Rio Grande do Sul

Coluna

Porto Alegre fez 250 anos

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Não deixem de visitar a Seleção ECARTA, Uma artista e sua cidade. Se trata de uma retrospectiva com obras que Zoravia Bettiol produziu entre 1956 e 2021" - Foto: Igor Sperotto/Ecarta
O evento mais importante desta festa de 250 anos, se apoia no coração de uma única mulher de 87 anos

E isso nos mostra que esta cidade, que já foi um polo cultural global, depende mesmo de sua alma, para não afundar. Se não podemos contar com os políticos que aqui se sucedem em conluio, nem para momentos de festa desta dimensão, o que pensar das tragédias?

Vejam que o atual prefeito, ciente de nossa vocação para o turismo, revalidou nesta data aquela coisa da roda gigante na beira do Guaíba.

Dizendo que “não é a mesma coisa”, Melo na prática ressuscitou uma proposta do prefeito anterior, que já foi rejeitada pela comunidade.  

E de fato, não é a mesma coisa. Afinal, a Roda do Melo não fica no mesmo lugar e é até mais modesta. Terá apenas 66 metros, ao invés dos tresloucados 80 metros previstos na roda do Marchezan. De resto, continua sendo uma distração caça níquel, elitista e oportunizadora de negócios. Fala-se em R$ 60 milhões, a serem custeados pelo grupo que já tem (contrato assinado no ano que passou) a concessão do parque Harmonia, e mais vasta área da orla, até o ano 2056.

Impossível não lembrar da vida animada que aqui transcorria ao longo dos Fóruns Sociais Mundiais. Ou não pensar na pujança cultural da Restinga, no calor do Bloco da Lage, do Turucutá, do Piupiu do Mário e tantos outros blocos de rua. Que festa poderíamos fazer, tão somente chamando a cidade a participar, não é mesmo?

E o que nos impede de ocupar o espaço destinado ao povo, nesta cidade? Penso que seja o abafamento de nossas estrelas. Penso que seja o esforço das máfias.

Penso que para que os 250 anos da cidade brilhassem como devido, bastaria que aqueles gananciosos egoístas não atrapalhassem.

Como exemplo, e destacando que talvez o evento cultural mais importante desta festa de 250 anos, se apoie no coração de uma única mulher de 87 anos, quero falar sobre isso. 

 
Arte, Ciência e Ética num Brasil de Fato

🔴 #AO VIVO | Arte, Ciência e Ética num Brasil de Fato A terceira edição com o tema "Arte, Ética e Militância", com a convidada Zorávia Bettiol, artista plástica, designer, arte-educadora e ambientalista. Mediação: Katia Marko (BdFRS) e Leonardo Melgarejo (MCC)

Posted by Brasil de Fato RS on Thursday, August 13, 2020

 

Zoravia Bettiol, nossa maior artista, é uma ativista desde que percebeu (segundo ela aos 6 anos), que a injustiça, a pobreza, a miséria e o desrespeito têm uma mesma raiz, inaceitável, que deve ser arrancada. Ela grita isso, em xilogravuras, pinturas, desenhos, tapeçarias, esculturas e construções envolvendo palavras que cativam. É uma pessoa que transborda em sorrisos, pensamentos, gestos e ações agregadoras, que mobilizam a todos/as que dela se aproximam.

Pois é por isso que para os/as que ainda não se renovam de energia e fé, na fonte de Zoravia, e que sofrem com o que se passa em Porto Alegre, que afirmo: não deixem de visitar a Seleção ECARTA, Uma artista e sua cidade. Se trata de uma retrospectiva com obras que Zoravia Bettiol produziu entre 1956 e 2021, com curadoria de André Venzon (as visitações vão até 8 de maio, de terças a domingos, das 10h às 18h – Av. João Pessoa, 943, PoA).


Esta é uma das obras mais fortes da exposição que reúne 46 peças / Foto: Igor Sperotto/Ecarta

É de longe o melhor programa deste aniversário de Porto Alegre, e para limitar os comentários a uma única obra, imagine uma família classe média, passeando.

A filha segura um fio, preso a um balão. O balão é uma pomba da paz, que voa laçada pelo pescoço. O cachorro, que é uma fera, está pronto a avançar sobre nós. E sustentando a calçada, por onde eles passam, cabeças de negros e índios.

Há muito mais a ser visto em cada uma das 46 peças. Elas falam das motivações de que precisamos para salvar o país da degradação que, sob nossa apatia, a tudo corrói.

Elas falam da irmandade.

:: Ouça aqui a coluna em áudio no Coletivo Catarse.::

 

* Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.

Edição: Katia Marko