Ao não punir assassinos e torturadores o Brasil permitiu sobrevida à bestialidade que explode agora
Desde o domingo (30) deste ano mais da metade do Brasil respira com relativo alívio. A não reeleição do atual presidente representou muito, muito mais do que uma vitória eleitoral. Nas redes, mensagens e postagens se dividem entre o preto do luto e a alegria com generosas pitadas de bom humor. Mesmo as manifestações antidemocráticas dos inconformados são tratadas com leveza até quando, com precisão cirúrgica, diagnosticam o risco absurdo do fascismo delirante desta parcela de brasileiros.
Muito além da esquerda, sai vitoriosa uma enorme parcela da sociedade brasileira. Vitoriosa apesar da máquina de Estado, farra de recursos públicos, auxílios diversos e sem critérios, terror e medo impostos pelas igrejas fundamentalistas, pressão patronal, discurso alarmista, pânico e violência. Por isto é correto afirmar que não foi uma vitória apertada, apesar dos índices. Contra todas as artimanhas da extrema direita, o elemento fundamental foi a unidade, uma gigante vitória.
Inimaginável até pouco tempo atrás, esta unidade surge como alternativa a três grandes ameaças: A destruição do resto da máquina estatal, a corrupção, mas principalmente ao fascismo. Esquerda, centro e direita entenderam que a reeleição levaria o Brasil a uma situação de penúria e caos, lançando as bases para uma guerra civil. O apoio à reeleição veio de setores envolvidos com a corrupção e uma extrema direita fascista, trazendo com estes dois grupos seus seguidores fanatizados a ponto de protagonizar episódios que variam do ridículo à truculência.
O fascismo tupiniquim está à solta no país. O que preparou o caminho para relativizar as ações violentas foi a permissividade com a conduta criminosa do presidente da nação, banalizando estupro, racismo, misoginia, homofobia e outros absurdos. Os resquícios truculentos da ditadura militar nunca foram extirpados totalmente da sociedade brasileira. Ao não punir assassinos e torturadores o Brasil permitiu sobrevida à bestialidade que explode agora e encontra guarida no fanatismo e no medo irracional de um inimigo imaginário.
O Brasil não pode repetir a farsa de uma anistia irrestrita. Não responsabilizar e punir indivíduos e setores responsáveis pelo golpe de 2016 e todas as suas consequências é avalizar as ações criminosas autoras da destruição do Estado brasileiro e da consciência nacional. As quase 700.000 mortes estão aí, o aumento desordenado da violência, o aparelhamento das polícias, a intolerância e a imposição do fundamento religioso não podem ficar impunes, sob pena do assassinato definitivo de nossa fragilizada democracia. O alívio é momentâneo, o Brasil precisa sorrir outra vez!
O canal Pão com Ovo traz, nesta quinta-feira, 10/11, às 20h, o cientista político André Oda e o historiador Cléo Goulart com o tema Fascismo à brasileira.
* Este é um artigo de opinião. A visão da autora não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.
Edição: Katia Marko