Rio Grande do Sul

Eleições 2022

"A presença das bancadas negras, em todo o Brasil, veio para ficar", afirma Laura Sito

Parlamentar é uma das primeiras deputadas negras a ocupar a Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul

Brasil de Fato | Porto Alegre |
Deputada eleita considera muito significativo que a luta antirracista tenha tomado grande proporção em tempos de crise profunda - Foto: Lucas Leffa

Com 36.705 votos, Laura Sito (PT) tornou-se, no dia 2 de outubro de 2022, juntamente com Bruna Rodrigues (PCdoB), uma das primeiras mulheres negras a conquistar espaço na Assembleia Legislativa gaúcha em seus 184 anos de história. Com 30 anos de idade, ela também é a mais jovem que ascendeu ao espaço. 

Jornalista por formação e servidora pública municipal, durante sua atuação como vereadora de Porto Alegre, teve na questão da fome e insegurança alimentar uma de suas principais bandeiras. Neste período, o projeto de sua autoria que criou o programa municipal de aquisição de alimentos, baseado em compras públicas de produtos da agricultura familiar para fomentar programas sociais e abastecer escolas, foi aprovado. O que fez ser nomeada representante do Brasil na Frente Parlamentar de Combate à Fome da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO).

Em entrevista ao Brasil de Fato, Laura diz que, dentre outras pautas, levará esta bandeira ao parlamento gaúcho. “Tirar o Brasil do mapa da fome de novo vai requerer uma mobilização social muito intensa e um comprometimento federativo da sociedade”, destaca. 

Filiada ao PT desde os 16 anos, já foi integrante do diretório nacional e, atualmente, é vice-presidente da sigla em Porto Alegre. Foi a primeira mulher negra na Mesa Diretora da Câmara de vereadores e também fui a primeira negra a presidir uma sessão na Casa.

Abaixo a entrevista completa: 

Brasil de Fato RS -  Tu e a Bruna tornaram-se as primeiras mulheres negras deputadas no Rio Grande do Sul, com quase 200 anos de atividade da Assembleia Legislativa. O que isso representa e quais são os desafios deste efeito histórico?

Laura Sito - De fato estamos em um momento de ruptura em relação à população negra no Rio Grande do Sul. Não só apagaram da nossa história, porque quando nós narramos o que são as tradições gaúchas, o que é o povo gaúcho, nós, mesmos sendo quase 20% da população, somos esquecidos. A não presença nossa nos espaços institucionais, nos espaços de representação é a materialização desta negação de condição de cidadania gaúcha, no nosso estado. 

Pela primeira vez termos mulheres negras deputadas estaduais, deputadas federais,  também, é uma ruptura muito importante no sentido de uma reafirmação de que enfrentar o racismo no estado do Rio Grande do Sul é algo fundamental. Que nós não toleramos mais sermos invisibilizados e não termos a mesma condição de cidadania como o restante da população.

Ingressamos nas universidades públicas pela política de cotas e somos resultado desta política de enfrentamento ao racismo estrutural

BdF RS - Para quem imaginou que seria só uma onda vocês terem conquistado a bancada negra na Câmara de Vereadores de Porto Alegre, vocês repetiram lá na Assembleia Legislativa...

Laura - Sim, esta questão de onda é muito engraçada. Porque o Movimento Social Negro luta há pelo menos, de maneira organizada, uns 40 anos no Brasil. Então os alargamentos dos espaços de representação são um processo. 

Só em 1995, no governo FHC (Fernando Henrique Cardoso), o Brasil reconhece que existia racismo. Só em 2001, na Conferência de Durban, na África do Sul, que o Brasil se compromete em combater o racismo. Só em 2003, no governo Lula, que o Brasil passa a ter políticas públicas para combater o racismo. Neste período começamos a ter as cotas nas universidades. 

Nós podermos ocupar estes espaços institucionais, hoje, é fruto deste processo. Todos nós ingressamos nas universidades públicas pela política de cotas e somos resultado desta política de enfrentamento ao racismo estrutural, através também do processo de democratização do capital cultural da nossa sociedade. 

É um processo histórico e, portanto, não uma onda. É um processo que vem sendo construído e que hoje, felizmente, leva uma parcela importante da sociedade a se sensibilizar de que eu não posso ter cinco votos na minha colinha e nenhum voto ser de mulher. Não posso ter cinco votos na minha colinha e não ter nenhum negro para votar.  As pessoas, uma parcela delas, compreendeu que elas são agente ativo para transformar isso na política. E que era importante que elas se comprometessem em transformar isso na política. 

Portanto a presença das bancadas negras, não só no Rio Grande do Sul, não só em Porto Alegre, mas no Brasil, veio para ficar. Para mim é muito simbólico que nós tenhamos tido uma vereadora mulher, negra, jovem e trans eleita em São Borja. Para mim é simbólico que a bancada de esquerda em Caxias do Sul seja formada por jovens negros. Então nós temos isso em várias regiões do estado e em várias regiões do Brasil. Isso é muito simbólico. 


"Pela primeira vez termos mulheres negras deputadas estaduais, deputadas federais, é uma ruptura muito importante " / Foto: Clara Aguiar

BdF RS - Na Assembleia, na próxima legislatura, serão serão 11 mulheres (20% do total de deputados) a ocupar o espaço, uma a mais do que na atual configuração, estamos ainda longe de um ideal de representatividade... 

Laura - Sem sombras de dúvida. A Assembleia tinha 10 e passou para 11 mulheres, um aumento muito tímido. Eu acredito que nós só vamos garantir a presença de mulheres mais equivalente à nossa presença na sociedade com reserva de vagas no parlamento. 

Claro que a mudança da legislação eleitoral, obrigando os partidos a financiar candidaturas femininas, possibilitou uma melhora na qualificação da representação das mulheres no parlamento. De fato, isso ocorreu. Mas muito aquém, porque não é só o financiamento, tu tem ali uma série de questões prévias nos partidos. 

Eu participo do Instituto Marielle Franco e nós temos feito várias reuniões em nível nacional, fizemos reunião com o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) anteriormente e com outros órgãos falando sobre esta questão. 

Tem uma série de mecanismo anteriores ao pleito que vão fazendo uma peneira sobre as mulheres e limitando a sua participação. Até a própria estrutura da política. Eu tenho um bebezinho de um ano e meio, por exemplo, e me chamam para reunião às oito da noite. Bom, às oito eu tenho que botar meu filho para dormir. Se a reunião começar às oito da noite eu não vou estar, se ela começar às seis e meia eu posso participar. Em Brasília as sessões são noturnas. Então tem aí um ambiente político que não compreende a participação das mulheres, não compreende a participação das mães.

Tema da segurança alimentar é o meu tema principal de trabalho

BdF RS - Quais as propostas estratégicas que tu vai levar para a Assembleia? 

Laura - O meu tema principal de trabalho é a luta contra a fome. Eu hoje participo, represento o Brasil, da Frente Parlamentar de Combate à Fome da FAO ,da ONU, este tema da segurança alimentar é o meu tema principal de trabalho. Eu trabalho agenda de direitos de uma maneira ampla, a questão do parto humanizado, a questão da defesa dos serviços públicos. Eu sou servidora pública municipal de carreira. Então, são temas que vou carregar comigo. 

Mas de fato, tendo um segundo turno entre Onyx e Leite, não vejo uma perspectiva de que nós não tenhamos esse tema com muita centralidade. E ainda que tenho fé que a gente vai eleger o Lula. Mas tirar o Brasil do mapa da fome de novo vai requerer uma mobilização social muito intensa e um comprometimento federativo da sociedade.

BdF RS - De fato conseguir tirar o Brasil novamente do Brasil do mapa da fome vai ser uma grande conquista, mas será um processo difícil, pois temos 33 milhões de pessoas passando fome no país. No Rio Grande do Sul, quase metade da população encaixa-se nos níveis de insegurança alimentar e cerca de 1 milhão de gaúchos não têm o que comer.

Laura - Exatamente. Eu estive na Conferência Estadual de Segurança Alimentar, veio José Graziano e ele estava falando sobre isso, que tirar o Brasil do mapa da fome não é assim:  elegeu o Lula e em fevereiro já está todo mundo de novo comendo picanha. Infelizmente, não é assim que vai acontecer. Vai precisar de um processo.

São vários debates, financiamento, não é só recuperar a renda do brasileiro, não são só os programas de aquisição de alimentos. O que precisa é ter um conjunto de políticas que garantam a seguridade da população.  
É um processo que vai envolver alguns meses de luta política, compreendendo que vamos ter setores liberais muito ativos na disputa dessa agenda econômica. 

BdF RS - Tem outra questão quando falamos da fome, que é algo grave, mas também tem aí a carestia dos alimentos. Tu fez uma ação “ Está tudo caro é culpa do Bolsonaro”. Vemos que e os preços não param de aumentar e isso afeta todo mundo. 

Laura - Sem sombra de dúvida. Claro que a recuperação do controle dos alimentos por parte do Estado é a primeira ação, essa sim é uma ação que presidente Lula pode fazer de maneira mais célere. Porque o total descontrole, entregar na mão do mercado, é o que a gente vive aí, uma selva. Quem tem, come, quem não tem, assiste.


Vereadora Laura Sito preside a Frente Parlamentar em Defesa da Segurança Alimentar e Nutricional da Câmara Municipal / Foto: Gabriel Ribeiro/CMPA

BdF RS - Voltando para a questão aqui do estado. Como será trabalhar dentro da Assembleia com um governo de direita, ou conservador, sendo Eduardo Leite ou Onyx. 

Laura - Obviamente o Leite não é tão conservador como o Onyx, mas do ponto de vista da agenda econômica deles é muito similar. Ainda que o Onyx esteja fazendo algumas sinalizações sobre a não venda do Banrisul e etc, é muito difícil que o seu governo não esteja a serviço da agenda do capital financeiro, por conta dos compromissos que ele tem, que ele também agrega em torno da sua candidatura. 

Então eu vejo a minha atuação na Assembleia partir de fevereiro 2023 como uma atuação de luta política, de resistência, de fortes embates. Quero agregar à nossa bancada, fortalecer a nossa visão ideológica de disputa sobre o Estado com nitidez. 

Queremos desenvolver o Rio Grande do Sul com o combate às desigualdades regionais e locais. Queremos trazer fortemente uma agenda antirracista para o centro da elaboração da nossa bancada, que obviamente, talvez, pela não presença de negros naquele espaço, ela não tinha um papel tão grande naquilo que é produzido. Quero poder fortalecer isso porque, de fato, nós vivemos num estado que é segregado racialmente. É importante que a gente diga isso. 

Quando pensamos no desenvolvimento regional, é importante também que se pense como como desenvolver, garantindo a equidade de gênero, garantindo o combate ao racismo estrutural. A gente falou muito sobre isso, e também sobre a questão das mulheres, tem até um livro que organizei, “E se as cidades fossem pensadas por mulheres”, pensando como é possível agregar uma visão de desenvolvimento, compreendendo que nós precisamos lutar pela equidade.

BdF RS - Vou pegar o gancho do teu livro. E se o Estado fosse pensado pelas mulheres, como seria? 

Laura - Com certeza seria um Estado que teria visão do acesso a bens e serviços considerando as necessidades específicas da maior parte da população, que é feminina.

Hoje, sempre pensamos do ponto de vista do território, que é definido a partir do ganho de poder de um setor sobre o outro. Se o poder é masculino, ele imprime, portanto, na sua constituição, na sua organização sócio espacial esta lógica do poder.

É importante que alteremos a lógica do poder para que possamos garantir políticas públicas para todos e todas. Acesso a direitos para todos e todas. Acesso a bens e serviços para todos e todas, com igualdade. 

Não é possível pensarmos em como combater as desigualdades sem pensarmos na diversidade do que é o povo, que somos trabalhadores e trabalhadoras.


"Tem um ambiente político que não compreende a participação das mulheres, não compreende a participação das mães" / Foto: Clara Aguiar

Quando se quer aniquilar uma ideia ou quanto se quer aniquilar uma existência, nós estamos falando do fascismo

BdF RS - Tivemos essa experiência de vocês aqui da bancada negra, na Câmara. E vimos nesse período muitos ataques a vocês, por parlamentares e também por alguns manifestantes que ali estiveram. Eu queria que tu comentasse esta questão da violência política, um ataque à questão da raça e ao mesmo tempo um ataque à questão de gênero...

Laura - Aqui é uma bancada formada por cinco jovens negros, quatro mulheres e um homem. Os ataques que as mulheres sofreram tinha um componente de gênero sempre agregado. E a Daiana, que é lésbica também, um componente LGBT muito fortemente agregado às ameaças. Infelizmente, o resultado do dia 2 me demonstra que isso não cessará. As declarações da ex-ministra Damares, que vieram à tona ontem (10 de outubro) demonstram o tom da insanidade e do ódio que eles movimentam na sua base social. 

E isso, sem sombra de dúvidas, é o que movimento que organiza esses setores extremistas que visam nos atacar, visam combater não nossa visão política, mas a nossa existência. São coisas distintas. 

Do ponto de vista do combate político, é da democracia e é saudável o confronto de ideias. Mas quando se quer aniquilar uma ideia ou quanto se quer aniquilar uma existência, nós estamos falando do fascismo. E infelizmente o fascismo elegeu uma bancada de deputados e deputadas na Assembleia Legislativa e eu tenho muita consciência das lutas políticas que nós vamos travar ali dentro. 

BdF RS - Na eleição deste ano houve um crescimento do PT na Assembleia, com 11 cadeiras, um crescimento que vem acompanhado do PCdoB e do PSOL, em se tratando do campo da esquerda. Mas também um crescimento da direita, que se reflete também nacionalmente. 

Laura - Na verdade, no Brasil, o centro político, digamos assim, agora se chama centro político o que era centro direita. A extrema direita tomou tanto conta do espaço e tu vê figuras como o Eduardo Leite se considerando centro, quando na verdade são de centro-direita, não do centro. 

Há uma diluição do centro. Uma grande parte mais fisiológica, cooptada pela extrema direita e financiada por ela e uma outra pequena parte que restou ainda um sentimento democrático. Alguns já com o presidente Lula, a própria estada do Alckmin como vice, enfim uma série de alianças que foram ainda constituídas no primeiro turno. É uma sociedade polarizada.  

O resultado do dia 2 demonstra que não tinha muito espaço para quem estava em cima do muro. Porque quando se tem uma disputa forte contra o fascismo, tu não pode não ter opinião em uma briga contra o fascismo. Como é que não vai ter posição? As pessoas estão mentindo para as pessoas que um outro candidato fez pacto com o diabo. Estão mentindo para as pessoas de que existem crianças sendo torturadas e que a pessoa responsável pelos direitos humanos não fez nada sobre isso, fez uma pregação na igreja sobre isso em vez de fazer uma ação judicial sobre isso. 

Tem um nível, um debate... tem ministros que caíram por fazer saudações nazistas.  Não foi só um assessor da presidência, foi mais de um. Se tu tem esse cenário, como é que tu não tem opinião sobre isso? Como é que está indiferente sobre isso? 

A sociedade também não aceita. Por isso nós tivemos grandes bancadas eleitas. Setores que tinham posicionamentos mais firmes foram os que fizeram as maiores votações. Porque a sociedade precisava entender de que lado tu está e o que que tu pensa.


Laura Sito com seu primogênito Pedro/ Arquivo Pessoal

BdF RS - E ainda com essa questão de fake news, que vem forte agora no segundo turno...

Laura - Eu, como jornalista, inclusive, fico pensando no papel do jornalismo de ajudar nesse processo com a checagem. Porque de fato é um conjunto de informações. Muitas pessoas não têm, não sabem como checar e o principal acesso de comunicação das pessoas mais pobres é o WhatsApp, que é o que as empresas têm liberado o acesso. 

As pessoas recebem muita coisa e elas não conseguem processar aquilo, depende muito do seu bom senso. E algumas coisas são muito críveis. Claro que dizer que o presidente fez um pacto com o diabo não é tão crível assim, mas para quem acredita em terra plana... 

Agora, uma ministra dos Direitos Humanos dizer que ela leu os relatórios do Ministério, que crianças eram torturadas e aliciadas sexualmente, bom, eu acredito que seja uma fake news, mas que tem uma legitimação inclusive do cargo institucional que ela estava. Então isso se torna mais grave. Será que pode uma ministra eleita propagar fake news dessa maneira e ficar impune?

Não foram uma ou duas pessoas que me disseram que foram buscar emprego e na entrevista, perguntaram, quem vai votar.

BdF RS -  Nós temos outro fator também, das recentes ameaças das empresas coagindo seus empregados.

Laura - Sim, isso ouvimos  muito. Agora veio à tona, conseguimos provas. A nossa Federação, junto com a Federação do PSOL, fomos ao Ministério Público do Trabalho, conseguimos e a empresa Stara foi multada em 10 milhões de reais por conta disso. Mas nós temos várias denúncias que estamos juntando e pedindo provas para poder agregar o processo de outras empresas.

Isso é muito ruim, é uma guerra estratégia. E tem a questão do silêncio. Pode ver que muitas vezes o eleitor da esquerda, progressista, tem muito mais medo de manifestar o seu voto e seu apoio do que o eleitor conservador de direita. Porque eles detêm o poder econômico. Não foram uma ou duas pessoas que me disseram que foram buscar emprego e na entrevista, perguntaram, quem vai votar.

É muito complicado. Empresas que pediam para os funcionários se vestirem de verde amarelo para tirar foto. Eu andei o estado todo e olha, eu ouvi muita coisa, nem tudo a gente tem como provar, mas eram relatos de pessoas que viveram isso. 

Tu lembra aquele vídeo da fazendeira dizendo que "se os empregados das cidades de vocês forem votar no Lula, demitam, demitam sem dó, emitam com força". Vimos na Bahia uma série de funcionários de fazenda demitidos porque votaram no Lula. Então vai criando esse clima que precisa ser cessado. Não é possível que pensemos que isso é possível, que isso é uma divergência de ideias. Não é possível que pensemos que isso é  o custo Brasil da democracia. Isso é outra coisa. 

BdF RS - Como é que foi a tua campanha? 

Laura - Foi uma campanha diferente. Foi muito rico conhecer o Rio Grande do Sul, viajei todas as regiões do estado. Poder conhecer o estado, poder entender as diferenças das vivências, as realidades sociais e culturais da nossa sociedade. Para mim foi muito bacana encontrar o quanto que o Rio Grande é diverso, ver isso com os próprios olhos me deixou ainda mais aguçada para a gente poder pensar como reescrever essa história.

De um Rio Grande do Sul que é fortemente indígena, de um Rio Grande Sul que é negro, de um Rio Grande do Sul que é feminino, de regiões do nosso estado que são completamente à margem do processo de desenvolvimento regional. Então tem a metade sul, a metade mais pobre do estado, talvez que ainda viva sob os impactos de ter sido a região mais explorada durante o processo da charqueadas, com mão de obra escrava, e que ainda tem localidades bem paradas no tempo. 

Como pensar essa questão do desenvolvimento local compreendendo as dificuldades financeiras do estado, a pouca capacidade de indução do desenvolvimento local, por parte do estado, enfim. Então foi muito bacana. Eu me senti muito fortalecida para chegar na Assembleia. 

BdF RS - Como foi ser mãe e estar sendo mãe neste processo todo?

Larua - Tem sido louco. É a política, é muito dura assim. Se tem uma coisa que eu senti muito mais fortemente na campanha agora para deputada, do que na campanha para vereadora, é que para vereadora a gente faz agenda na cidade e eu estava com um bebê na barriga, então ele ia comigo para onde eu fosse. Mas para deputada, a rede de apoio é muito importante. 

Meu companheiro, minha sogra, minha mãe, foram muito importantes, sem eles assim não teria como passar alguns dias viajando, né? Ele tem um aninho e meio só, precisa se alimentar, dormir e não pode estar comigo a qualquer horário em qualquer lugar.  

Foi muito importante, fortaleceu ainda mais em mim pensar o quanto minha atuação parlamentar deve continuar comprometida com a elaboração de políticas para as mães, para as mulheres. 

Eu sou autora da lei que criou a sala de aleitamento aqui de Porto Alegre, a questão da luta pelo parto humanizado. São temas que precisam ter mais espaço no do dia da política, porque eles não são vistos como importantes e são fundamentais para as mulheres poderem participar da sua vida profissional. 

Teve um dia que eu estava chegando em casa, eram umas 11 horas da noite. Eu parei para abastecer no posto de gasolina e estava saindo uma policial militar do banheiro do posto com o extrator de leite e a caixinha de leite. Eu fico vendo, é sobre isso. Ela vai voltar para o front, sei lá o que ela vai encontrar de noite ainda trabalhando na viatura, mas tem que parar num posto, num banheiro de posto de gasolina para extrair o leite para poder voltar a trabalhar. Essa é vida das mulheres trabalhadoras, essa é a nossa vida. 

Poder pensar como que a nossa atuação aqui, no espaço do Parlamento, pode ajudar com que mais mulheres possam ter mais autonomia sobre suas vidas. Mais autonomia não é só uma questão da valorização do salário, que é muito importante. Mas tem muito mais elementos que compõem a nossa autonomia cidadã na vida do que do que só a questão financeira. E elas são importantes de serem tratadas no ambiente que cria direitos. 


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Edição: Marcelo Ferreira