Com fama de ser o “Fleury dos Pampas” - referência a Sérgio Paranhos Fleury, o mais célebre torturador da ditadura de 1964 - o delegado Pedro Seelig, 87 anos, foi cremado hoje (9). Ele morreu no dia anterior em Porto Alegre. Durante o regime militar (1964-1985), Seelig foi a figura mais notória da polícia política no Sul do Brasil.
Seelig tornou-se nome notório ao ser flagrado como o chefe do sequestro dos uruguaios Universindo Diaz e Lilian Celiberti em 1978. Fugindo da ditadura em seu país, Lilian e Universindo moravam na rua Botafogo, no bairro Menino Deus, em Porto Alegre.
O sequestro descoberto
Foram capturados em casa, mas seus captores acabaram surpreendidos durante o sequestro pelo repórter Luis Cláudio Cunha e o fotógrafo João Batista Scalco, de Veja. Cunha e Scalco bateram à porta da casa e, em vez de Lilian e Universindo, deram de cara com os policiais.
A dupla havia recebido uma informação de São Paulo e foi ver qual era a situação dos fugitivos. Seelig e mais três policiais, um deles o ex-jogador do Internacional, Didi Pedalada, prestavam serviço para a Operação Condor, a agência clandestina montada pelos regimes militares do Cone Sul para prender, torturar e assassinar adversários políticos.
Em 2020, o ex-preso político Antonio Pinheiro Salles, 82 anos, disse à Folha de S. Paulo ter sofrido tortura no Departamento de Ordem Política e Social (DOPS), quando o órgão da polícia gaúcha era comandado por Seelig.
“Introduziram uma bucha de bombril no meu ânus quando estava pendurado no pau-de-arara”, recordou. Ligado à bucha estava um fio elétrico que tinha a outra extremidade enrolada no pênis do torturado. O fio estava conectado à “Maricota”, apelido da máquina de aplicar choques. Tudo com a participação, segundo ele, do delegado Seelig.
Próteses de platina
Nos nove anos de cárcere, Salles afirmou também ter sido torturado em São Paulo pelo capitão Carlos Alberto Brilhante Ustra, o torturador citado e elogiado pelo hoje presidente Jair Bolsonaro na noite da votação pelo impeachment da presidente Dilma Rousseff em abril de 2016.
No suplício, Salles perdeu os dentes e teve lesões nas mandíbulas, hoje substituídas por próteses de platina. Perdeu a audição de um dos ouvidos e, parcialmente, o movimento do braço direito.
Processado após ser flagrado no sequestro, Seelig foi absolvido por “falta de provas”.
Em nota, a Associação dos Delegados de Polícia (Asdep) lamentou a morte de Seelig. O texto omite a participação do delegado como comandante da repressão, acusado de tortura e autor de sequestro. Assinada pelo presidente da associação, Fernando Edison Domingues Soares, a mensagem lembra que Seelig era conselheiro da Asdep. Para arrematar, envia pêsames aos familiares, colegas e amigos do morto, desejando-lhes “muita força e luz neste momento tão difícil”.
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Edição: Katia Marko