Rio Grande do Sul

Eleições 2022

"As pesquisas não buscam prever o resultado no dia da eleição, mas retratar o momento"

Vice-presidente do Conselho Regional de Estatística comenta o processo de realização de uma pesquisa e as suas variáveis

Brasil de Fato | Porto Alegre |
Eduardo Schindler é estatístico e vice-presidente do Conselho Regional de Estatística da 4ª Região (CONRE4) - Reprodução

O resultado do primeiro turno das eleições de 2022 trouxe à tona um debate sobre a credibilidade dos institutos de pesquisa, visto a diferença entre algumas apurações e os resultados de domingo (2).

No RS, por exemplo, praticamente todos os institutos publicaram pesquisas apontando Eduardo Leite (PSDB) na liderança das intenções de voto ao governo do estado. Ao mesmo tempo, indicavam que Olívio Dutra (PT) teria a preferência do eleitorado para o Senado.

Em ambos os casos, o cenário não se confirmou. A pesquisa que mais se aproximou de identificar um cenário que viria a se confirmar na apuração foi realizada pela Studio, publicada pelo Brasil de Fato RS.

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Nesse sentido, o questionamento sobre a eficiência e validade dos métodos utilizados foi levantado, de forma a, muitas vezes, tentar destruir a reputação dos institutos de pesquisa. 

Para ampliar o debate, o Brasil de Fato RS tem convidado diversos atores para comentar as pesquisas eleitorais. Nesse sentido, enviamos uma série de perguntas para Eduardo Schindler, estatístico e vice-presidente do Conselho Regional de Estatística da 4ª Região (CONRE4). Confira a entrevista.

Brasil de Fato RS - Um questionamento que costumeiramente surge com relação às pesquisas eleitorais é o tamanho da amostra, que aparentemente seriam muito pequenas. Pergunto se esse é um questionamento válido e como é possível que essas aferições apresentem resultados confiáveis.

Eduardo Schindler - A dúvida é sempre válida e bem-vinda para ser discutida dentro da metodologia. A teoria estatística se baseia em conceitos como o teorema central do limite, aleatoriedade e independência. Esse conjunto de conceitos permite controlar a expectativa e a magnitude do erro esperado.

Dessa forma, estudos amostrais têm como objetivo principal reduzir o custo que representaria um censo, e ainda assim obter estimativas satisfatórias dos resultados. Estudos repetidos ao longo do tempo são melhores em captar tendências, já que as pesquisas como são elaboradas não procuram "prever" resultados, e sim verificar a situação no momento em que foi realizada. Cabe ressaltar que nos estudos de comportamento humano, campanhas de marketing, estudos de economia e até áreas da saúde se baseiam amplamente em metodologias semelhantes.

BdF RS - Como o Conselho avalia a discrepância apresentada com relação à algumas candidaturas que obtiveram resultados maiores dos que eram indicados pelas pesquisas?

Schindler - O conselho ainda não tem uma posição oficial sobre o tema, mas variabilidade nos resultados é algo esperado e é da própria natureza do método. Se você parar para refletir, não é difícil concluir que o próprio processo eleitoral também tem variabilidades: Se o pleito fosse na semana seguinte, as abstenções e votos decididos na última hora seriam os mesmos?

Cada pesquisa representa um grande desafio em termos de cobertura territorial a ser feito em um tempo bastante curto. O profissional da estatística é capacitado para executar o planejamento desse estudo e interpretá-lo de maneira correta. Nós mantemos ações de fiscalização ativa em relação às empresas e profissionais registrados no conselho.

Quando necessário, as ações cabíveis são tomadas. Mas aquelas pesquisas executadas por profissionais e empresas não registrados, fogem ao nosso escopo.

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BdF RS - Quanto às teses de "voto envergonhado", de que muitos eleitores se recusam a responder pesquisas e que isso pode afetar o resultado: essa tese encontra respaldo científico?

Schindler - "Voto envergonhado" é um conceito que pertence mais à alçada da ciência política que da estatística. Entretanto, esse caso pode ser interpretado como um caso de viés amostral, isto é, um caso em que a amostra não representa necessariamente a população.

No que diz respeito à estatística no planejamento do estudo, cabe questionar a abstenção, pois de fato é uma categoria que existe, porém ela não está prevista na legislação. Nesse caso, seria ético levar esta opção em conta em um estudo?

BdF RS - É possível falar em distorções com relação a decisões de última de hora, abstenções ou migração de votos no dia da eleição?

Schindler - Sim, é possível especular, mas ainda não temos evidências conclusivas. Como já dito, as pesquisas não buscam prever o resultado no dia da eleição. Elas procuram retratar o momento em que foram realizadas. Se os eleitores se utilizam das pesquisas para definir seu voto, essa responsabilidade não pode ser atribuída ao método da pesquisa.

BdF RS - É possível dizer que essas eleições apresentaram novos desafios para os institutos de pesquisa? Como isso tem sido debatido entre os estatísticos?

Schindler - Todas as eleições representam um novo desafio e novos aprendizados. Gostaríamos de contar com mais profissionais e capacidade de realizar ações mais extensivas de fiscalização. Entretanto, somos poucos e voluntários no trabalho no conselho.

O ideal seria a cada pleito realizarmos um evento onde as aprendizagens fossem consolidadas e socializadas entre os profissionais. Todos teriam a ganhar com ações dessa natureza.


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Edição: Katia Marko