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Retrospectiva 2022 e perspectivas para 2023

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O ano de 2022 foi de muita lutas e 2023 será de novos desafios pela frente - Divulgação
Estaremos atentos junto a outros que lutam e resistem para construção de políticas mais inclusivas

Estamos encerrando o ano de 2022 - um ano intenso e de muitas lutas - e esperando 2023 com esperança na reconstrução e transformação da esfera pública no país, das políticas urbanas, do planejamento, da política habitacional social e da participação popular. Mas estamos cientes de que o caminho não será fácil e que grandes desafios teremos pela frente.

No ano de 2022 iniciamos a parceria com o Brasil de Fato RS a partir de uma série de artigos sobre os 250 anos de Porto Alegre. Nossa intenção foi debater nossa cidade e pesquisas a partir de um posicionamento crítico com relação à atual gestão do município e de um balanço do processo de produção espacial que está se realizando na metrópole nos últimos anos.

Estamos vivendo a gestão urbana mais neoliberal da história de Porto Alegre, a qual está atuando claramente em favor do mercado imobiliário, das grandes construtoras, desregulando a produção e fragmentando a cidade, privatizando tudo, inclusive os bens comuns (parques, orla). Ao mesmo tempo temos o legislativo mais conservador da história de Porto Alegre, o qual, em consonância com o executivo, está mudando a legislação municipal em favor dos grandes grupos econômicos. Aqui registramos a brava resistência de vereadores e vereadoras da oposição e o protagonismo da “bancada negra” em diversas frentes deste debate. 

A indústria imobiliária está apostando nos grandes projetos, na produção da cidade para a classe média e alta, nos grandes condomínios, ampliando a segregação socioespacial e as desigualdades entre centralidades e periferias. Projetos da iniciativa privada estão avançando (ou tentando avançar, pois há resistências) sobre territórios das populações tradicionais (quilombolas, povos originários), num processo de expulsão de moradores para periferias mais distantes ou mesmo para outros municípios da Região Metropolitana.

Diante deste quadro pensando nas articulações que a política nacional pode e deve ter com as políticas locais, apresentamos agora um breve balanço de 2022 e as perspectivas da política urbana e das lutas urbanas para 2023.

Balanço de 2022

Em abril de 2022 o Observatório das Metrópoles-Núcleo Porto Alegre participou do Fórum Social das Resistências, em duas frentes: nas assembleias de convergência “Resistência Urbana: pelo Direito à Cidade e contra os despejos e violações de direitos” e “Lutas Socioambientais frente ao aquecimento global”. Além destes dois momentos de articulação de movimentos e organizações sociais do Brasil e de fora do país em torno destas duas temáticas, o Observatório das Metrópoles organizou um debate virtual denominado “Conflitos, participação e alternativas para as cidades latino-americanas”, com a participação de observatórios e movimentos sociais do Uruguai, Chile e Argentina.

Participamos da Conferência Popular pelo Direito à Cidade foi realizada no mês de junho em São Paulo, a qual teve um impacto local, pois reforçou a Campanha Despejo Zero no RS e também por reunir delegados de movimentos e organizações sociais de Porto Alegre e do estado que participaram junto aos 600 delegadas/os de movimentos e organizações sociais do Brasil, entre eles pesquisadores do Observatório das Metrópoles. A Conferência lançou o documento Plataforma de Lutas Populares pelo Direito à Cidade que reuniu propostas em torno aos dezesseis eixos temáticos entre eles “democracia urbana, participação social e esfera pública”, “favelas, periferias e bairros populares na luta pelo direito à cidade”, “propriedade e posse da terra, função social da terra e cidade, espaço público urbano”, “mulheres, população LGBTQIA+, sexismo e vivência nas cidades e meio ambiente, saneamento, saúde e segurança alimentar”.

Em agosto de 2022 realizamos o Fórum Local da Reforma Urbana e Direito à Cidade: Reflexões a partir de Porto Alegre, o qual trouxe muitas possibilidades de interação entre o Núcleo Porto Alegre e representantes de movimentos sociais. As lutas urbanas e o cenário político e econômico neoliberal foram o principal foco dos debates, discutindo sobre estratégias de resistência às tentativas de silenciamento de vozes das comunidades locais e das políticas de apoio ao mercado pelo poder público municipal. O resultado, além do Fórum, foi a publicação de um livro, a exemplo do que ocorreu também nos demais Núcleos da rede do Observatório das Metrópoles (OM).

Atuamos também no processo de Revisão do Plano Diretor de Porto Alegre, discutindo as desigualdades sociais e suas espacialidades pouco observadas no contexto da cidade; esvaziamento da participação social, que não acompanha os avanços nas propostas pró-mercado dirigidas às faixas de orla e em relação a outros planos específicos como o Centro Histórico e o +4D. Vimos a dificuldade de estabelecer um diálogo numa perspectiva democrática e participativa, principalmente com a população de baixa renda, que demonstra uma difícil abertura da Prefeitura para pensar na revisão do plano diretor de forma mais inclusiva, a fim de reduzir as desigualdades sociais nas regiões de gestão e planejamento da cidade de Porto Alegre.

Por fim, estivemos atentos às Eleições 2022 e seus resultados em Porto Alegre e no Brasil. Publicamos aqui no Brasil de Fato RS e nas nossas redes sociais uma análise da eleição nos territórios. Dada a situação de polarização social e política e uso do poder econômico e da máquina pública em favor da coalizão governamental, os resultados foram satisfatórios. No RS houve um crescimento da votação do campo popular que quase foi ao segundo turno na eleição para governador. Em inúmeras cidades, especialmente na Metade Sul, foi vitoriosa a esquerda. No município de Porto Alegre a esquerda venceu nos dois turnos, com votação expressiva vinda das periferias. Também podemos destacar as candidatas e candidatos do campo popular eleitos deputados e deputadas federais e estaduais, especialmente as mulheres e a bancada negra.

Quanto ao resultado geral, o mesmo traz perspectivas de uma nova orientação na condução de políticas sociais, redução de desigualdades, uma nova realidade para educação e para a cultura. Em termos estaduais o ritmo seguiu o processo nacional, com menor intensidade, mas com a mesma polarização. Embora de coligações diferentes, o estado mantém a mesma condução anterior, inclusive com o mesmo gestor.  

Perspectivas para 2023

O livro Reforma Urbana e Direito à Cidade em Porto Alegre continuará a reverberar em 2023, pois está previsto lançamento na cidade e também debates públicos em torno ao resultado das pesquisas e temáticas discutidas na publicação.  O livro Reforma Urbana e Direito à Cidade, do Núcleo Porto Alegre, reuniu em capítulos os principais temas que estão em pauta atualmente nas metrópoles brasileiras e em Porto Alegre tais como: as desigualdades urbanas, desemprego e pobreza; habitação, mobilidade, quem governa a cidade, democracia, grandes projetos urbanos, plano diretor, lutas urbanas e sistemas alimentares. 

Nós do Observatório das Metrópoles continuaremos acompanhando o processo de revisão do PDDUA de Porto Alegre fazendo as devidas críticas ao caráter privatista e antidemocrático da revisão, que tende a produzir mais desigualdades socioespaciais em nossa cidade. Neste processo estaremos ao lado de outras organizações da sociedade civil e movimentos sociais e populares visando a conquista de uma gestão mais democrática e uma metrópole menos desigual e mais solidária.

Nossa rede nacional continuará com as suas pesquisas, agora com a perspectiva de um novo horizonte do INCT para 2023/2024. Consideramos que o novo Censo de 2022 será importante para avançar em nossas pesquisas e a criação de banco de dados do Observatório, a fim de elaborar séries históricas para as pesquisas e publicizar para a comunidade nossas análises sobre as políticas públicas urbanas. Acreditamos que uma temática que devemos ter atenção será a relação entre meio ambiente e cidade. Consideramos que o projeto nacional Risco e Sustentabilidade que Porto Alegre faz parte poderá contribuir para a produção de artigos sobre esta temática para os próximos anos.

Será muito importante a partir de 2023 acompanhar a reconstrução das políticas urbanas no Brasil e também as políticas estaduais que tenham impacto sobre Porto Alegre e as cidades do RS. Estaremos atentos junto a outras redes e movimentos sociais que lutam e resistem para construção de políticas mais inclusivas, com redução das desigualdades sociais, com o olhar para a diversidade no território, comunidades indígenas e quilombos urbanos, sempre com o horizonte de uma Porto Alegre profundamente democrática.

O Núcleo Porto Alegre do Observatório das Metrópoles agradece a oportunidade de parceria com o Brasil de Fato RS e a todas/os que nos acompanharam em 2022. Desejamos um 2023 com esperanças renovadas e ideias transformadoras para a reconstrução do nosso país.

* Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.

Edição: Marcelo Ferreira