Rio Grande do Sul

Coluna

Diálogo, sabedoria, amor e perdão

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O lema da Campanha da Fraternidade 2022 é ´fala com sabedoria, ensina com amor´ - Divulgação
A Campanha da Fraternidade 2022 da CNBB tem como lema central Fraternidade e Educação

Jesus se inclinou e começou a escrever no solo com o dedo. E disse aos Mestres da Lei e fariseus, diante da mulher acusada de adultério, que, segundo a Lei de Moisés, devia ser apedrejada: “Quem de vocês não tiver pecado, atire a primeira pedra.” Começando pelos mais velhos, todos foram se retirando. Jesus inclinou-se de novo e seguiu escrevendo no chão. Então olhou para a mulher e perguntou: “Onde estão os que te acusavam? Ninguém te condenou?” “Ninguém”, disse ela. “Nem eu te condeno. Vai, e não peques mais”, disse Jesus. O amor superou o legalismo hipócrita.

Fui no Campeche em Florianópolis por estes dias fazer umas necessárias compras básicas: alface, moranga e umas doçuras pra comer. Na saída do supermercado, no estacionamento, uma mulher me interpelou: “Estou com umas coisas pra vender. Preciso sobreviver, preciso comer. Pode me ajudar?” Como não comprar, se, mesmo eu estando num apartamentinho modesto na Armação, praia de pescadores pobres do Sul da Ilha de Floripa, posso relaxar e descansar sem maiores sobressaltos, muito menos passar fome? Comprei uns ´comets frutas e iogurte´ com as moedas que tinha no bolso.

Na sequência, chego numa agência bancária para pagar o aluguel devido. Entro na agência, ponho a mão no bolso, cadê o celular? Volto para o carro. Não acho. Esqueci no supermercado, na hora de pagar as compras? E um pensamento cruel me assalta. Não terá sido a mulher, eu distraído, que o levou sorrateiramente na hora de comprar os doces!!!???

Volto a procurar, reviro o carro. Achei o celular finalmente, debaixo do banco. Tinha caído do bolso da calça durante o percurso de um lugar para outro.

Eu, eu, eu, suposto cristão comprometido, passando pela minha cabeça que poderia ter sido a mulher pobre, faminta, cuidando de sua família??? Como posso ser tão pecador, eu do Movimento Fé e Política, eu das Comunidades Eclesiais de Base, e tantas outras coisas! Ou serão os tempos infames que atravessamos, onde todo mundo desconfia de todo mundo, até eu, também envenenado pelas fake news, preconceitos e mentiras do cotidiano???

Pequei. Não segui os ensinamentos, a piedade, o diálogo e amor de Jesus. Fui como os Mestres da Lei e os fariseus do seu tempo. Preconceituoso, hipócrita, legalista, mesmo que tenha sido apenas em pensamento. Jesus entendeu e, sobretudo, amou a mulher, mesmo naqueles tempos distantes e complexos. Eu desconfiei, ainda que a tenha ajudado.

A Campanha da Fraternidade 2022 da CNBB tem como lema central FRATERNIDADE E EDUCAÇÃO. E como lema, 'fala com sabedoria, ensina com amor'. Como posso ainda 'falar com sabedoria, ensinar com amor', se sou capaz de tal desconfiança nesta altura da vida?

DIÁLOGO. Diz o Texto-Base da CF/22: “Jesus também educa para o diálogo”. O Papa Francisco em sua ´Veritatis Gaudium´, aponta, para uma Igreja em Saída, “o diálogo sem reservas: não como mera atitude tática, mas como a exigência intrínseca para fazer experiência comunitária da alegria da Verdade e profundar o seu significado e implicações práticas”.

SABEDORIA. Reza a Oração da Campanha da Fraternidade/22: “Ensinai-nos a falar com sabedoria e educar com amor.” Um dos seus Objetivos específicos diz: “Promover uma educação comprometida com novas formas de economia, de política e de progresso verdadeiramente a serviço da vida humana, em especial, dos mais pobres.”

AMOR. Diz o Texto-Base da CF/22: “Educar é humanizar. A educação é um ato de amor e esperança no ser humano.” E a Oração: “Livrai-nos da influência negativa de uma cultura em que a educação não é assumida como ato de amor aos irmãos e de esperança no ser humano. Ajudai-nos a promover uma educação integral, fraterna e solidária.”

A Campanha da Fraternidade/22 propõe, à luz da educação popular de Paulo Freire: “No atual contexto profundamente marcado por contrastes sociais e sem uma visão comum, é urgente uma mudança de rumo que só será possível através de uma educação integral e inclusiva, capaz de uma escuta paciente e de um diálogo construtivo no qual a unidade supere o conflito. Para educar para o Humanismo Solidário e construir a Civilização do Amor é necessário: globalizar a esperança, buscar uma verdadeira inclusão, criar redes de cooperação. Dar de comer a quem tem fome, de beber a quem tem sede, vestir os nus, dar abrigo aos peregrinos, assistir aos enfermos, visitar os presos, sepultar os mortos.”

No que resta de 2022, ou pelo menos durante toda Quaresma, preciso me ajoelhar no milho, como se diz na minha terra, e pedir perdão todos os dias, penitenciar-me para me tornar melhor e justo em pensamentos e ações. Não fui do diálogo que compreende. Não soube agir com sabedoria. Muito menos demonstrei amor verdadeiro e não preconceituoso.

Amém! Axé! Awere! Aleluia!

* Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.

Edição: Katia Marko