Rio Grande do Sul

Vida das Mulheres

Movimento de Mulheres Camponesas lança manifesto sobre violência contra a mulher e feminicídios

Manifesto expressa indignação com as mortes de companheiras e crescente onda de violência no país

Brasil de Fato | Porto Alegre |
O Movimento de Mulheres Camponesas (MMC) lançou um manifesto pelo basta à violência de gênero - Marcello Casal Jr/Agência Brasil

O Movimento de Mulheres Camponesas (MMC) lançou um manifesto em que repudia a violência de gênero no país cometida contra as mulheres. Em especial, o movimento chama atenção para o feminicídio, forma de violência específica voltada para "as mulheres em situação de desumanização, não consideradas em igualdade de direitos humanos e valor".

"A violência doméstica cresce em escalada alarmante no Brasil. Os dados de 2021, segundo estudo feito pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, registram que 1.319 mulheres foram vítimas de feminicídio, uma média de 25 mulheres por semana, quatro por dia. A cada sete horas uma mulher foi morta", alerta o manifesto.

Recorda ainda que esta forma de violência é movida pela desigualdade e discriminação das mulheres, sendo um fenômeno social que não pode ser minimizado ou invisibilizado. Segundo o texto, quando a violência de gênero não é discutida, ela se perdura e se aprofunda, por isso precisa ser reconhecida, combatida e enfrentada.


Documento chama a atenção para outro fator que aumenta a vulnerabilidade feminina que é a desigualdade social e a situação econômica das mulheres / Reprodução

Lar é o local mais inseguro para as mulheres

O manifesto aponta ainda o dado de que a grande maioria desses assassinatos são cometidos por companheiros ou ex-companheiros, namorados e maridos.

"Nos últimos dias, perdemos companheiras de movimentos da Via Campesina por feminicídio. A violência está muito perto de nós, em todos os lugares. Essa violência e esse extermínio têm cor e classe social, pois as pesquisas mostram que entre as vítimas 66,7% são mulheres negras, 70,5% com idades entre 18 e 44 anos".

Desigualdade social aumenta vulnerabilidade

Também chama a atenção para outro fator que aumenta a vulnerabilidade feminina neste contexto que é a desigualdade social e a situação econômica das mulheres. O preço dos alimentos, dos combustíveis e do transporte colaboram para o empobrecimento das mulheres as deixando mais vulneráveis, pois são as primeiras a sofrerem com o desemprego e a pobreza.

"Isso pode ser demonstrado claramente em estudos realizados pela Rede PENSSAN que indicam que a insegurança alimentar é mais grave nas famílias que dependem da renda da mãe. O estudo ainda aponta que as mulheres, mães, chefes de família, na maioria das vezes sustentam a casa com menos de meio salário mínimo per capita. Os dados apontam a fome sendo também uma política de violência de gênero, de raça e de classe", diz o texto.

Diante deste cenário, as mulheres camponesas organizadas no movimento reafirmam a luta cotidiana contra a violência de gênero, mas também contra o machismo, o patriarcado, o racismo e a LBTIfobia, estruturas que matam: "Convocamos a toda a sociedade para enfrentar essa brutal realidade, a se organizar, denunciar, a exigir do Estado brasileiro condições de vida digna para todas as mulheres".

Confira o manifesto na íntegra:

Manifesto das camponesas contra a violência e os feminicídios

Na sociedade que a gente quer, basta de violência contra a mulher!

Nós, mulheres do Brasil, organizadas no Movimento de Mulheres Camponesas (MMC), manifestamos o nosso repúdio, nossa dor, nossa indignação e também nossa luta constante contra todas as formas de violência doméstica cometida contra as mulheres.

Chamamos atenção aqui para o feminicídio, que possui como especificidade o fato de ser uma violência de gênero cometida contra as mulheres sempre em situação de desumanização, na qual as mulheres e meninas não são consideradas em igualdade de direitos humanos e valor.

Trata-se de um ato qualificado como hediondo na legislação brasileira, pois é movido pela desigualdade, pela inferiorização e discriminação das mulheres. Sendo um fenômeno social, a situação de violência contra as mulheres não pode ser minimizada ou invisibilizada, posto que perdura e se aprofunda constantemente quando não é reconhecida, combatida e enfrentada como tal.

A violência doméstica cresce em escalada alarmante no Brasil. Os dados de 2021, segundo estudo feito pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, registram que 1.319 mulheres foram vítimas de feminicídio, uma média de 25 mulheres por semana, quatro por dia. A cada sete horas uma mulher foi morta.

Esses dados revelam ainda (o que já sabemos), que 84% dos assassinatos são cometidos por companheiros ou ex-companheiros, namorados, maridos. Nos últimos dias, perdemos companheiras de movimentos da Via Campesina, por feminicídio. A violência está muito perto de nós, em todos os lugares. 

Essa violência e esse extermínio têm cor e classe social, pois as pesquisas mostram que entre as vítimas 66,7% são mulheres negras, 70,5% com idades entre 18 e 44 anos. A mulher é a principal vítima e os filhos e filhas sofrem as consequências, pois as políticas públicas de assistência, proteção e acolhimento são praticamente inexistentes.

O agravamento da natureza dessa violência, traz consequências muito profundas, em especial aos filhos/as, pela exposição de mais vulnerabilidade ainda, quando a mãe está morta, pai preso ou foragido e estas passam a viver de favor em casas de parentes ou em abrigos públicos, provocando danos à vida, ao futuro e à saúde emocional das crianças.

Dados mostram o quanto é cruel para tantas meninas e meninos pelo país, pois estima-se que somente em 2021, o feminicídio deixou 2.321 crianças e adolescentes órfãos e órfãs. E o estado não assume seu papel de garantir proteção e segurança.

A atual conjuntura de insegurança na vigilância e de garantias de aplicação de leis específicas é ainda mais precária ou inexistente com o atual governo genocida do Presidente Jair Bolsonaro. Todo o aparato jurídico e de apoio foi, nos últimos anos, sendo desmontado ou negligenciado pelo não investimento em políticas de proteção social e segurança.

Pelo contrário, o atual governo promove a cultura conservadora, machista, de ódio e de fundamentalismo religioso que oprime, violenta as mulheres indígenas, negras, pobres e das periferias do campo, das águas, das florestas e das cidades. O atual governo promove o armamento, promove ainda mais a cultura da violência e da dominação.

Os requintes de crueldades contra as mulheres, hoje se acentuam, quando se estimula o porte e uso de armas, quando se lhes atribui como tarefa o cuidado com filhos, idosos, doentes e dos lares, quando se dá ênfase à dominação de gênero, quando se prega cultos religiosos de controle e obediência, quando se tira das mulheres o poder de decisão sobre sua vida, seu corpo.

A situação econômica de nossas mulheres na atual conjuntura brasileira é outra questão crucial para o aumento das violências.

O preço altíssimo dos alimentos, do gás, do transporte: tudo colabora para que milhões de mulheres fiquem ainda mais reféns de uma dependência econômica, de violência patrimonial e do medo. Que não vejam saída para si e para seus filhos. E isso pode ser demonstrado claramente em estudos realizados pela Rede PENSSAN que indicam que a insegurança alimentar é mais grave nas famílias que dependem da renda da mãe.

O estudo ainda mostra que existe uma situação crítica no Norte e no Nordeste, com 45% e 38% da população em risco, e apontando que as mulheres, mães, chefes de família, na maioria das vezes sustentam a casa com menos de meio salário mínimo per capita. Os dados apontam a fome sendo também uma política de violência de gênero, de raça e de classe.

Diante dessa onda perversa de feminicídios e de violência, incentivada pelo atual governo, nós, camponesas, reafirmamos nosso manifesto de repúdio e nossa luta cotidiana contra todos os tipos de violência, contra o machismo, o patriarcado, o racismo e a LBTIfobia, que vêm matando todos os dias, nós mulheres em nossas diversidades de ser.

Denunciamos o patriarcado, o racismo, o capitalismo e o imperialismo, instrumentalizados por esse poder que nos violenta e mata todos os dias.

Convocamos a toda a sociedade para enfrentar essa brutal realidade, a se organizar, denunciar, a exigir do estado brasileiro condições de vida digna para todas as mulheres.

Reafirmamos nosso compromisso enquanto Movimento de Mulheres Camponesas (MMC Brasil), um movimento feminista, camponês e popular, de não nos calarmos diante de tanta perversidade! Nos comprometemos a continuar estimulando as mulheres para a organização, luta, promoção de espaços de formação e de denúncia contra todo tipo de violência, seja ela psicológica, moral, física, patrimonial.

Basta! Na sociedade que a gente quer, basta de violência contra a mulher!

Fortalecer a luta em defesa da vida. Todos os dias!

NOSSAS VIDAS IMPORTAM!

MMC Brasil


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Edição: Marcelo Ferreira