Na linha de frente do atendimento à saúde, profissionais da enfermagem tiveram, durante a pandemia do coronavírus, uma sobrecarga de trabalho com forte impacto em sua saúde física e emocional. Com a estabilização da covid-19, as trabalhadoras e os trabalhadores da área seguem na luta pela jornada de 30 horas semanais e pelo piso salarial.
Criado pela Organização Mundial de Saúde (OMS), em 1948, o Dia Mundial da Saúde é celebrado nesta quinta-feira (7). A data tem como objetivo conscientizar as pessoas sobre a importância da preservação da saúde para ter uma melhor qualidade de vida. No Brasil, é tempo de refletir sobre a importância do Sistema Único de Saúde (SUS).
Dentre as categorias que atuam na área da saúde, a enfermagem é a maior força de trabalho no Brasil e no mundo. No país ela corresponde a 60% dos postos de trabalho da área, sendo que 85% da categoria é composta por mulheres. Destas, 80% são técnicas de enfermagem ou auxiliares (nível médio) e 20% têm graduação.
“A enfermagem é a categoria que cuida do indivíduo desde antes dele nascer, durante todas as etapas da vida e até depois da morte. Está 24 horas por dia prestando o cuidado, 7 dias da semana, todos os dias do ano. Em diferentes serviços, públicos ou privados, a enfermagem é quem recebe, acolhe, orienta e cuida das pessoas”, afirma a técnica de enfermagem e conselheira do Conselho Regional de Enfermagem do RS (Coren-RS), Úrsula Sander.
Ela destaca que a enfermagem liderou a resposta à crise humanitária e com isso ficou ainda mais sobrecarregada. “As equipes trabalharam no limite da exaustão física e emocional, com jornadas de trabalho que se sobrepunham. Até iniciar a vacinação, muitas profissionais da enfermagem tinham se afastado de suas casas, de suas famílias, na tentativa de não contaminar seus familiares e se dedicarem exclusivamente ao trabalho”, recorda.
Muita dedicação, pouca valorização
A presidenta do Sindicato dos Enfermeiros do RS (Sergs), Cláudia Ribeiro da Cunha Franco, também enfatiza que os profissionais da enfermagem estiveram na linha de frente durante toda a pandemia. “Foi a categoria que não recuou em nenhum momento, mesmo sem ter condições de trabalho, como no início da pandemia, em que os sindicatos tiveram de lutar pelo fornecimento de EPIs, algo que deveria ser básico”, diz a enfermeira.
Durante a pandemia houve uma maior demanda por serviços na área da saúde, surgiram novos postos de trabalho, mas não houve uma valorização efetiva do trabalho da Enfermagem, aponta a técnica. “Os salários continuam baixos, as jornadas de trabalho são longas, pois boa parte da categoria tem mais de um vínculo empregatício para compensar os baixos salários. As condições de trabalho continuam precarizadas com a terceirização e quarteirização do trabalho na saúde. Ao final do período mais agudo da pandemia, muitos profissionais foram demitidos”, expõe Úrsula.
“Recebemos reconhecimento da população com aplausos e lençóis nas janelas, mas precisamos de medidas mais efetivas de reconhecimento. Por isso a luta pelo piso salarial e a jornada de 30h, duas bandeiras históricas e que se mostraram ainda mais importantes na pandemia”, complementa Cláudia.
Ainda dentro do o contexto da pandemia, muitos profissionais padeceram por conta da covid-19. Segundo o Observatório da Enfermagem do Conselho Federal de Enfermagem (Cofen), foram 872 mortes entre profissionais da categoria, de um total de 63.280 trabalhadores(as) contaminadas(os).
Profissionais lutam por valorização
Para Úrsula, a luta é mais que justa e deve ser defendida pela sociedade, pois investir na enfermagem é proteger e valorizar a vida. "A enfermagem cuida dos indivíduos e da sociedade baseada em conhecimento e em pesquisa, com dedicação e amor. Por isso, precisamos que seja aprovado o piso salarial digno e a jornada de trabalho de 30 horas."
Ela destaca que, desde maio de 2020, com a apresentação de um novo PL (Projeto de Lei 2564/2020) no Senado, a categoria está mobilizada para dar maior visibilidade às suas demandas. "A sociedade vivenciou uma resposta efetiva por parte da enfermagem para a crise humanitária. Agora precisamos que ela nos apoie para uma valorização efetiva”, finaliza.
Cláudia reforça que a sociedade reconhece a importância da enfermagem, mas é preciso também que o poder público, nas três esferas (federal, estadual e municipal), assim como os gestores da saúde privada, reconheçam a importância dos profissionais. “Isso só acontece com remuneração justa e melhores condições de trabalho", afirma.
Ela lista os avanços que a categoria precisa: piso salarial digno, jornada de 30h, como preconiza a Organização Mundial da Saúde, espaço para descanso dos profissionais e compreensão da importância estratégica nas equipes multiprofissionais de saúde.
Ato em defesa da enfermagem
Nesta quinta-feira (7), por ocasião do Dia Mundial da Saúde, a Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul promoveu um ato em defesa das reivindicações apresentadas à reportagem do Brasil de Fato RS por Úrsula e Cláudia: o piso salarial e a jornada de trabalho de 30 horas semanais da categoria.
A atividade, proposta pelo presidente do Parlamento gaúcho, deputado estadual Valdeci Oliveira (PT), aconteceu às 11 horas, no Salão Júlio de Castilhos, no Palácio Farroupilha, em Porto Alegre. O deputado disse que o momento é oportuno, pois está em tramitação no Congresso Nacional o PL 2564/2020, que trata do piso salarial da enfermagem.
Recentemente, na Câmara dos Deputados, foi aprovado o regime de votação em caráter de urgência desse projeto. “A hora de garantirmos uma valorização efetiva dos profissionais de enfermagem é agora. As homenagens e aplausos realizados em função da atuação na pandemia comovem, mas não resolvem na prática. A desvalorização profissional é muito grande, é aviltante e precisa ser enfrentada já. A Assembleia Legislativa, há muitos anos, atua em relação a esses temas, e, neste momento de mobilização, a Casa não poderia ficar de fora”, pontuou Valdeci.
"Não adianta só aplausos"
Cláudia chama atenção para "um forte lobby" no Congresso a fim de frear o projeto que fixa o piso salarial da categoria. A presidenta do Sergs expõe que já conseguiram reduzir o valor original do piso e tentam de todas as formas retardar sua votação.
“Estamos mobilizados em Brasília, todas as entidades e o Fórum Nacional da Enfermagem, para pressionar os deputados federais e o presidente da Casa, Arthur Lira. Precisamos de todo apoio da população neste sentido, pois não adianta só aplausos. Inclusive este Dia Mundial da Saúde foi eleito como data simbólica de pressão para que a votação no plenário aconteça, para que o projeto seja votado ainda em 2022, de preferência antes da Semana da Enfermagem, que acontece em maio”, finaliza.
Em 2021, o Brasil de Fato RS fez um série especial com os profissionais da linha de frente no combate à pandemia.
Confira aqui a cobertura do ato em defesa da enfermagem e do SUS na Assembleia Legislativa.
:: Clique aqui para receber notícias do Brasil de Fato RS no seu Whatsapp ::
Edição: Marcelo Ferreira