Rio Grande do Sul

Cinema Negro

Cineasta gaúcha é finalista do 21º Grande Prêmio do Cinema Brasileiro

Camila de Moraes concorre com Mãe Solo na categoria Melhor Curta-metragem de Documentário

Brasil de Fato | Porto Alegre |
Para celebrar a indicação, Camila de Moraes realizou na sua cidade natal, no dia 3 de agosto, uma sessão comentada na Cinemateca Capitólio - Foto: Katia Marko

A diretora de Mãe Solo, Camila de Moraes, estará representando o filme e toda a equipe no 21º Grande Prêmio do Cinema Brasileiro, na noite desta quarta-feira (10), na Cidade das Artes, no Rio de Janeiro. O curta-metragem gravado na Bahia é um dos finalista na categoria documentário, concorrendo ao Troféu Grande Otelo.

A cerimônia será apresentada por Camila Pitanga e Silvero Pereira e poderá ser assistida ao vivo através da Globoplay, no Youtube e no Canal Brasil, a partir das 20h.

Mulheres produtoras de cinema serão homenageadas na edição que marca o retorno ao formato presencial após a pandemia. Serão entregues 32 prêmios, em quatro grandes categorias: longa-metragem, curta-metragem e séries independentes brasileiras.


A entrega do 21º Grande Prêmio do Cinema Brasileiro, na noite desta quarta-feira (10), será na Cidade das Artes, no Rio de Janeiro / Divulgação

Em suas redes sociais, Camila saudou a indicação. “Há tempos estamos comemorando a nossa chegada até aqui, pois aprendemos a celebrar cada passo dado e tentar aproveitar ao máximo o processo.” Segundo ela, as conquistas são várias, “desde o momento de poder encontrar as mães Dona Lúcia e Keisianne para nos contar as suas histórias e também poder contar com a socióloga de renome Vilma Reis no filme. Em seguida montar uma equipe envolvida e disponível para este projeto. Após isto as diversas andanças pelo Brasil e mundo, além de exibição comentada em Porto Alegre com uma sala de cinema lotada”, citando a sessão na Cinemateca Capitólio na última semana.

Também agradece aos que abriram os caminhos para que ela hoje pudesse estar vibrando com cada passo dado e a chegada na final do Grande Prêmio do Cinema Brasileiro, e cita o ator negro gaúcho falecido no domingo (14), com quem um dia antes estava gravando a locução dos poemas para o Documentário sobre Oliveira Silveira. “Muito Obrigada Sirmar Antunes por me mostrar, enquanto gaúcha, que era e é possível seguir na carreira do audiovisual com as nossas convicções e talento.”

Para celebrar o feito, Camila realizou na sua cidade natal, no dia 3 de agosto, uma sessão comentada na Cinemateca Capitólio. Participaram do bate-papo a rapper Negra Jaque e a Doutora em Educação Maria Conceição Lopes Fontoura. Com casa lotada e um público bastante representativo das lideranças do Movimento Negro do estado, a diretora salientou que mais que uma exibição do filme, foi um ato político em defesa da representatividade e visibilidade do cinema negro.

Presente no evento, o Brasil de Fato RS entrevistou a cineasta. Confira.

Brasil de Fato RS - A exibição em Porto Alegre foi para celebrar a indicação no Grande Prêmio do Cinema Brasileiro...

Camila de Moraes - Sim, o filme está fazendo uma trajetória bem interessante. A gente está passando por alguns festivais. E a exibição de hoje (dia 3) é por conta que o filme chegou num patamar que ele está como finalista do Grande Prêmio do Cinema Brasileiro, o maior festival que a gente tem de cinema no país. E aí é para refletir que esse filme é fruto de um prêmio Conceição Sena, que vem dentro da Lei Aldir Blanc nesse período emergencial e o quanto que a gente pode fazer com poucos recursos. Para vermos o quanto que faltam políticas de incentivos para a nossa cultura. Olha onde a gente está chegando com esses recursos que ainda são escassos.

BdFRS - Como surgiu a ideia do filme Mãe Solo e por que foi gravado na Bahia?

Camila de Moraes - Mãe Solo surgiu como um curta-metragem. Eu fui convidada por uma produtora de Salvador para fazer a direção. Ele é um roteiro de Nani Sacramento e Danilo Israel. 

Para poder falar sobre essa realidade de mulheres negras de periferia, criando seus filhos sozinhas. E aí a gente traz no filme esses relatos. A gente pega duas mães de faixas etárias diferentes de Salvador, uma jovem entre 20 anos e outra com mais de 60 anos. Elas dão seus depoimentos de como foi a criação desses filhos. E os obstáculos que elas tiveram que passar e, mesmo assim, o amor que elas têm por esses filhos.  

Nossa equipe também foi formada por mães solos ou pessoas que foram criadas por mães solos

Que apesar de tudo isso, apesar do não apoio, seja dos pais, da família e da sociedade, ainda há um amor imenso em ter esses filhos e que elas dão tudo que elas têm, a própria vida para criação deles. 

A nossa equipe também foi formada por mães solos ou pessoas que foram criadas por mães solos. Estávamos ali trazendo vivências que a gente também experienciou. Por mais que apresente uma realidade baiana, a gente percebeu que isso é uma realidade brasileira, de uma certa parcela da nossa população. Então a gente consegue ampliar esse debate também aqui no Rio Grande do Sul.

BdFRS - Segundo um levantamento da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), do IBGE, de 2021, quase 100 mil mulheres moram sozinhas em Porto Alegre, é a capital onde mais mulheres moram sozinhas. Possivelmente muitas dessas mulheres são mães solo. 

Camila - É isso. Assim a gente aos poucos vai vendo esses dados. E agora, com a pandemia, a situação está cada vez mais desigual e essas famílias cada vez mais reduzidas. As mães tendo que dar conta de tudo e mais nesse processo pandêmico. Então eu acho que é um momento de a gente refletir mesmo que sociedade é essa e que sociedade é essa que está acolhendo? De que forma que ela acolhe essas mulheres. Porque essas mulheres são o sustento, são a base e elas têm que ser tudo. E como é que elas estão sobrevivendo? A gente pensar de que forma que a gente está conseguindo manter essas mulheres sãs nesse 2022 que a gente está vivendo ainda. 

BdFRS - Domingo é o Dia dos Pais. Data que se celebra os pais como “heróis”, mas se fala no pai que falta, no pai ausente. Como o teu filme pode fomentar esse debate?

Camila - No filme, a gente traz algumas discussões que fala sobre isso. Essas mães que além de ser mãe, também precisa assumir um outro papel de paternidade e que muitas vezes não vai dar conta desse papel. E que essa ausência por mais que essas mães estão se virando em dobro para poder assumir tudo isso, essa ausência paterna para os filhos vai fazer falta em algum momento, não é?

Temos um número imenso de mães solos no país, criando os seus filhos. É muito necessário que a gente possa começar a mudar isso

Então, é importante a gente dialogar sobre isso, porque não basta fazer o filho, tem que estar junto na criação. Temos um número imenso de mães solos no país, criando os seus filhos. É muito necessário que a gente possa começar a mudar isso. Os pais precisam cada vez mais contribuir de fato na criação dos filhos.  Eu acho que a gente está chegando no momento aonde as pessoas, espero, estejam compreendendo que o “ajudou em casa”, não é isso. Ele está fazendo a sua obrigação, não é? Não está “ajudando”, está fazendo a obrigação também. Não é só obrigação da mãe se levantar de madrugada, lembrar se o filho escovou os dentes, tomou banho, etc. 

BdFRS - Tu estás agora em Porto Alegre gravando um novo documentário sobre a vida de Oliveira Silveira? 

Camila - O filme "Oliveira Silveira - O Poeta da Consciência Negra" é uma proposta da Casa de Cultura Mario Quintana que nos convidou para fazer a direção junto com a filha do Oliveira, a Naiara Oliveira, e a professora Sátira Machado que é quem coordena o acervo do Oliveira Silveira atualmente. A gente montou uma equipe gaúcha para poder fazer a gravação desse filme.


Um dia antes de falecer, Sirmar estava gravando a locução dos poemas para o Documentário sobre Oliveira Silveira / Divulgação

A proposta é que seja um curta-metragem. Passamos três dias fazendo gravações aqui pelo Centro, procurando um percurso negro onde o Oliveira Silveira circulava e conversando com pessoas que conviveram com ele. 

Vamos falar da obra poética de Oliveira Silveira. A gente sabe que nenhum filme vai dar conta da magnitude dos trabalhos dele. Então estamos fazendo um recorte e tentando instigar para que mais pessoas conheçam essa personalidade gaúcha que temos muito orgulho. Queremos que mais pessoas possam conhecer o tanto da importância que ele teve não só para nós, gaúchos, mas para a sociedade brasileira.

Oliveira inicia em 1970 uma pesquisa para achar uma data significativa para a comunidade negra. Então, encontra-se o 20 de novembro, fruto dessa pesquisa iniciada por ele e depois com o grupo Palmares. A partir de 1978, o MNU (Movimento Negro Unificado) adota como o Dia Nacional da Consciência Negra. Então, a gente tem muita vontade de disseminar também essas informações e toda essa trajetória que o Oliveira Silveira construiu em vida. E continua construindo, pois deixou um legado gigantesco para nós enquanto população brasileira.

O filme vai ser lançado no dia 20 de novembro deste ano. Estamos na corrida agora para fazer a pós-produção. E esperar que todo mundo possa assistir e que a gente possa continuar fazendo do audiovisual um espaço político para refletirmos nossa realidade. 

BdFRS - Teremos o Festival de Cinema Negro em ação esse ano? 

Camila - Vamos ter o Festival de Cinema Negro em Ação. O documentário será a abertura do festival que acontece de 20 a 27 de novembro. E a gente está vendo algumas séries já e vamos fazer uma oficina de Cinema Negro em Ação, trazendo pessoas para dialogar sobre o audiovisual negro, num pré-aquecimento para mais uma edição do festival. 


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Edição: Marcelo Ferreira