Rio Grande do Sul

COAÇÃO É CRIME

Denúncias de assédio eleitoral por empresários disparam no segundo turno das eleições

Unidades do MPT vão funcionar neste fim de semana para assegurar aos trabalhadores o livre direito ao voto

Brasil de Fato | Porto Alegre |
Somente no RS, pelo menos 116 empresas foram denunciadas por ameaças a trabalhadores caso Lula (PT) vença a eleição - MPT/Divulgação

A poucos dias do segundo turno das eleições, casos de assédio e coação eleitoral explodem pelo Brasil. De acordo com o Ministério Público do Trabalho (MPT), os casos aumentaram mais de 2,5 mil por cento quando comparados ao primeiro turno. Até esta quinta-feira (27) foram registrados, em todo o país, 1.850 denúncias envolvendo 1.440 empresas. No Rio Grande do Sul, foram computadas 144 denúncias envolvendo 116 empresas.

Os casos de assédio eleitoral praticados pelas empresa têm em comum a ameaça de redução de atividades e impacto sobre os trabalhadores caso Lula (PT) vença Bolsonaro (PL) nas eleições neste domingo (30).

Em nota conjunta do MPT com o Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (TRT4), as instituições afirmam que ameaças desse tipo podem ser configuradas como prática de assédio eleitoral e abuso do poder econômico do empregador, passíveis de medidas extrajudiciais e/ou judiciais na esfera trabalhista. E defendem o voto direto e secreto como direito fundamental.

Empresas foram obrigadas a se retratar

Uma das primeiras no RS a ter ação ajuizada foi a empresa de implementos agrícolas Stara, com sede em Não-me-Toque. O caso teve origem no dia 3 de outubro, quando começou a circular em redes sociais e na imprensa um comunicado que a empresa enviou a seus fornecedores informando que os investimentos poderiam sofrer redução de 30%, com impacto na cadeia produtiva, a depender do resultado da eleição no segundo turno.
 
No dia 19, o MPT obteve liminar na Justiça do Trabalho que obrigou Stara a respeitar a legislação eleitoral. Foi assinado um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) em que a empresa se comprometeu a retratar-se, o que foi cumprido. Contudo, na postagem seguinte em sua conta oficial do Instagram, chamou a determinação de “censura”, de “ilegal” e de "inconstitucional". Na sexta-feira (21), o MPT-RS juntou uma petição ao mandado de segurança, alertando que a nova publicação tinha o intuito de descredibilizar a retratação. 


Proprietário da Stara Indústria de Implementes Agrícolas é vice-prefeito de Não-Me-Toque (RS) pelo DEM e doou R$ 350 mil para a campanha de Bolsonaro / Reprodução

O proprietário da Stara, o empresário bolsonarista Gilson Lari Trennepohl é vice-prefeito de Não-Me-Toque (RS) e apoiador das campanhas de Bolsonaro (PL) e Onyx Lorenzoni (PL). Ele é objeto de procedimento por abuso de poder econômico por ter envolvido a empresa nas manifestações bolsonaristas de 7 de setembro.

Na sequência, outras empresas e empresários do RS assinaram TACs comprometendo-se a fazer retratação pública pela prática de assédio eleitoral, para não enfrentarem processos que poderiam inclusive levar à prisão. Além de publicação de mensagens informando trabalhadores e sociedade sobre o direito ao voto livre, como forma de multa, as empresas tiveram que bancar campanhas contra o assédio eleitoral em meios de comunicação.

O vereador de Balneário Pinhal e empresário Aldo Menegheti (MDB) teve que se retratar na tribuna da Câmara Municipal após usar o espaço para ameaçar “fechar seu comércio” e “ser ruim” com os funcionários se fosse mantido o resultado apurado no primeiro turno para a eleição majoritária nacional. 

Em Cerro Grande, a proprietária da Padaria e Confeitaria Garcia se retratou por ter cometido assédio eleitoral, registrado em conteúdo compartilhado nas suas redes sociais. Em Miraguaí, empresa Mais Frango, também firmou um TAC por constranger seus trabalhadores em seu direito de voto secreto. 


Comunicado da Miraguaí em destaque no site da empresa / Reprodução

Também a Fazenda da Amarra, de Lavras do Sul, firmou TAC com o MPT comprometendo-se a se retratar por assédio eleitoral registrado em conteúdos compartilhados nas redes sociais, tanto aos empregados quanto à comunidade local. A retratação foi feita pelo Instagram, mesmo canal em que ocorreu a postagem que consubstanciou o ilícito.

A mineradora Brazil Original Minerais, de Soledade, também teve que se retratar após TAC com o MPT. A empresa havia manifestado previsão de suspensão de investimentos caso fosse mantido o resultado do primeiro turno, usando termos como “pátria sem corrupção”, “Deus e família”.

O MPT firmou também um TAC proposto pela unidade do órgão em Santa Cruz do Sul a uma empresa local do ramo de vestuário. A empresa teria, após o fim do primeiro turno das eleições, realizado reunião com os empregados em que foi levantada a possibilidade de fechamento e demissão em massa, dependendo dos resultados do pleito no 2º turno.

Um dos casos mais recentes foi o do empresário Jorge Ademar Gerhardt, proprietário da Granja Gerhardt e da empresa Constinta, de Santo Cristo. Ele teve que se retratar, entre outras medidas, após divulgação de vídeo de reunião com trabalhadores em que ele disse que poderia cortar o quadro de funcionários em 30% caso Lula vença o pleito. 

Centrais sindicais repudiam coações

Após diversos casos de assédio eleitoral coagindo trabalhadores, as centrais sindicais gaúchas lançaram nota conjunta repudiando a prática. Para o presidente da Central Única dos Trabalhadores do RS (CUT-RS), Amarildo Cenci, o voto é livre e secreto. “Assédio eleitoral é crime e nós não aceitamos qualquer forma de intimidação para cabrestear os votos da classe trabalhadora e atacar a democracia”, frisou.

“As Centrais Sindicais no Rio Grande do Sul repudiam a onda de assédio eleitoral promovida por empresários inescrupulosos que não têm compromisso com as liberdades democráticas e com a lei”, diz trecho do documento que pede responsabilização. Trabalhadores e trabalhadoras: não se deixem intimidar”, segue o texto, que incentivou a denúncia através do site do mpt.mp.br

Ramo do comércio de todo o país na mira 

O Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região (TRT-10) expediu, nesta terça-feira (25), uma liminar contra a Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC) que proíbe empresas e empresários do setor de coagirem trabalhadores a votar no presidente Jair Bolsonaro (PL), candidato à reeleição. A medida vale para empresas e empresários do ramo do comércio, em todo o país, independentemente do endereço e porte. A ação foi movida pela CUT, UGT e Confederação Nacional dos Trabalhadores no Comércio e Serviços (Contracs-CUT).

Na decisão, o desembargador Antonio Umberto de Souza Junior, determina que a CNC oriente as entidades filiadas por meio de comunicados institucionais em seu site e disparo de mensagens sobre a proibição de assédio eleitoral. Em caso de descumprimento, a decisão liminar prevê multa no valor de R$ 10 mil por cada trabalhador ameaçado, molestado ou constrangido a exercer opção de voto defendida, recomendada ou imposta pelo empregador.

O desembargador decidiu também que as empresas estão obrigadas a permitir que as entidades sindicais tenham livre acesso aos locais de trabalho, para esclarecimentos a respeito do direito ao voto livre. 

MPT vai abrir neste fim de semana

As unidades do Ministério Público do Trabalho vão funcionar, excepcionalmente, neste fim de semana de eleições para assegurar que os trabalhadores brasileiros exerçam livremente o direito de votar no segundo turno das eleições. A medida está prevista em portaria assinada na terça-feira (25) pelo procurador-geral do Trabalho, José de Lima Ramos Pereira, com o objetivo de permitir uma resposta rápida e efetiva do MPT frente ao aumento expressivo de denúncias da prática de assédio eleitoral no ambiente de trabalho. 

Conforme a portaria, todas as unidades do MPT, incluindo a sede da Procuradoria-Geral do Trabalho e as Procuradorias do Trabalho no Município, funcionarão em regime diferenciado de plantão presencial nos próximos sábado e domingo, de 8 às 17 horas (horário de Brasília).


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Edição: Katia Marko