A publicação de livros como "Diálogos com Paulo Freire" está nessa caminhada da educação libertadora
“Aos esfarrapados do mundo e aos que neles se descobrem e, assim, descobrindo-se, com eles sofrem, mas, sobretudo, com eles lutam”. Esta é a dedicatória de Paulo Freire no livro Pedagogia do Oprimido, publicado primeiro no Chile nos anos 1960, e, por causa da ditadura, no Brasil só em 1974. E plenamente atual, em 2022.
Em 19 de setembro de 2021, Paulo Freire celebrou 100 anos. Em 14 de abril de 2022, completaram-se 10 anos de Paulo Freire ser declarado oficialmente Patrono da Educação brasileira. Em 2 de maio de 1997, há 25 anos, Paulo Freire faleceu.
Em 25 de abril de 2022, segunda, às 19h, na rua João Pessoa, 943, Porto Alegre, na sede da E-Carta, será lançado o livro “DIÁLOGOS COM PAULO FREIRE – Para entender e mudar o mundo, 100 anos de um Educador”, organizado por Liana Borges e Cristiano Goldschmidt, com colaboração de Ana Maria Araújo Freire, pela Editora Diálogo Freireano. Estão no livro textos e reflexões de freireanas e freireanos de todo Brasil: entrevista com Nita Freire, artigos de Oscar Jara, Carlos Rodrigues Brandão, Maria do Rosário, Fernanda Kunzler da Rede de Educação Cidadã (RECID), entre outras e outros. E um emocionante prefácio de Balduíno Andreola, o Baldô: “Carta-Prefácio a Paulo Freire”.
Francisco Weffort escreveu no prefácio de EDUCAÇÃO COMO PRÁTICA DA LIBERDADE, publicado nos anos 1960: “Seu movimento (de alfabetização) começou em 1962 no Nordeste – a região mais pobre do Brasil, cerca de 15 milhões de analfabetos para uma população de 25 milhões de habitantes. Os resultados obtidos, 300 trabalhadores alfabetizados em cerca de 45 dias, impressionaram profundamente a opinião pública e a aplicação do sistema pôde estender-se, já agora sob o patrocínio do governo federal, a todo território nacional. O plano de 1964 (da Campanha nacional de Alfabetização) previa a instalação de 20.000 Círculos de Cultura que já se encontravam capacitados para atender, durante este ano, a aproximadamente 2 milhões de alfabetizados (30 por Círculo, com duração de 3 meses cada curso). Tinha início assim uma campanha de alfabetização em escala nacional que envolvia, nas primeiras etapas, os setores urbanos, e deveria estender-se imediatamente depois aos setores rurais”.
Não por outro motivo, logo depois do golpe de 1964, o presidente militar general Castelo Branco, em abril de 1964, publicou um Decreto acabando com o Plano Nacional de Alfabetização. Paulo Freire foi preso logo em seguida por 72 dias e teve que partir para o exílio, de onde voltou só em 1980, 16 anos depois. Se o Plano de Alfabetização dos anos 1960 tivesse ido sido cumprido e executado, o Brasil de 2022 seria completamente outro!
Hoje, 2022, acontece a Campanha em Defesa do Legado de Paulo Freire, coordenada pelo CEAAL, Conselho Latino-americano e Caribenho de Defesa do Legado de Paulo Freire, e que está entrando na sua terceira fase. A publicação de livros como os "Diálogos com Paulo Freire" está nessa caminhada da educação libertadora. Cabe relembrar as palavras de Paulo Freire, quando perguntado por Moacir Gadotti se concordava com a criação do Instituto Paulo Freire. Paulo Freire respondeu: “Vejam, se for para me repetir, não vale a pena. Mas se for para me superar, então criem.” É um dos desafios hoje: superar Paulo Freire em tempos de fome, neofascismo e ameaças à democracia.
Este é Paulo Freire, sempre vivo, lembrado e celebrado, retratado e superado no prefácio de Balduíno Andreola, na entrevista de Nita Freire, em diferentes textos do livro que está sendo lançado, DIÁLOGOS COM PAULO FREIRE.
Minha contribuição dá-se com um poema meu (que não está no livro) de setembro de 2020, no início da Campanha em Defesa do Legado de Paulo Freire e das celebrações do seu centenário:
“ANDARILHANDO FREIREANAMENTE. Peregrinos nas estradas,/ andarilhamos em tempos de sol/ e em tempos de escuridão./ As causas e as coisas se entrelaçam/ nas esquinas da vida e do mundo,/ nos buracos das ruas,/ nas curvas dos rios,/nas ondas do mar.
Ninguém aprende sozinho,/ nem caminha o chão desacompanhado./ Porque a terra prometida é caminho de procura,/ às vezes na solidão,/ à sombra das mangueiras,/ quase sempre em muito boa companhia./ Reinventam-se o pensar,/ o sentir e o fazer,/ o caminho das letras,/a consciência do mundo/a saúde como direito,/ o poder popular,/ a Pachamama e a Casa Comum.
As palavras gritam através das sílabas do tijolo,/ - ta, te, ti, to, tu -,/ da mão criativa da trabalhadora e do trabalhador,/ a casa e o sonho em construção.
Há sempre um saber que se junta a outro saber./ Transforma-se em educação e sabedoria popular,/ em causos e histórias,/ vivências e aprendizados,/ versos e partituras./ Cada tijolo colocado acima de outro tijolo/ torna-se consciência,/ companheirismo,/ sentido coletivo,/ solidariedade,/democracia e luz,/ paz e justiça,/ alegria e prazer.
Não é esperar ver acontecer./ É esperançar a utopia,/ o sonho,/ a fraternidade. Freireanamente,/ caminham o mundo,/ a humanidade,/ o povo,/ os pobres e os sofredores,/ a população em situação de rua,/ os jovens e as mulheres,/ negras, negros,/quilombolas e indígenas,/ cidadãs e cidadãos do mundo,/ educadoras e educadores da liberdade/ e da soberania popular.
Andarilhamos./ Somos sujeitos coletivos e solidários,/ amantes da vida,/andarilhos do tempo,/ da amorosidade e da esperança./ Ninguém solta a mão de ninguém./ Sem medo de sermos felizes,/ expulsamos a tortura, o exílio,/ o ódio e a intolerância,/ derrubamos ditadores,/ a mentira e a opressão.
No trilho dos saberes populares,/ das Rodas de Conversa,/dos Círculos de Cultura,/ das Cirandas,/ das Tendas Paulo Freire,/ da educação como prática da liberdade,/ da pedagogia da oprimida e do oprimido e da indignação,/ do inédito viável,/ do cuidado com a Casa Comum,/ o Bem Viver latino-americano e caribenho/ acompanhará nossos passos por outros 100 anos.
Paulo Freire vive!/ Vamos lá fazer o que será!”
* Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.
Edição: Marcelo Ferreira