Como não torcer pelo Brasil em 2022, apesar de tudo e dos tempos atuais?
Meu sobrinho Cléo Roger, bom professor do Instituto Federal de Lauro de Freitas, Bahia, respondendo a um comentário meu depois da derrota do Brasil para a Croácia na Copa do Mundo, resumiu à perfeição o que aconteceu: “Essa seleção que não dá uma pernada, um carrinho, não faz uma falta quando precisa! Fica difícil mesmo ganhar.”
Saí às ruas do centro de Porto Alegre depois do jogo contra a Croácia. Silêncio total. As pessoas caminhavam cabisbaixas, quase não se olhavam, não conversavam, não sorriam, não faziam gestos ou trocavam palavras olhando-se no rosto. O sentimento da derrota inexplicável estava caminhando atordoado nas ruas, povo tentando entender ou absorver o que tinha acontecido. O silêncio aumentou muito quando, dias depois, a Argentina fez 3x0 na Croácia, com grande futebol, mostrando como se deve jogar, com garra, vontade de ganhar e maestria.
Torço pelo Brasil desde quando me conheço por gente. Isto é, 1958 e 1962, guri, ouvindo a narração das partidas pelo radião, um aparelho de rádio daqueles das antigas, enorme, lá de casa, Santa Emília, Venâncio Aires, interior do interior do Rio Grande do Sul, única forma de saber das coisas e do mundo. Sempre ouvindo a então poderosa Rádio Guaíba, por onde também escutei, no início dos anos 1960, os discursos de resistência do governador Brizola na Campanha da Legalidade, cujo hino aprendi a cantar e sei de cor até hoje: “Avante brasileiros de pé,/ unidos pela liberdade./ Marchemos todos juntos de pé/ com a bandeira que prega a igualdade./ Protesta contra o tirano,/ se recusa à traição,/ que um povo só é bem grande,/ se for livre como a Nação.”
Em 1970, Brasil tricampeão, em meio à ditadura, eu estava no Noviciado dos Franciscanos em Daltro Filho, então município de Garibaldi, hoje Imigrante. Pela primeira vez, foi possível ver os jogos na televisão, o que fizemos com emoção, vendo Pelé e companhia, independente dos ditadores de plantão.
Sou do futebol desde sempre, começando pelo potreiro de casa, onde instalamos, os sete irmãos homens, duas goleiras, e convidamos os muitos primos e vizinhos. E dê-lhe jogar futebol, ao lado de bois, vacas e terneiros. No Seminário, em Taquari, a maior diversão sempre era o futebol.
Depois, joguei, como titular, o último jogo no primeiro campo do São Luiz de Santa Emília, minha comunidade, e o primeiro no novo campo, hoje conhecido de Luizão. Joguei em todos os campos da redondeza: do Operário de Santa Emília, do primeiro e atual campo do 25 de Julho de Santa Emília, do São Pedro de Santa Emília, do Fluminense de Mato Leitão, do campo do Cecília da Linha Cecília, do campo do Ipiranga da Linha 17 de Junho, terra da minha mãe. Sem esquecer as excursões dos estudantes franciscanos por todo Rio Grande, onde não faltava nunca a apresentação teatral à noite e, no dia seguinte, o jogo de futebol contra um time local. Voltávamos felizes e revigorados para a Vila Franciscana em Porto Alegre.
Lá em casa, em conversas de família, até hoje a dúvida é sobre quem era o melhor jogador dos 7 irmãos homens, todos jogadores do São Luiz. Mas, segundo alguns, a melhor jogadora da família é/foi a mana Elma, jogadora de futebol, várias vezes campeã pelo São Luiz em campeonatos femininos na região dos Vales do Taquari e Rio Pardo.
Como não torcer pelo Brasil em 2022, apesar de tudo e dos tempos atuais?
Primeiro, a eterna paixão. Nunca se sai do futebol, contra ou a favor, e o futebol nunca sai da gente, do coração.
Segundo, com Lula eleito presidente, só faltava o Brasil campeão para coroar definitivamente 2022 como ano para entrar e ficar na História. A alegria e os festejos seriam duplos ou triplos e a entrada em 2023 seria ainda mais gloriosa do que será.
O futebol está na alma de brasileiras e brasileiros, mesmo não se gostando de Neymar ou de algum outro jogador, ou do comércio absurdo e fortunas de seus jogadores.
Na vida, na política, na comunidade, e principalmente no futebol, além de inteligência e de saber jogar, é preciso saber driblar, dar carrinhos e pernadas no momento certo, fazer faltas normais para impedir o avanço do adversário, e tudo mais que o futebol nos ensina.
Que 2023 não repita os erros da seleção brasileira desta Copa. Que aconteçam muitos passes certos, haja muita unidade em campo, torcida e jogadores, o máximo de solidariedade e jogo coletivo, sempre com humildade, acreditando no povo brasileiro e no sonho e na utopia de um Brasil com justiça, igualdade, soberania e democracia. Com muitas vitórias, sem derrotas e sem silêncio.
* Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.
Edição: Katia Marko