De caricatura de filhote da ditadura, Bolsonaro transformou-se em líder político do neofascismo
Após 3 anos de governo desastroso surpreende a muitos os índices de intenção de voto que Jair Bolsonaro atinge nas pesquisas de opinião sobre as eleições presidenciais de 2022. Mas não deveriam surpreender.
Os índices de intenção de voto de Bolsonaro residualmente estão assentados no desempenho de seu governo. Certas pesquisas apontam um pequeno crescimento da aprovação de seu governo. Segundo o Poderdata publicado neste sábado, dia 30 de abril, a aprovação ao governo subiu dois pontos percentuais em relação ao levantamento anterior. Contudo a rejeição ainda é uma das mais altas entre as medições feitas durante os últimos governos. Segunda essa pesquisa a desaprovação ao governo Bolsonaro atinge 54% da população brasileira.
Podemos levantar como razões, ou ao menos como hipóteses, para essa aprovação minoritária - porém relevante - a diminuição do impacto negativo gerada pela pandemia da covid-19, o aumento de cobertura do Auxílio Brasil e o acordo com os deputados do “Centrão” que ampliou pelo país a base de defensores do governo.
Esta tentativa de explicação é aceitável. Contudo, ela seria bem mais plausível se os índices de aprovação do governo tivessem, ao menos, ultrapassado os 50% dos entrevistados. Não é o caso. Não há nenhuma pesquisa que indique que a aprovação do governo tenha chegado perto sequer dos 40% da população.
A persistência da rejeição majoritária ao Bolsonaro em todas as pesquisas de opinião dos últimos dois anos aponta que os índices intenção de votos em Bolsonaro, que se situam entre os nada desprezíveis 28 e 34% dos entrevistados, estão assentados mais sobre a identificação com os conteúdos e significados políticos, morais, religiosos e ideológicos de parte da população do que em sua capacidade de governo. É sua ofensividade ideológica reacionária que lhe confere base importante entre frações da burguesia, da pequena burguesia e, inclusive e principalmente, entre frações dos trabalhadores.
E este é o fato preocupante destas eleições. Bolsonaro não é um “raio em céu limpo”, um acidente ou uma ‘excrecência’ da política brasileira. Bolsonaro expressa a transformação do conservadorismo e autoritarismo de diferentes setores sociais em política de extrema direita. Ele é a expressão da rejeição ao próprio processo civilizatório que, entre marchas e contramarchas, amplia o sentido da igualdade e dos direitos humanos fundamentais para a maioria da população. Bolsonaro é o programa de reação à igualdade como princípio de vida.
O que pode espantar a alguns é que após décadas de experimentação da democracia liberal os resquícios do passado tenham tamanha capacidade de aglutinação social. De caricatura de filhote da ditadura, Bolsonaro transformou-se em líder político do neofascismo no Brasil. Reúne-se em torno da candidatura de Bolsonaro um campo político de defesa da ditadura, anticomunista, que até então estava acantonado e recuado por um período de hegemonia democrática da política brasileira. Bolsonaro é o neofascismo que saiu do armário com a crise econômica e com a operação golpista da direita brasileira.
Jair Bolsonaro é um perigo para o processo civilizatório porque um segundo governo de extrema direita no país fatalmente o levará a uma situação autoritária sem freios. Com ampliação da perseguição e destruição das organizações democráticas, destruição das capacidades de controle sobre o governo, destruição da infraestrutura econômica. Tal risco, desgraçadamente, é iminente porque está baseado em um forte e nada desprezível campo político, hoje com unidade, apoio internacional e meios para crescer e afrontar a democracia, a Constituição e os direitos.
A subestimação do que significa a extrema direita no país hoje é um erro que pode levar a uma derrota, ou nas eleições – o que ainda parece menos provável na conjuntura – ou após as eleições. Não se pode tratar com desídia uma extrema direita mobilizada politicamente, com bancada parlamentar, unificada em um programa reacionário e disposta a tudo, inclusive a romper a lei e a Constituição, para derrotar a esquerda e os trabalhadores.
A unidade entre partidos de esquerda e partidos democráticos, neste fim de semana fortalecida com a decisiva incorporação do PSOL a essa frente eleitoral antifascista em torno da candidatura de Lula à presidência, é uma imposição dos tempos. Uma imposição em especial para o que consideram que, ainda que a democracia tenha sido insuficiente para garantir profundas transformações sociais, sua eliminação torna o objetivo da igualdade mais distante e difícil ainda. A derrota eleitoral do neofascismo não será suficiente para que esse movimento retroceda à insignificância, mas é necessária para que possamos modificar as condições nas quais se dá esse combate entre igualdade e barbárie.
* Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.
Edição: Katia Marko