A abertura da 28ª edição da Feira Internacional de Cooperativismo e Economia Solidária (Feicoop), em Santa Maria (RS) teve dois tons distintos a partir das manifestações de autoridades e artistas na última sexta-feira (15).
O primeiro aspecto é o reconhecimento da importância da Economia Solidária como alternativa de desenvolvimento para a sociedade a partir de uma perspectiva inclusiva, contrapondo o modelo capitalista exploratório e excludente que se mostra hegemônico neste período da história e agravou as desigualdades sociais no Brasil a partir dos eventos associados à pandemia da covid-19.
O segundo aspecto é pontual e faz justiça à Lourdes Dill, religiosa que por mais de 30 anos dedicou-se à causa da Economia Solidária e apesar de ter angariado reconhecimento em nível nacional e internacional, acabou sendo desligada dos projetos sociais que ajudava a empreender na cidade e região, sendo transferida ao estado do Maranhão.
Cultura e resistência
Antonio Gringo e Regina Wirtti – artistas que desde a primeira Feicoop sempre estiveram presentes nas atividades do evento – enviaram um vídeo com sua manifestação, chamando os presentes (e também os ausentes) a esperançar e resistir. Nos versos da canção “Ordem e Progresso”, mais uma vez cantaram a necessidade de caminhar de forma organizada e que o povo retome para si a bandeira verde e amarela: “Este é o nosso país, esta é a nossa bandeira, é por amor a essa pátria Brasil que a gente segue em fileira”.
A dupla Gisele e Maninho cantaram a canção “Corrente da Vida”, composta em 2020, em homenagem a Irmã Lourdes e que evoca na letra muitas das bandeiras defendidas pela ativista. Acompanhados por dezenas de vozes e acenos cantaram “É a força do coletivo em transformação, onde se encontra motivo de darmos as mãos: sempre na luta eu vou, sempre da luta eu sou para crescer”.
O Levante Popular da Juventude também fez a sua manifestação em forma de arte, com a participação de três jovens que subiram ao palco com suas vozes fortes e o compasso demarcado de um tambor para pedir “trabalho e vida digna para todos e uma economia do povo e para o povo, construída pela gente”. A intervenção clamou por trabalho, renda e políticas de inclusão para que de fato se alcance a sociedade do bem viver. “Mudança não é fácil, mas isso significa jamais parar, isso significa lutar!”.
Do meio de centenas de experimentos e empreendimentos solidários, as vozes da militante camponesa Rosiele Ludke e da saboeira artesanal Paola Mattos se ergueram para ler um manifesto em defesa da Economia Solidária e reafirmar a importância do Feicoop como uma feira de resistência, bem como do exemplo educador de irmã Lourdes que deixou gravado nas mentes e corações de todas e todos a verdade “de uma experiência aprendente e ensinante”. Arrematando a fala, cantaram a canção “Levando em Frente”, expressando um chamado aos presentes para com amor e coragem seguir adiante com os sonhos e utopias que surgem sob o abrigo daquele evento e de todos os projetos que se expressam ali.
Irmã Lourdes, presente!
No palco, apesar da mostra fotográfica montada por Dartanhan Baldez, cujas imagens registraram em distintos momentos o rosto sempre cheio de esperança e coragem de Irmã Lourdes, sua ausência gerava um incômodo persistente. Impedida pela distância – e talvez também pela intolerância daqueles e daquelas que detém consigo o momentâneo poder de mando – sua participação se deu através de vídeo gravado a partir de Barra do Corda, no Maranhão.
Como sempre fez nas 27 edições anteriores, dedicou suas palavras a reafirmar a necessidade da construção de um novo modelo econômico na cidade de Santa Maria, no estado do RS, no Brasil, na América Latina e no mundo. A proposta do Papa Francisco – a Economia de Francisco e Clara – pautou seu pronunciamento, “para que o mundo possa conhecer, interagir e construir novas formas de economia”. Com humildade agradeceu a todos que de uma forma ou outra ajudaram a construir a Feicoop e o projeto Esperança/Cooesperança, deixando também um desafio de continuidade e resistência para os próximos dois anos, quando a Feicoop deverá alcançar a trigésima edição.
Autoridades abraçam feira e relembram Irmã Lourdes
A reitora do Instituto Federal Farroupilha, Nídia Heringer, exaltou os 28 anos do evento, afirmando que “a Feicoop tem o dom de articular diferentes pessoas, que se aproximam pelos mesmo motivos”. Do mesmo modo o reitor da Universidade Federal de Santa Maria, Luciano Schuch, ao reconhecer a Feicoop como fruto mais simbólico do trabalho de Irmã Lourdes, afirmou que ”é através da educação que conseguimos emancipar o cidadão”.
José Carlos Peranconi, atual coordenador do Projeto Esperança/Cooesperança, afirmou que ainda que distante fisicamente, Irmã Lourdes continuou atuando de forma intensa para articular a realização da 28ª edição da Feicoop, que naquele momento se reafirmava como um um braço do Fórum Social Mundial, mantendo seu propósito alinhado com a inclusão social em suas diversas dimensões, “inclusiva, fraterna, amorosa e participativa”. Também foi lembrado pelo coordenador o enfoque junto “aos povos indígenas, quilombolas, afrodescendentes, assentamentos da reforma agrária, catadores de materiais recicláveis, público das hortas e cozinhas comunitárias, e apoio aos grupos que trabalham com moradores em situação de rua para uma melhora da segurança alimentar".
Melissa Ferré, da Cáritas Brasileira, também destacou o aspecto de resistência que a Feicoop representa e, em especial, nesta edição: “Acreditamos que a Economia Solidária é uma outra forma de alcançar a sociedade do bem viver”. Já o gerente regional da Emater, Guilherme Passamani, enalteceu o trabalho dos agricultores e agricultoras que dedicam seu tempo à produção de comida para o sustento do povo e frisou que “a diversidade é uma marca da Feicoop, seja através dos alimentos, das pessoas ou das ideias”.
Prefeitura e Câmara de Vereadores
“A gente enxerga a Irmã Lourdes aqui, em todos os espaços, a saudade é muito grande, e até mesmo por isso nos sentimos chamados a resistir e continuar trabalhando para que as sementes plantadas possam continuar crescendo e dando frutos”, afirmou o presidente da Câmara de Vereadores de Santa maria, Valdir Oliveira (PT). "Aqui é o resultado de um grande trabalho coletivo, organizado, de pessoas que se unem para levar adiante a nossa Economia Solidária", disse.
Também citando a forma intensa com que Irmã Lourdes sempre o desafiou a participar da Feicoop, o prefeito Jorge Pozzobon (PSDB) prometeu que o Poder Executivo seguirá atuando junto com a Feicoop. "A Prefeitura não mediu esforços para fazer tudo o que tinha que fazer. E mais ainda, está garantido, compromisso pessoal meu, que enquanto eu for prefeito dessa cidade, tudo que essa feira precisar, ela vai ter. E não importa as dificuldades que nós vamos ter que superar", disse Pozzobom.
Sábado (16) e Domingo (17) tem Feicoop!
A feira segue neste final de semana com seminários, palestras, oficinas, atividades culturais e o comércio de produtos da Agricultura Familiar e Economia Solidária.
Horários de comercialização da 28ª Feicoop: Sábado (16) - 7h30min às 19h / Domingo (17) - 7h30min às 18h.
Confira a programação completa: CLIQUE AQUI!
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Edição: Katia Marko