No atual momento social brasileiro, marcado por uma crise sistêmica, que atinge a moral social, acabamos por relativizar a Verdade e tornar verdadeira a Mentira. Processo que dura algumas décadas, fato este motivado pelo extenso período de ditadura que tivemos, terminado não pela imposição popular, mas porque a elite resolveu mudar e a pressão internacional pressionou pedindo o fim das mortes e torturas de tant@s brasileir@s.
Isso para dizer que infelizmente nosso país ainda não conseguiu passar a história a limpo e esconde as mazelas do passado. Escondemos a escravidão no Brasil, a tortura, a morte dos mais pobres, a criminalização dos movimentos sociais, a injusta distribuição da terra... e o mais grave: fingimos não existirem indígenas no Brasil e disfarçamos em nossos livros de história, não falando absolutamente nada desta população que ocupou a Pacha Mama antes dos colonizadores chegarem. Pior que negar é ser indiferente em relação ao que aconteceu. Isso é condenar nossos irmãos indígenas ao esquecimento e os povos que ainda resistem ou estão isolados, dizer que estamos condenando-os ao esquecimento. Quantos de nós já teve a oportunidade de conviver com um indígena?
Esse enrosco, chamado capitalismo neoliberal, onde impera o lucro, o individualismo, o desenvolvimentismo sobre a vida e o meio ambiente impede a existência da Casa Comum, de sermos e convivermos com o diferente, nos impede de criarmos ecos.
Enquanto ruralistas agem na obscuridade expulsando e assassinando o povo indígena e suas lideranças, o governo tem utilizado com toda força suas estruturas para criar cortinas de fumaça, institucionalizando a milicianização do Estado, seja no campo seja na cidade!
É imoral a elasticidade feita por alguns juristas buscando legitimar o absurdo da retirada de direitos já garantidos para os povos indígenas. Nossa constituição promulgada em 5 de outubro de 1988 reconhece os mesmos direitos e deveres de qualquer brasileiro ao povo indígena, o que garantiu também a posse de suas terras e que suas tradições e costumes devem ser respeitados. Ainda temos o perigo que está em análise pelo Supremo Tribunal Federal (STF), a relação possessória e de uso da terra no julgamento do Recurso Extraordinário (RE) nº 1.017.365, conhecido como “marco temporal”.
Nossa estrutura jurídica, econômica, cultural e social foi construída a base do trabalho escravo e do assassinato de centenas de milhares de povos originários, precisamos avançar para superar este passado. A saída desse colapso está nas alternativas sistêmicas, nas comunidades, na solidariedade, na valorização do meio ambiente e da vida, na Casa Comum. Mais do que nunca, os indígenas são resistência.
É dando voz aos coletivos, à solidariedade e às trocas que não sucumbiremos. É hora de voltar a colocar a mão na terra, no barro, lembrando que é aí que impera nossa essência. É da Mãe Terra que somos filhos e filhas.
* Miguel Antonio Orlandi, Douglas Filgueiras e Daniela Van der Straeten Pimentel são membros da Associação do Voluntariado e da Solidariedade - AVESOL
* Este é um artigo de opinião. A visão da autora e dos autores não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.
Edição: Marcelo Ferreira