Rio Grande do Sul

RESPEITO

No mês de orgulho LGBTQI+, Porto Alegre celebra a diversidade 

Após dois anos, Parada Livre volta à Redenção com o tema “Contra o ódio, luta! Essa bandeira é de todes"

Brasil de Fato | Porto Alegre |
De acordo com os organizadores, a Parada deste ano teve participação de cerca de 100 mil pessoas - Foto: Fabiana Reinholz

O parque da Redenção, em Porto Alegre, foi palco, neste domingo (12) de Dia dos Namorados, da 25ª Parada Livre. Em todo o trajeto central do parque, diversas bandeiras do arco-íris davam o tom e as cores da festa que teve início pouco após o meio dia, com o Bloco do Beijo, seguida de apresentações culturais e falas institucionais e de convidados. A tradicional marcha ao redor do parque, com seis trios elétricos, aconteceu por volta das 17h.

Com o tema “Contra o ódio, luta! Essa bandeira é de todes”, o evento teve manifestações políticas sobre a importância de ser resistência e contra o governo Bolsonaro. De acordo com os organizadores, a parada deste ano teve participação de cerca de 100 mil pessoas 

“Esse momento está sendo muito importante para celebrar as diversidades, o amor por nossos filhos, com o sol abrilhantando esse momento. Muito carinho, muito amor, o amor sobre todas as formas. É uma alegria enorme estar de volta aqui”, afirmou Hulda Maria Lopes Soares, da Ong Mães pela Diversidade, uma das entidades organizadoras da Parada Livre.  

Além do Mães pela Diversidade, o evento foi organizado pelos coletivos Nuances, Igualdade, SOMOS, Outra Visão, G8 – SAJU/UFRGS, Juntos LGBT, Escoteiros do RS, Homens Trans em Ação, Bloco da Diversidade, Coletivo Amora, NUDS - Núcleo de Diversidade do Sintrajufe/RS, Instituto Teia – Direitos Humanos, Transenem, Rede Lés-Bi, Rede Nacional de Pessoas Vivendo com HIV/Aids – RS e Homens Negros Trans e Transmasculines em Diáspora.

Para Isidoro de Souza Rezes, integrante da Ong Outra Visão, este ano é bastante simbólico. “Desde 1997 estamos na rua reivindicando direitos, inserção e cidadania para a população LGBTQI+. E este ano depois de dois anos, por conta da pandemia, foi maravilhoso”, disse.

O evento teve como apresentadoras Cassandra Calabouço, Charlene Voltuntaire, Suzzy B e Valéria Barcellos, que executou o hino nacional. Parte do financiamento deste ano vem do Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) firmado entre o Ministério Público do Rio Grande do Sul (MPRS) e o banco Santander, pelo fechamento da exposição “Queermuseu: cartografias da diferença”, em setembro de 2017 e também  apoio e financiamento da Prefeitura de Porto Alegre. 


Com o tema “Contra o ódio, luta! Essa bandeira é de todes”, houve manifestações políticas contra o governo Bolsonaro / Foto: Fabiana Reinholz

Contra o fascismo, a luta 

Além da visibilidade e do clima de celebração, a Parada também teve espaço para falas que destacaram a luta e a resistência necessárias no atual momento. Conforme destacou o militante do Grupo Nuances, Célio Golin, a edição deste ano trouxe duas questões importantes para se pensar: a pandemia e o cenário político do país. 

“A pauta LGBTQI+ vem sendo atacada de forma constante por esse governo e alguns setores reacionários da sociedade brasileira. Então ela tem um significado político muito importante nesse momento que estamos vivendo no Brasil. É um momento histórico em que temos que romper com esse governo fascista que esta aí. E a Parada com certeza vai ser também um dos impulsionadores para que a gente chegue nessa vitória, ela faz parte deste processo”, ressaltou. 

Célio também lembrou que a ação que resultou na condenação do banco foi ajuizada pelo Nuances. “Nós representamos no Ministério Público Federal para que o Santander reabrisse a exposição. Na negativa do Santander, o MPF estabeleceu uma multa e foi aberto um edital para a sociedade civil. Essa parada é fruto desse edital. Ou seja, nós transformamos aquele crime, aquela atitude conservadora, em um espaço de luta”, expôs.

Sobre a realidade da população LGBTQI+

13 anos o Brasil é o país que mais mata pessoas trans no mundo. Conforme o relatório de 2021 da Transgender Europe (TGEU), que monitora dados globalmente levantados por instituições trans e LGBTQIA+, 70% de todos os assassinatos registrados aconteceram na América do Sul e Central. E mesmo dois anos após a decisão do STF que criminalizou a LGBTIfobia, a realidade segue dramática.

“A gente vê o que está acontecendo no Brasil, discursos de ódio, preconceito, tentativas da naturalização da violência. Isso é uma coisa que nos atinge fortemente, então estamos usando a Parada para dar uma resposta de que vamos continuar lutando para romper com isso”, afirmou Célio. 

Integrante do Conselho Estadual LGBT/Somos, Caio Klein, sobre a realidade da população LGBTQI+ no estado, pontuou que a desigualdade é uma questão que merece aprofundamento. “As parcelas que já eram vulneráveis, a população LGBT, principalmente as mulheres trans, onde a maioria está na prostituição, passaram por um aprofundamento da pobreza, da falta de acesso a serviços. Se por um lado alguns serviços avançaram, a assistência social não tem mais alcançado essas pessoas”, expôs. 

Por isso, destacou Caio, a Parada é relevante para mostrar que “a gente existe, para que a sociedade veja e lembre as nossas pautas, mas nesse ano, principalmente, para a gente se colocar enquanto movimento, que para além de falar sobre sexualidade, direitos humanos, falar de liberdade democrática em um ano tão decisivo quanto esse”, afirmou. 

Para a integrante o Gapa RS, Carla Almeida, a realização das Paradas sempre significam momentos simbólicos não só para dar visibilidade à pauta de direitos, mas principalmente para celebrar. “É uma delícia, depois de dois anos, poder voltar para rua, poder voltar marcar esse mês que é tão importante. A Parada Livre de Porto Alegre tem uma singularidade, é uma parada que o nome já diz, livre, super democrática e uma parada que reafirma direitos, mas que também possibilita que as pessoas expressem a sua sexualidade, seu amor nas mais diversas formas.”


Vereadora de São Borja Lins Robalo (PT) e vereadora de Porto Alegre Daiana Santos (PCdoB) participaram do evento / Foto: Cristiane Leite

Diversidade na política

O evento contou também com representantes do parlamento gaúcho. Subiram ao palco as deputadas federais Maria do Rosário (PT) e Fernanda Melchionna (PSOL), assim como as deputadas estaduais Luciana Genro (PSOL), e Sofia Cavedon (PT), que em suas falas ressaltaram o momento crucial na história do país. Destacaram a importância da luta e da resistência e a derrubada do governo Bolsonaro e do bolsonarismo, antes e após as eleições, e também frisaram a importância da construção de uma união consistente. 

Para vereadora de São Borja, uma das das três vereadoras trans eleitas no estado, Lins Robalo (PT), que participou do evento, a Parada é um momento para mostrar para a sociedade "que estamos aqui e que vamos ocupar esses territórios". "Para além de todos os estigmas e das violências que a gente sofre, a gente precisa não ter medo de ocupar esses espaços livres porque eles são de toda população e nós somos parte desta sociedade”, frisou. 

Ela também destacou a sua atuação na cidade de São Borja, cidade fortemente marcada pelo agronegócio. “A gente faz posicionamentos contrários a toda política perversa do agronegócio, do uso de agrotóxico. E sendo da pauta LGBTQI+, negra, mulher, travesti, nós somos o único mandato comprometido em trazer essas pautas, descortinar pautas historicamente silenciadas dentro do espaço político”, destacou, pontuando que nesse mais de um ano de mandato ele tem sido desafiador e coletivo "desde as dores até os acolhimentos". 

"Este evento é necessário, dentro do contexto político em que a gente tem o ódio como a pauta principal. Temos visto um presidente que legitima toda violência contra os povos LGBTQIA+, a partir do momento que ele fala que prefere um filho morto do que um filho gay", destacou a vereadora porto-alegrense, Daiana Santos (PCdoB), primeira mulher lésbica/LGBT a assumir uma cadeira na Câmara de Cereadores da Capital. "Isso demonstra muito do que é o pais, um [lugar] dos mais perigosos para a população LGBTQIA+, um lugar que mata os corpos, que elimina e retira da sociabilidade, pelo fato de viverem a diversidade”, complementou.

Sobre o primeiro ano de mandato, destacou que as pautas defendidas são interseccionadas e tem como finalidade a construção para o povo. “São pautas voltadas para o nosso povo, que sente na pele, cotidianamente, que toda a estrutura que é racista, misógina, LGBTfóbica e condiciona ao espaço de poder e decisão, como parte desta relação social, a eliminação de quem nós somos, o alinhamento político nas três esferas. Evidenciar a diversidade da população é, sim, garantir as vidas. Nós estamos aqui para fazer a defesa da vida, da dignidade deste povo que sempre esteve na luta. Que compreendeu, desde muito cedo, que somente a luta muda a vida”, ressaltou. 


Para Hulda Maria, da Ong Mães pela Diversidade, a Parada é "muito importante para celebrar as diversidades" / Foto: Fabiana Reinholz

Novidades

Este ano, estreou a Rua dos Direitos, espaço em que organizações sociais e instituições públicas apresentaram seus projetos e ações para a comunidade. Entre eles está o da Defensoria Pública do Estado (DPE), que prestou esclarecimentos à população sobre como fazer a alteração de registro civil. Em 2017, o Supremo Tribunal Federal (STF) proferiu a decisão de adequação do prenome e do gênero no Registro de Nascimento de forma administrativa, ou seja, sem a necessidade de ação judicial.

Conforme explicou a defensora pública e dirigente do Núcleo de Defesa da Diversidade Sexual e de Gênero, Aline Palermo Guimarães, a presença do DPE na Parada teve dois aspectos: manifestar apoio a causa LGBTQI+ e prestar serviço de orientação e encaminhamento para retificação de registros civis de pessoas trans, binárias e não binárias. 

Mesmo com o direito jurídico assegurado de alteração do registro civil, a vulnerabilidade social e econômica da população LGBTQI+ tem impedido o pleno acesso a esse direito.

Segundo a defensora, no tema LGBT, a pauta que mais demanda da defensoria é a retificação de registro civis. “Ainda que possam ser feitos de forma extrajudicial, sem necessidade de ajuizar, ainda demanda muito da nossa orientação, do nosso auxílio e também do nosso poder de requisição das certidões que possuem algum custo para as pessoas hipossuficientes, nós podemos garantir a gratuidade. A população LGBT, de forma geral, também aciona muito os serviços da Defensoria e para nós é muito importante fazer parte de um evento como esse”, concluiu.

Durante as apresentações culturais houve distribuição de camisinhas. A Parada Livre de Porto Alegre acontece na capital gaúcha desde 1997. 


Foto: Fabiana Reinholz


Ato aconteceu no dia dos namorados / Foto: Fabiana Reinholz


 Foto: Fabiana Reinholz


Parada teve participação de pessoas de todas as idades / Foto: Fabiana Reinholz


 Foto: Fabiana Reinholz


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Edição: Marcelo Ferreira