Uma residência que foi construída para o escritor Dyonélio Tubino Machado, no bairro Petrópolis, em Porto Alegre, corre o risco de ser demolida a qualquer momento. A casa, localizada na Rua General Souza Doca, encontra-se desabitada e ficou de fora do inventário de casas do bairro, recentemente concluído pela prefeitura.
O Inventário de imóveis realizado pela prefeitura é um instrumento de preservação do patrimônio cultural do Município. Através dele são protegidos imóveis de valor histórico, arquitetônico, urbanístico, ambiental, simbólico e de valor afetivo para a população, entre outros.
A casa foi construída a mando de Dyonélio Tubino Machado em 1942, mesmo ano do lançamento da obra "O louco do Cati". Ou seja, tanto a obra quanto o livro estão completando 80 anos em 2022.
Conforme o documento de Habite-se comprova, em outubro, completa-se 80 anos que Dyonélio foi morar na casa. O documento mostra que um servidor da prefeitura de Porto Alegre atestou que o autor morava no endereço desde 15 de outubro de 1942. A época, a rua chamava-se "Dona Carola". O projeto inicial e o de ampliação estão assinados pelo próprio Dyonélio Tubino Machado.
Situação similar ocorreu em julho deste ano, quando a casa onde viveu o escritor Caio Fernando Abreu foi demolida. Intensa mobilização de ativistas do setor cultural e da defesa do patrimônio não impediu que o imóvel fosse colocado abaixo.
Sobre o autor
Conforme recorda a Biblioteca Pública do Paraná, Dyonelio Tubino Machado nasceu em Quaraí (RS) em 1895. Além de escritor, atuou como médico, sendo um dos precursores da psiquiatria no Brasil. Escreveu em jornais e também militou politicamente.
Foi preso durante o governo de Vargas, em virtude de sua filiação ao Partido Comunista Brasileiro (PCB), inicialmente em Porto Alegre e em seguida no Rio de Janeiro, onde conheceu, entre outros presos políticos, o escritor Graciliano Ramos. Elegeu-se deputado estadual em 1946, mas permaneceu no cargo durante um curto período. Morreu em Porto Alegre em 1985.
Sua obra literária mais conhecida é "Os ratos", de 1935. Porém, Dyonelio Machado é autor de 19 títulos, estreando na literatura há 90 anos com o livro de contos "Um pobre homem".
Conforme o pesquisador Camilo Mattar Raabe, “o que confere unidade ao todo [da obra] é o sistema sociocultural da cidade em vias de modernização e o modo como condiciona e afeta o ser humano em sua psicologia, especialmente os mais pobres e os mais sensíveis”, analisa Raabe.
O professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) Homero Vizeu Araújo define "Os ratos" como um livro notável. “Uma característica extraordinária é o narrador em terceira pessoa que adere à perspectiva limitada e desinformada de Naziazeno, isto é, um narrador que pouco explica e pouco expõe, registrando o percurso do personagem principal sem revelar o quadro maior em que se insere o enredo”, comenta.
De acordo com Araújo, a narrativa estabelece uma atmosfera asfixiante, em que o leitor é induzido a sentir-se como Naziazeno, desorientado e aflito.
Já o livro escrito na casa do bairro Petrópolis, "O louco do Cati" (1942), é considerado pelo pesquisador Fábio Henrique Passoni Martins como uma obra tão intensa quanto "Os ratos", e lembra que alguns críticos e escritores, como Mário de Andrade e Guimarães Rosa, consideravam o romance mais inquietante até do que "Os ratos".
Para Homero Vizeu Araújo, "O louco do Cati" é uma narrativa espantosa, que acompanha a trajetória de um personagem passivo e incapaz de se expressar. “Nessa obra já surgem os elementos de perseguição e opressão políticas que pautam os romances concebidos após 'Os ratos'”, diz o professor da UFRGS.
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Edição: Marcelo Ferreira