É fundamental que o novo governo consiga elevar e valorizar a cultura
Do que trata a cultura e porque a necessidade de um Ministério? A cultura é uma expressão que reflete diferentes formas de interpretação como ser culto, ter hábitos, crenças, mas também produção artística quanto o modo de vida, o conjunto de saberes, a religião entre outros.
No Brasil, ao contrário de outros países, a Cultura como Ministério só se concretizou com o governo José Sarney, mas logo com Fernando Collor de Mello já seria extinto. Neste vai e vem, a mesma se tornaria novamente um Ministério nos governos de Fernando Henrique, Lula e Dilma, voltando ao ostracismo, uma mera pasta, com Michel Temer e Jair Bolsonaro. As justificativas são muito diferentes: enquanto para Temer a mesma era uma redução de despesas e o equilíbrio fiscal, para o segundo, governo Jair Bolsonaro, a justificativa era o fato de a Cultura destinar recursos sempre aos mesmos grupos, logo não cumprindo os objetivos, além do equilíbrio fiscal.
Neste último governo, a cultura sofreu um verdadeiro desmonte, não apenas de pessoal, com secretários sem nenhuma experiência cultural e muito menos de infraestrutura, passando a fazer parte do Ministério da Cidadania, sendo então transformada em Secretaria Especial de Cultura. Também em recursos, a Cultura minguou a ponto de reduzir o número de projetos apresentados inicialmente pelos produtores culturais, obtendo assim aval da gestão para captar recursos. Os números só nos dois anos caíram 10% de 2020 para 2021. Mas são os montantes que os projetos arrecadaram na prática que mostram o cenário real de onde o dinheiro aprovado pela lei de incentivo foi parar. Os Projetos aprovados caíram 43% entre 2020 e 2021 e em 2022, até outubro, eram de apenas 922, maior queda desde 2009 (Serie SALIC).
Em Porto Alegre, os repasses à Cultura caíram de R$ 58 milhões em 2014 para apenas R$ 24 milhões em 2019, valor que corresponde a 0,37% da despesa total. A questão cultural é muito complexa em análise regional, pois não é unânime o entendimento de sua importância como eixo de desenvolvimento. Uma das despesas que melhor evidencia a descontinuidade do destino de verbas em Porto Alegre é o Carnaval. De acordo com o TCE (2022) o gasto feito pela prefeitura de Porto Alegre vem caindo desde 2014, com expressiva redução a partir do primeiro ano de gestão Marchezan. Isso apesar de o atual prefeito não ter reduzido o orçamento destinado para o segmento, que se manteve estável nos quatro anos de seu mandato, girando ao redor dos R$ 50 milhões ao ano – mas também abaixo do patamar médio mantido por seus antecessores.
Mesmo enfrentando todos os reflexos da pandemia, este setor produtivo encarou sobremaneira a falta de capacidade de seus gestores, pessoas sem conhecimento na área, como por exemplo Mário Frias, ex-secretário especial da Cultura.
Este desmonte também se refletiu nos problemas com a pandemia de 2020 a 2022 e a descapitalização dos atores envolvidos, sobretudo os de menor porte, que somente ao final de 2022 iniciaram uma nova curva de atividades programáticas, mas longe de recuperarem o tempo e os recursos perdidos.
A cantora Margareth Menezes é a nova ministra da Cultura. Quais os desafios do novo ministério e de seus gestores? Embora sejam muitos os desafios, dois em especial gostaria de problematizar:
Primeiramente a importância que o mesmo terá junto aos demais ministérios, sobretudo em se tratando de recursos e infraestrutura. Os dados mostram que a pasta eternamente sofre com uma desidratação de recursos que se deve aos grupos de poder e as barganhas entre estes. Ganha aqueles que têm maior articulação;
Em segundo lugar a capacidade de articulação da nova equipe, sobretudo a ministra Margareth Menezes para com a categoria cultural como um todo e os demais grupos. Espera-se que o grupo que subir aos cargos de gestão juntamente com ela tenha a capacidade de conversar com a categoria artística e demais atores que compõem a cultura de modo a articularem-se nos mais difíceis momentos que possa vir a ocorrer.
Mas é importantíssimo que não sejamos céticos para com o arcabouço que se desenha e que o novo governo consiga elevar e valorizar a cultura.
* Judite Sanson de Bem, economista e professora da UniLasalle.
** Este é um artigo de opinião. A visão da autora não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.
Edição: Katia Marko