Rio Grande do Sul

Pandemia no RS

Audiência debate a situação das sequelas das vítimas da covid no Rio Grande do Sul

Primeiro dos sete debates regionais da Frente Parlamentar em Defesa das Vítimas da Covid aconteceu nesta segunda (30)

Brasil de Fato | Porto Alegre |
"A maioria dessas pessoas não conta com qualquer tipo de assistências”, expôs o presidente do CES, Cláudio Augustin - Foto: Paulo Garcia – Assembleia Legislativa do RS

Com depoimentos de sobreviventes da covid-19, a Frente Parlamentar Defesa das Vítimas da Covid da Assembleia Legislativa do RS realizou, nesta segunda-feira (30), a primeira de sete audiências públicas. Os encontros tem o intuito de debater as sequelas das vítimas da covid-19 e dar visibilidade à questão.

No encontro desta segunda, os participantes defenderam a necessidade de mais investimentos do estado no Sistema Único de Saúde (SUS) para garantir atendimento eficaz às vítimas. Na audiência, que também aconteceu sob forma virtual, estiveram presentes mais de 40 entidades representativas e instituições. 

O deputado estadual Pepe Vargas (PT), que preside a Frente, abriu a audiência destacando a relevância de escutar a população e fazer um mapeamento do impacto da pandemia na vida da população e nos sistemas de saúde e de proteção social das diversas regiões, tendo como foco o atendimento do SUS às vítimas e seus familiares.

“Precisamos dar visibilidade às vítimas diretas e indiretas da pandemia e cobrar soluções efetivas do Poder Público para as pessoas que apresentam danos crônicos e permanentes. Além disso, temos que  ampliar o olhar para os impactos econômicos e sociais na vida dessas famílias e nas próprias políticas públicas”, ressaltou o deputado.

:: "Há uma enorme invisibilidade do tema covid e das pessoas com sequelas”, afirma Renato Simões ::

Pepe frisou que existem demandas relacionadas à atenção à saúde da população que apresenta danos crônicos, permanentes ou temporários, causados pela doença, que implicam em novos arranjos assistenciais. Salientou que se soma a este cenário o aumento das “filas” por consultas especializadas, exames diagnósticos, procedimentos ambulatoriais e cirurgias eletivas – represados durante os períodos de restrição dos serviços de saúde.

“É preciso dimensionar, construir estratégias urgentes para alterar esse cenário de invisibilidade, desatendimento e sofrimento”, completou. O deputado lembrou ainda que os impactos da pandemia também são econômicos e a Frente Parlamentar também tem como propósito avaliar esses impactos.

Governo ignorou sugestões das entidades representativas

Vítima das sequelas da covid, o presidente do Conselho Estadual de Saúde (CES), Cláudio Augustin, passou nove meses no hospital entre a vida e a morte. Foi internado com uma pneumonia bacteriana no dia 1º de dezembro de 2020 e, ao pegar covid no ambiente hospitalar, sua vida mudou profundamente. Desde agosto, está em casa, mas ainda na cama. Em sua intervenção, ele acusou o governo do estado de conduzir o setor da saúde “como se nada estivesse acontecendo”.

Cláudio destacou que estudos de várias instituições nacionais e internacionais apontam que 70% das pessoas infectadas pelo coronavírus apresentam alguma sequela e 20% apresentam sequelas graves.

“Ocorre que de 30% a 50% dos recuperados apresentam sequelas. Se tivemos dois milhões de infectados no Rio Grande do Sul, cerca de 700 mil apresentam danos. A maioria dessas pessoas não conta com qualquer tipo de assistência”, denunciou o presidente. Cláudio frisou que o governo estadual ignorou sugestões feitas pelos Conselhos na adoção de medidas de prevenção, de atendimento à saúde e instituição de protocolos.

A proporção de sequelados foi corroborada pela representante do Ministério Público Federal, Ana Paula Carvalho de Medeiros. Ela citou estudo da Fiocruz que aponta um percentual de 50% de sobreviventes com sequelas por mais de um ano e uma lista com 23 sintomas que perduram mesmo após os pacientes serem considerados livres da infecção. 

A defensora pública da Defensoria Pública Estadual, Liliane Paz Deble, também criticou o estado por deixar de atender sugestões de protocolos e demandas repassadas por entidades representativas, como a falta de leitos. “Quando o cidadão bate na porta da defensoria é porque tudo se agravou e, portanto, que dos nossos trabalhos surjam soluções.”

Entidades criticam falta de assistência e orientação nacional 

Em sua manifestação, a médica Rosângela Dorneles, que é uma das coordenadoras da Associação Vida e Justiça, entidade que atua na busca de reparação para vítimas da pandemia, ressaltou a falta de orientação nacional no enfrentamento da pandemia, que, conforme frisou, ainda não acabou. Criticou a ausência de medidas sanitárias para proteger a população. E alertou também para o “momento extremamente grave” no Rio Grande do Sul com a chegada do inverno e a lotação das UTIs, especialmente, as pediátricas.

“O sistema está fragilizado e fragmentado. Faltam medicações, os trabalhadores estão exaustos e adoecidos e as filas não param de crescer. Estamos em um momento grave na saúde do estado, temos ainda ausência de insumos e a dificuldade é grande para atender. Precisamos de medidas sanitárias firmes para proteger a vida da população, manter a recomendação do uso de máscara e garantir a vacinação de 95% da nossa população”, ressaltou a médica. 

Por sua vez a fundadora e presidente da Associação de Vítimas e Familiares de Vítimas da Covid-19 (Avico Brasil), Paola Falceta, chamou atenção para falta de assistência adequada para órfãos e enlutados. Ela criticou o abandono desse segmento por parte do Poder Público e sustentou que, mesmo depois da “tragédia que foi a pandemia", o Estado continua sem fazer “ações de prevenção e promoção da saúde, que poderiam ter salvado milhares de vidas”.

Também criticou a falta de promoção e prevenção em saúde pelo Estado, o que é um dos princípios do SUS. “Se o Executivo fizesse promoção e prevenção da saúde, com um protocolo nacional, muito dessas mortes não teriam acontecido, O Rio Grande do Sul é exemplo de abandono, precarização e ineficiente em saúde”, afirmou.

A representante da Fiocruz Maria Juliana Moura Correa afirmou que, nos próximos dias, a fundação lançará um informe sobre a Covid Longa para ajudar na identificação de alterações e na orientação de tratamentos e reabilitação. 

De acordo com a pesquisadora a falta de orientações e a necessidade de construção de uma linha de cuidado e de identificação para o tratamento da população que vive com a covid-19 prolongada é uma necessidade urgente. "É preciso incluir a reabilitação física e funcional", pontuou. 

Ela também lembrou dos inúmeros trabalhadores na linha de frente, considerados essenciais e que se expuseram sem vacina. “Essas pessoas ficaram sequeladas e há quem não conseguiu retornar ao trabalho”, frisa Maria Juliana.

A procuradora da República, Ana Paula Carvalho de Medeiros, apontou o estudo da Fiocruz que informa que metade da população infectada pela covid-19 apresenta sequelas, com duração de, no mínimo, um ano. No entanto, segundo ela, não existe um protocolo nacional de monitoramento e de avaliação desses casos.

 

Garantir recursos do SUS para atendimento da população

O presidente do Conselho Nacional de Saúde, Fernando Zasso Pigatto, enfatizou que é preciso insistir com o Congresso Nacional no debate com o Ministério da Saúde, sobre a necessidade de garantir recursos ao SUS para o atendimento da população, pois a pandemia não terminou.

A enfermeira Inara Ruas, integrante do Conselho Estadual de Saúde e diretora do Sindicato dos Enfermeiros do Rio Grande do Sul, salientou que, por lei, o governo do estado deveria investir 12% em saúde pública, porém, conforme ela, isso não acontece.

Inara lembrou o quanto a Emenda Constitucional 95 tem sido prejudicial à saúde e que, diante disso, existe a necessidade urgente de sua revogação para existir investimentos. Ela também falou sobre a necessidade de identificação do número de vítimas que sofrem com as sequelas da covid-19, bem como das patologias vividas por essas pessoas.

A Frente Parlamentar também ouviu vítimas da covid-19, que sofrem com as sequelas da doença. Elas relataram o sofrimento vivenciado durante o período de internação e as dificuldades enfrentadas em conviver com as sequelas e na busca de serviços especializados.

Ewelin Canizares, do Movimento Inclusivas, contou que foi internada, teve embolia pulmonar e hoje sofre com perda de memória, fadiga, além de problemas respiratórios. Ela ressaltou que em nenhum momento, durante a pandemia, houve um olhar para as pessoas com deficiência, que, em geral, sofrem com um número maior de comorbidades.

O encontro foi uma promoção conjunta entre o Fórum Democrático de Desenvolvimento Regional, por meio do Grupo Executivo de Acompanhamento de Debates (Gead) da Saúde, Educação, Cultura e Envelhecimento Ativo e Saudável, e a Frente Parlamentar em Defesa das Vítimas da Covid-19.

A Frente Parlamentar buscará o apoio da Comissão de Saúde e Meio Ambiente da Assembleia Legislativa para a Resolução nº 013/2022, do Conselho Nacional de Saúde, que prevê a adoção pelo Ministério da Saúde de uma linha especial de cuidados para as vítimas da covid-19. Também deverá costurar, entre os deputados estaduais, recursos orçamentários específicos para financiar o tratamento dos pacientes com sequelas.

*Com informações de Silvana Gonçalves e Olga Arnt – Assembleia Legislativa do RS


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Edição: Marcelo Ferreira