Rio Grande do Sul

POA 250 anos

Raul Ellwanger e Omar de Barros Filho participam do "Encontro com Escritores da Cidade"

Atividade está inserida na programação do aniversário da Capital e deve se repetir mensalmente na Livraria Bamboletras

Brasil de Fato | Porto Alegre |
Raul Ellwanger e Omar de Barros Filho participam de live e divulgam a produção cinematográfica realizada em parceria - Reprodução

Estreou o "Encontro com Escritores da Cidade", neste sábado (5), na Livraria Bamboletras e com transmissão ao vivo pela Rede Soberania. A atividade faz parte das comemorações dos 250 anos de Porto Alegre.

A live foi apresentada por Paulo Timm e recebeu como convidados o jornalista e cineasta Omar de Barros Filho e o cantor e compositor Raul Ellwanger.

O evento deve se repetir mensalmente, sempre no primeiro sábado de cada mês. O objetivo é valorizar os escritores naturais de Porto Alegre e também a Livraria, que abriu as portas para o evento.

Além de contar um pouco da história dos dois autores, o encontro também buscou divulgar a minissérie "Cantata Sete Povos", escrita e dirigida por Omar, realizado em parceria com Raul. O filme conta uma parte da história das Missões Jesuíticas, baseado na "Cantata dos Sete Povos" do cantor Ellwanger.

O 1° episódio está pronto e deve estrear ainda em novembro, em sessão a ser realizada na Cinemateca Paulo Amorim, na Casa de Cultura Mario Quintana, em Porto Alegre. Além disso, o filme ficará disponível gratuitamente na internet, através do Youtube e do site do Instituto Latinoamerica.

O 2° episódio da minissérie começará a ser produzido em breve, com previsão de também realizar filmagens na Argentina e no Paraguai

Um pouco da história de Omar de Barros Filho

Omar começou contando um pouco da sua relação com a literatura. "Nasci em 1952, criado em Porto Alegre. A minha carreira profissional, no campo do jornalismo, do cinema e da produção de livros, começa muito cedo. Já na minha primeira infância eu tinha muito contato com os jornais e com o rádio", recordou.

Afirmou se considerar uma pessoa de sorte por nascer em um lar onde havia acesso a um rádio de qualidade e livros em abundância. Foi alfabetizado com cinco anos, iniciando cedo no mundo da leitura. "Isso tudo foi formando meu cabedal cultural e me levou muito cedo para meu caminho."

Seu primeiro trabalho como jornalista foi gravando uma entrevista para o Grêmio Literário do Colégio Rosário. Recordou também sua primeira experiência com o cinema, quando foi levado, pela sua mãe para assistir um festival de filmes expressionistas alemães, na Reitoria da UFRGS, em plena ditadura.

"Eu fiquei muito impressionado, aquilo me marcou profundamente, a partir dali eu passei a estudar mais o cinema. Minha mãe dizia que eu tinha que entender os símbolos que o cinema oferece", contou. A partir desse interesse é que foi estudar Jornalismo, deixando o cinema "para usufruto próprio".

"Aderi ao cinema em momento de crise, em plena guerra na América Central, enquanto eu trabalhava como jornalista correspondente dos conflitos na Guatemala, El Salvador, Nicarágua e Honduras. Em um momento, estive numa fazenda ocupada pela guerrilha, em El Salvador, quando chega uma equipe mexicana de filmagem para rodar um filme. Eu fui testemunha da cena, eu fiquei encantado, foi a primeira vez que vi como se rodava um documentário", afirmou.

Foi a partir daí, segundo Omar, que teve despertado seu desejo de trabalhar com cinema assim que retornasse ao Brasil.

Vivência com o jornal "Versus"

O cineasta relatou que começou a atuar no jornalismo nos anos 70, quando teve a oportunidade de trabalhar no jornal Versus, periódico alternativo, editado distribuído em São Paulo. O jornal propunha a integração do Brasil com a cultura e a política da América Latina, ao invés "de ficar de costas, negando suas próprias raízes e origens. O Marcos [criador do jornal] tinha uma palavra de ordem que era da gente trabalhar a cultura como uma forma de ação, uma forma de agir na realidade e não em um mero deleite intelectual".

Segundo ele, durante essa época que foi a primeira vez que ouviu o nome do outro convidado da live. "Estávamos na redação e recebemos uma matéria, vinda de Buenos Aires, que tinha uma entrevista com o poeta Ferreira Gullar, feita pelo Raul Ellwanger. Não tínhamos internet, mal tínhamos telefone, nosso melhor repórter era o carteiro, que trazia materiais de todo o lugar."

Sobre Raul Ellwanger

O apresentador da live, Paulo Timm, ressaltou o caráter de reencontro do evento, lembrando que os dois convidados acabaram por ter seus destinos cruzados no passado, fora do RS. Convidado a se apresentar, Raul Elwanger contantou sua trajetória até o ponto de trabalhar em um filme com Omar.

Disse que nasceu em 1947, tendo ascendentes de origem missioneira. "Em Porto Alegre, estudei em colégios particulares até um momento decisivo para mim que foi em 1966, quando entrei para a Faculdade de Direito, na PUC, com 18 anos. No mesmo ano, entrei para o quartel. Fazia o CPOR, depois ia trabalhar na farmácia do meu pai, de noite eu ia pra PUC."

"Fui despojado de muitas coisas [quando fui exilado], inclusive da minha cidadania, mas uma coisa esqueceram de tirar de mim: eu nunca deixei de ser 2° Tenente R2 do Exército", comentou bem humorado.  

Relatou que nessa época teve contato com o movimento estudantil e com a música. "Nesse meu cronograma das 24h do dia tinha mais um período que era a madrugada, tinha época que eu não dormia, eu ia pro quartel, trabalho, faculdade e depois pra malandragem."

Suas primeiras ações como músico foram na construção do 1° Festival Universitário de Porto Alegre e, depois, do 2° Festival da TV Gaúcha, no qual inscreveu músicas suas. Nessa época, participava da política do movimento estudantil e já se apresentava musicalmente.

"O movimento estudantil cresceu muito entre os anos de 1967 e 1968, até levar a 'pancada' AI-5. O movimento musical da nossa cidade era muito intenso. Nos reuníamos em entidades, clubes de cultura, nas próprias faculdades", comentou.

Contou ainda que, em determinado momento, foi surpreendido ao ser convidado para participar de uma matéria jornalística, o que o deixou surpreso. Quando foi ao local combinado para ser entrevistado, o jornalista responsável era Marcos Faerman, o mesmo que, anos depois, iria fundar o jornal Versus.

Quando do recrudescimento da ditadura, em 1968, ingressou na clandestinidade, vivendo nessa condição durante dois anos, até ser condenado pela Lei de Segurança Nacional. Foi quando decidiu fugir do país para o exílio no Chile.

"Lá fiquei até o golpe de Estado, em 1971, quando tive minha casa invadida na noite mesmo do golpe. Fiquei só com a roupa do corpo. Meu amigo que morava comigo foi levado sequestrado. De lá, fui para a Argentina, onde reencontrei companheiros do movimento estudantil de Porto Alegre", recordou.

Foi nesse momento que, segundo contou, produziu a reportagem com Ferreira Gullar que seria enviada para o jornal Nexus, no Brasil. Raul conta que acabou por voltar ao Brasil antes da Lei de Anistia. "Fui preso. Na verdade, sequestrado, pois não havia mandato judicial," disse. Depois da Anistia, seguiu sua carreira musical.

Produção do filme "Cantata Sete Povos"

O jornalista Omar explicou que foi instigado por um amigo em comum com Raul a fazer um filme sobre as músicas do compositor que têm como tema a Região das Missões.

"Quando eu conheci as músicas eu fiquei encantado com a obra. São 12 músicas sobre as Missões, sobre a saga do povo Guarani e sua relação com os jesuítas. Eu percebi que, além da riqueza da obra, eu tinha um trunfo que era a própria figura do Raul", disse..

Omar relatou que, ao escrever o roteiro do filme, teve a ideia de sobrepor a realidade que existiu com a que existe hoje, levando o cantor o Raul Ellwanger até as Missões para gravar. "Documentário é um gênero que fica entre o jornalismo e o ensaio acadêmico. Tem que usar a linguagem jornalística, mas sem ficar pesado como se fosse um filme acadêmico", pontou.

O jornalista explicou que tomou a decisão, enquanto roteirista, de privilegiar a figura do cantor Raul como "contador e cantador" da história, sendo o fio condutor da narrativa do filme. "O resultado é um filme delicado e carinhoso", afirmou.

Ellwanger, por sua vez, disse que a história das Missões e do povo Guarani é imensa, enquanto a cantata e o filme falam de apenas 12 canções, com cerca de 40 minutos. "Como cabe essa epopeia toda? Na verdade, a cantata fala apenas de um período, de mais esplendor, que vai de 1680 até 1750. Começa fazendo um apelo aos deuses de ambas as religiões e segue falando do trabalho, do amor, da guerra, da produção e da luta dos impérios."

O compositor explicou também que cada uma das 12 músicas tem sua autonomia, podendo ser escutadas em separado (clique aqui para ouvir), mas que, juntas, compõem a obra completa.


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Edição: Marcelo Ferreira