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Fórum Social Mundial volta à Capital em momento de ‘embate direto’ contra as desigualdades

Evento que começa na próxima semana pretende encaminhar propostas para a edição no México, em maio

Sul 21 |
Coletiva de Imprensa do Fórum Social Mundial ocorreu na Assembleia Legislativa - Foto: Luiza Castro/Sul21

Na próxima semana, o Fórum Social Mundial (FSM) desembarca novamente em Porto Alegre. Entre os dias de 26 a 30 de abril, dezenas de atividades ocorrerão divididas sob dois eixos temáticos: o Fórum Social das Resistências, e o Fórum Social Justiça e Democracia. O evento na Capital é preparatório ao Fórum Social Mundial que será realizado entre os dias 1º e 6 de maio no México.

Durante a apresentação do FSM realizada nesta sexta-feira (22), na Assembleia Legislativa, o integrante do Conselho Internacional do Fórum Social Mundial Mauri Cruz recordou que o Fórum nasceu em Porto Alegre, em 2001, num momento em que o capitalismo e o neoliberalismo eram apontados como o único caminho para as sociedades do planeta. Surgia então o slogan “Um outro mundo é possível” para afirmar que o capitalismo não atendia as necessidades de bem viver da humanidade, sendo, inclusive, causador de crises e responsável pelos problemas ambientais e pela desigualdade.

“O Fórum denunciou o que a gente chamava de ‘crise civilizatória’, crise de uma sociedade econômica que só pensa no lucro e não nas pessoas, que degrada o meio ambiente, que não está preocupada com a vida. Acho que naquele momento era um Fórum que anunciava isso, e nós éramos mais uma resistência mesmo, éramos a contra corrente”, recorda Cruz.

A partir daquele momento, ele avalia que as muitas edições do FSM em diversos países do mundo foram construindo propostas e ideias, algumas experimentadas em determinadas nações principalmente na América Latina. Agora, 21 anos depois da primeira edição do evento, o integrante do Conselho Internacional do Fórum Social Mundial avalia que o momento é de reação a esse processo, contra um mundo mais multilateral, plural, contra a luta para colocar a economia à serviço dos interesse das pessoas.

“Piorou a crise ambiental, pioraram as desigualdades, ou seja, aquilo que foi denunciado lá em 2001, como não mudou o sistema, está acontecendo. A diferença maior hoje é que, por um lado, a sociedade internacional está mais ciente do que foi denunciado em 2001, ela está vivendo a crise ambiental, está sofrendo a crise social. Por outro lado, a extrema-direita, que estava escondida no neoliberalismo, precisou mostrar sua cara e dizer que quer um mundo desigual, que quer um mundo onde tem seres humanos sem valor. Desse ponto de vista, o Fórum ganha importância porque ele fortalece as suas pautas, que sempre foram importantes, mas ele está num momento de embate mais direto. Essa é a questão que está colocada e esse é o desafio que nós temos”, afirma.

“O Fórum das Resistências, e da Justiça e Democracia, põe luz a isso, mas é um processo que só funciona se for global. Então a gente espera que no México se consiga sair com algumas estratégias globais necessárias para esse período. Os próximos 30 anos serão de mudanças radicais. Na história, as coisas não mudam tão rapidamente, embora tenham momentos históricos que representem ruptura. O papel do processo do Fórum é muito grande, porque é um dos poucos espaços plurais que articula a cidadania e os movimentos sociais de uma postura anticapitalista. Não vejo outros processos que cumpram esse papel, e por isso o Fórum Social Mundial é essencial”, completa.

Fórum das Resistências

Integrante do Observatório das Metrópoles, grupo que reúne cerca de 380 pesquisadores em 15 regiões metropolitanas do Brasil, Lucimar Siqueira destacou que o debate ambiental no evento, no dia 29, no auditório da Federação dos Trabalhadores e Trabalhadoras em Instituições Financeiras (Fetrafi-RS), será focado em cinco pontos: resíduos sólidos, política sócio-ambiental; desmonte dos sistemas de água e esgoto; educação ambiental; e mega-mineração.

“Entendemos ser um momento importante associar o debate ambiental com a questão urbana, são temas que se entrelaçam”, explicou a geógrafa, destacando o modo como as cidades são afetadas pelas mudanças climáticas e criticando a negligência do poder público em enfrentar o problema.

Outro problema que afeta as grandes cidades brasileiras e que será debatido no FSM é a moradia. O tema foi enfatizado por Ceniriani Vargas da Silva, coordenadora estadual do Movimento Nacional de Luta por Moradia (MNLM), ao citar que cerca de 50 mil pessoas estão ameaçadas de despejo no Rio Grande do Sul. No Brasil, são em torno de 500 mil, sendo 300 mil mulheres que enfrentam a fome e a ameaça de despejo, além da violência doméstica.

No Fórum Social das Resistências, os movimentos de moradia têm a convergência de que a luta mais importante do momento é evitar os despejos durante a pandemia. O tema está sendo discutido na Justiça, com decisão favorável até o dia 30 de junho. “É o ano da virada. Devemos nos organizar na resistência ou viveremos tempos piores”, projetou.

A programação completa do FSM das Resistências pode ser conferia no site do evento.

Fórum Justiça e Democracia

Promotora de Justiça do Ministério Público do Distrito Federal e integrante do coletivo Transforma MP, Alessandra Queiroga destacou ser a primeira vez que haverá um Fórum Social Mundial dedicado ao tema da Justiça e Democracia. Para ela, a oportunidade é inédita ao envolver no debate os diferentes membros do judiciário junto com os movimentos sociais.

“Normalmente discutimos entre nós, mas é muito difícil sentar com todos os atores do sistema de Justiça, no sentido de fazer uma crítica ao sistema de Justiça que a gente vivencia, e isso junto com os movimentos sociais, que têm milhares de críticas justas”, declarou.

Alessandra explicou que o processo de elaboração do FSM Justiça e Democracia começou em 2020, ainda antes da pandemia do novo coronavírus, e que a crise sanitária “acirrou” os problemas. A ideia amadureceu a partir de um encontro entre os diferentes coletivos progressistas do judiciário, como o Transforma MP e a Associação Juízes para a Democracia (AJD), com o sociólogo português Boaventura de Sousa Santos.

“A ideia é que, a partir desse encontro presencial, a gente tenha ações conjuntas, metas, coisas concretas. Não estamos pensando num momento de discussão, estamos pensando numa articulação que vá adiante com propostas concretas”, explicou.

Os debates do FSM Justiça e Democracia também pode ser acessados no site do evento.

Edição: Sul 21