solicitou medida protetiva de urgência para a vítima após o relato de agressão (leia nota abaixo).
Um inquérito foi aberto e apura se houve negligência por parte da Polícia Civil ao não deter o agressor em flagrante.
O diretor do Departamento de Polícia do Interior (DPI), delegado Nedson de Oliveira, diz que o objetivo da sindicância será apurar se houve falha, omissão ou problema de comunicação que levou a delegada plantonista a liberar o agressor da companheira.
A conclusão da sindicância será apresentada no Conselho Superior de Polícia. Entre as sanções possíveis, estão advertência e suspensão. Como está em estágio probatório, pode até ser desligada.
O Tribunal de Justiça afirma que, apesar de a policial solicitar medidas protetivas de urgência para a vítima após o primeiro registro de agressão, o pedido de prisão em si e as ações de proteção foram postuladas na Justiça depois do assassinato de Kelly.
Em entrevista o programa Timeline, da Rádio Gaúcha, Fayda Belo, advogada especialista em crimes de gênero, afirmou que o atendimento policial falhou ao não registrar o flagrante. “No momento que a mulher relata a violência, o policial precisa levar essa mulher até um local que ela fique segura. Por que isso não foi realizado? Outro ponto, este homem tinha de ser, naquele instante, ainda que não ficasse preso, removido de um local que ficasse próximo à vítima”.
Confira íntegra de Nota da Polícia Civil sobre o caso
A respeito do fato ocorrido na madrugada de domingo, 12, a Polícia Civil esclarece que ratificou a prisão em flagrante e representou pela prisão preventiva do autor do feminicídio, ocorrido em Uruguaiana. Esclarece que prontamente foram adotadas as medidas inicialmente cabíveis no momento da apresentação da ocorrência. Ressalta-se que, antes da ocorrência do crime, foram representadas pelas medidas protetivas de urgência cabíveis.
Esclarece-se que a vítima em princípio não queria ir à Delegacia, tendo sido convencida por familiares a comparecer. Atendida na Delegacia de Polícia, inicialmente não queria fazer o registro na unidade policial, mas foi devidamente orientada a solicitar medida protetiva e a fazer o registro da ocorrência.
Assim, com base nos elementos apresentados à autoridade policial no momento da lavratura da ocorrência, a medida cabível era o encaminhamento à Justiça de pedido de Medida Protetiva de Urgência, o que foi feito ainda na madrugada do dia 12.
A Polícia Civil, em sua esfera, adotou de pronto as medidas investigativas preliminares, porém, infelizmente, fatos que não estavam dentro do domínio da Polícia Civil culminaram na morte da vítima. Foi representado ao Poder Judiciário pela conversão da prisão em flagrante em preventiva, devendo tal pedido ser apreciado nas próximas horas. Reitera-se o compromisso da Polícia Civil com a aplicação da lei penal, objetivando a devida responsabilização do autor pelos fatos ocorridos.
Edição: Extra Classe