No dia que completa seis meses da morte do jovem Gabriel Marques Cavalheiro, ocorrida em São Gabriel (RS), após ser abordado por policiais militares, a deputada federal Luciana Genro (PSOL) lançou uma campanha pela aprovação do projeto de lei que determina a instalação de câmeras em uniformes e viaturas policiais no Rio Grande do Sul.
Apresentado nesta segunda-feira (13), no Salão Júlio de Castilhos da Assembleia Legislativa, o projeto levará o nome de Gabriel junto com Gustavo Amaral, engenheiro negro de Santa Maria que foi morto em uma ação policial, na cidade de Marau em abril de 2020.
“Sabemos que as câmeras não resolverão todos os problemas, mas garantem a transparência que vai inibir o mau uso da força pública. Essa é uma política que precisa de lei para ser regulamentada e, assim, não ficar ao bel prazer de governos. Queremos câmeras em todos os batalhões, em especial nas áreas mais empobrecidas, que é aonde a violência acontece,” afirmou Luciana Genro.
De acordo com dados apresentados pelo Núcleo de Defesa dos Direitos Humanos da Defensoria Pública do RS, as principais denúncias recebidas pelo órgão são relatos de violência policial. Só em 2022 foram realizados 1.061 atendimentos com essa temática. “Todas são marcadas pela disputa de narrativa entre vítima e agressor, além de um grande receio de enfrentar represálias por parte da polícia”, apresentou a defensora pública Aline Palermo Guimarães, dirigente do Núcleo.
"Cada vida que for salva pelas câmeras faz a diferença"
Presente ao evento, Guilherme Amaral, irmão de Gustavo, enfatizou que seguirá lutando pela aprovação da lei. “Esse é um projeto para toda a sociedade e cada vida que for salva pelas câmeras faz a diferença. Estamos aqui para que nenhuma outra família passe pelo que a nossa passou”’, afirmou. Sua mãe, Eneida Salete dos Santos, contou emocionada que é no filho Gustavo e na injustiça que ele sofreu que ela pensa todas as noites antes de dormir.
Por sua vez, Anderson da Silva Cavalheiro e Rosane Marques, pais de Gabriel, reforçaram que sua luta pela aprovação do projeto é para que o que aconteceu com seu filho não aconteça com outros jovens. “Acredito que o treinamento deles (policiais) não é pra espancar, mas perdemos um menino cheio de vida que só queria ir pro Exército. Tiraram meu filho de mim e peço que, por favor, quem é pai e mãe olhe para os seus filhos e apoie esse projeto para que nenhum menino seja abordado dessa forma”, disse Rosane, emocionada ao falar sobre o tema.
Coautor do projeto, o deputado estadual Matheus Gomes (PSOL) expôs o caso de um primo que foi morto em uma ação policial em Camaquã, caso resultou em muitos anos de batalha judicial. “É fundamental pensar o controle social dessas imagens, que deve levar em conta tanto a sociedade como os profissionais da segurança pública”, declarou.
A deputada federal Fernanda Melchionna (PSOL/RS) classificou o projeto como urgente e civilizatório diante de uma das polícias que mais mata e mais morre no mundo e afirmou que lutará pela pauta também em Brasília. “Essa é uma simples medida que, acompanhada por essa redação que a Luciana Genro traz, protege a população e também os policiais de serem perseguidos internamente, pois traz segurança aos bons policiais e evita que criminosos de farda utilizem seu espaço de poder para violentar, espancar e assassinar. Levarei esse projeto para o Ministério da Justiça para que possamos fortalecer ainda mais essa luta”, destacou.
Representando o Coletivo Juntos, Daniel Oliveira reforçou que o projeto não é apenas uma medida para tentar salvar vidas do ponto de vista da segurança pública, mas é uma política antirracista, efetiva e de sucesso onde foi implementada. “Exigir justiça hoje é manter viva a memória da brutalidade que esses jovens vivenciaram. Essa homenagem ao Gustavo e ao Gabriel é uma forma de fazer justiça também, pois justiça é, sobretudo, manter a memória desses jovens para que nunca mais aconteça,” apontou.
Mudanças no projeto
Luciana Genro já havia apresentado o projeto na legislatura passada. Ele chegou a ser votado no final de 2021, mas foi rejeitado em plenário por 29 votos contrários e 16 favoráveis. A deputada chegou a reapresentar a medida em 2022, mas com o fim da legislatura a iniciativa foi arquivada. Por isso, agora o PL é reapresentado com modificações.
Uma das mudanças no atual projeto em relação ao anterior é que o acesso às imagens não simultâneas (assíncronas) só poderá ocorrer com autorização judicial, evitando assim perseguições internas na Brigada Militar ou até mesmo aos movimentos sociais, em manifestações públicas.
“Esse projeto é bom para a população e também para os bons policiais, que ao serem acusados de alguma conduta que não cometeram, poderão se defender com o uso das imagens. E para evitar que sejam perseguidos internamente por comandantes, incluímos o dispositivo que prevê que as imagens gravadas só possam ser acessadas com autorização da Justiça”, explicou Luciana Genro.
Testes já mostram resultados
Conforme a Secretaria de Segurança Pública do RS, tanto as equipes da Brigada Militar quanto da Polícia Civil, que já utilizaram os equipamentos em caráter de teste, avaliam que o registro em vídeo das ações trouxe maior segurança aos próprios policiais. Também inibiu o comportamento dos indivíduos abordados, a partir do momento em que percebiam que estavam sendo filmados.
Em São Paulo, onde já está sendo aplicada, a medida reduziu em 80% as mortes em operações policiais após um ano. Também graças às câmeras as mortes de policiais em serviço foram reduzidas, alcançando o menor número nos últimos 30 anos.
:: Clique aqui para receber notícias do Brasil de Fato RS no seu Whatsapp ::
Edição: Marcelo Ferreira