A Polícia Civil começou a ouvir, nesta quarta-feira (19), depoimentos de testemunhas da investigação de racismo sofrido pelo cantor Seu Jorge durante show em Porto Alegre. O presidente do Grêmio Náutico União, Paulo José Kolberg Bing, foi ouvido nesta quinta-feira (20) na Delegacia de Combate à Intolerância de Porto Alegre.
A delegada responsável pelo caso, Andréa Mattos, disse ao G1 RS que o dirigente do clube afirmou não ter presenciado agressões, embora estivesse no local o tempo inteiro. Segundo Bing, o único momento mais hostil durante o show foi quando a plateia vaiou Seu Jorge após ele fazer um gesto alusivo a um candidato à Presidência da República, no caso ao ex-presidente Lula.
Contudo, o presidente do clube disse que podem ter ocorrido ofensas de alguns presentes, em manifestações isoladas que não chegaram “nem formal nem informalmente” ao seu conhecimento, afirma a delegada. Bing reforçou que o União está a disposição para colaborar com as investigações.
A delegada informou que uma equipe da Polícia Civil vai ao clube nesta sexta-feira (21) para entregar intimações a funcionários. Ela quer ouvir trabalhadores presentes durante o show e buscar informações que o presidente ficou de passar.
O presidente se comprometeu em disponibilizar informações como lista de presentes e esquema da organização das mesas dos convidados. Vídeos e áudios da apresentação já foram disponibilizados e foram encaminhados ao Instituto-Geral de Perícias (IGP).
"A questão do som resta um pouco prejudicada em razão dos diversos sons que temos naqueles vídeos. Porque tem burburinho, tem a música, tem instrumento. Daqui a pouco consegue ouvir um pouco das vaias. Então achei melhor encaminhar tanto os vídeos do clube quanto os vídeos que nós recebemos através da internet, das redes sociais, para que a perícia possa fazer a decodificação desses sons e nos ajudar a ter certeza que de fato teve agressões do cunho racista", afirmou a delegada.
Segundo ela, há divergências entre as testemunhas quanto ao momento em que começaram os atos de hostilidade. "Alguns dizem que teriam relação com o lado político, outros dizem que a insatisfação de parte da plateia seria com a participação de um jovem negro e a fala do cantor sobre a maioridade penal. Outros que teria começado quando fez a declamação de uma música dos Racionais MCs. Tenho feito uma análise com muito cuidado", disse Andréa.
A produção do artista e seus músicos também devem ser ouvidos, bem como Seu Jorge e seu advogado. A delegada explica que o caso é investigado como racismo e que o processo está em fase de coleta de depoimentos.
Ministério Público também investiga o caso
O Movimento Negro Unificado encaminhou uma representação à Promotoria de Justiça de Defesa dos Direitos Humanos de Porto Alegre, repartição do Ministério Público do RS (MP-RS), nesta quarta-feira (19). O movimento requer apuração e responsabilização das pessoas envolvidas no caso, assim como do clube Grêmio Náutico União.
Conforme a promotora de Justiça Odete Pinzetta, o Ministério Público irá investigar para esclarecer se há elementos de prova que apontem para a responsabilidade do clube no episódio e se há aspectos que possam ser aprimorados por meio de ajustamento de conduta. De acordo com ela, está agendada para a próxima segunda-feira (24) uma audiência com o presidente do clube para esclarecimentos.
Relembre o caso
Após circular na internet a informação de que Seu Jorge teria sido vítima de ofensas racistas durante show no Grêmio Náutico União, na última sexta-feira (14), o cantor confirmou o episódio, em vídeo de nove minutos publicado em suas redes sociais.
Ele disse que ouviu vaias e xingamentos no final do show, antes de voltar para o bis, quando então apenas retornou e agradeceu a presença de todos. “Na verdade, o que eu presenciei foi muito ódio gratuito e muita grosseria”, assegurou.
No vídeo, Seu Jorge ressaltou que busca punição pelo envolvidos no ato. “Nunca, jamais nos curvaremos ao racismo e à intolerância, seja ela qual for. Não cederemos um milímetro ao ódio. E cobraremos das autoridades que a Justiça prevaleça e os criminosos sejam devidamente punidos. A lei é para ser cumprida.”
Em nova manifestação sobre o episódio, à Globo News, o artista relatou uma manifestação sua que gerou reações no público. Ele conta que citou o exemplo de um músico que o acompanhada, Pedrinho da Serrinha, de 15 anos, para defender a proteção da juventude negra e criticar a redução da maioridade penal.
"Não estava politizando nada. Estava simplesmente fazendo uma fala muito importante porque temos que combater o genocídio da juventude negra no Brasil", disse Seu Jorge.
A delegada afirmou, ao assistir uma primeira gravação do show, que é possível ouvir alguém da plateia falar a palavra "macaco" ao cantor, durante vaias no final da apresentação.
Protestos neste sábado
Diversas entidades, coletivos negros e movimentos sociais, como o Movimento Negro Unificado, o Movimento Vidas Negras Importam, a União de Negras e Negros pela Igualdade (UNEGRO-RS), estão convocando uma manifestação antirracista no Grêmio Náutico União, a fim de levar a luta também para as ruas. O ato será realizado neste sábado (22), com concentração às 16h, na Praça da Encol, bairro Bela Vista.
* Com informações do G1 RS e MP-RS
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Edição: Marcelo Ferreira