O 8 de Março - Dia Internacional da Mulher foi marcado por manifestações em Porto Alegre. Pela manhã, mais de 200 mulheres camponesas ocuparam o pátio da Secretaria de Agricultura para reivindicar medidas concretas que busquem amenizar os impactos da estiagem no estado. Sob o lema “Terra, Trabalho, Direito de existir. Mulheres em Luta não vão sucumbir!”, os atos integram a Jornada de Lutas das Mulheres Sem Terra (MST), que inclui protestos, ações de solidariedade e atividades de formação política em todo o país durante o mês de março. À tarde, elas doaram cerca de quatro toneladas de alimentos para cozinhas comunitárias de Porto Alegre.
Como parte da programação unificada do Dia de Luta das Mulheres, movimentos feministas, sindicais e populares montaram a Tenda Elza Soares, no Largo Glênio Peres,onde promoveram rodas de conversas. Entre os temas discutidos, estavam o ‘Combate à fome e à miséria com trabalho digno no campo e na cidade’, ‘Defesa da democracia, controle social e participação popular na defesa das políticas públicas’ e ‘Combate à violência de gênero, política, racismo estrutural, LGBTfobia e feminicídio’. Além disso, outras atividades também foram realizadas, como palestras, apresentações musicais e arrecadação de absorventes.
Inspirando e encorajando mulheres com os seus versos de resistência, a rapper Negra Jaque foi uma das atrações do 8M. A cantora apresentou “Maria Madalena”, música composta em homenagem à mãe, vítima de câncer. “A minha mãe foi a minha primeira referência de feminismo. Desde pequenininha ela me ensinou: ‘Jaque, estude, trabalhe, para não limpar a bunda de brancos’. Minha mãe sempre foi a minha estrutura. Perder ela para uma doença tão comum entre mulheres pobres, mulheres pretas, que é o câncer, é muito dolorido.”
Para a artista, o 8 de março é um dia de reunião com a sociedade. “É um dia que a gente diz para a sociedade que a gente ainda luta, que ainda estamos vivas e que a gente faz isso todos os dias. As mulheres que estão na luta, que são feministas e que estão nos movimentos populares fazem isso todos os dias desde a hora em que elas acordam”, explica. A atriz Tânia Farias, integrante da Tribo de Atuadores Ói Nóis Aqui Traveiz, também marcou presença com sua arte.
Luta pela água mobiliza mulheres da periferia
Mulheres moradoras do Morro da Cruz, periferia de Porto Alegre, se manifestaram em frente à Prefeitura de Porto Alegre para exigir um direito fundamental: acesso à água potável. Desde o começo do ano, a região - com cerca de 100 mil habitantes - tem enfrentado problemas de desabastecimento. “Estamos com um ônibus cheio de mulheres. A gente veio lutar pelos nossos direitos, principalmente pela questão da falta de água, tem famílias há mais de 60 dias sem água no Morro da Cruz”, relata Angela Comunal, moradora da região há 30 anos. O Levante Popular da Juventude fez um escracho, derramando água suja para denunciar a qualidade da água que chega nas periferias.
Além do pedido pelo fim da violência de gênero, do racismo e da fome, o Dia Internacional da Mulher deste ano teve como prioridade a luta pela derrubada do presidente Jair Bolsonaro (PL). “O 8 de março de 2022 vai ficar registrado como um dia de resistência contra o fascismo, o bolsonarismo e todas as formas de ataque à vida que vem acontecendo no Brasil ao longo dos últimos anos. Estamos aqui resistindo e, ao mesmo tempo, querendo com todas as nossas forças que esse governo Bolsonaro acabe”, comenta a deputada federal e ex-ministra de Direitos Humanos Maria do Rosário (PT-RS).
A vereadora de Porto Alegre Bruna Rodrigues (PCdoB) reforça que a data marca a luta pela dignidade das mulheres. Nas palavras de Bruna, é um 8 de março que antecede a derrota de Bolsonaro. “É um dia que marca essa batalha central contra esse projeto que escolheu nos matar. Eu tenho enfrentado na Câmara Municipal a violência política de gênero de forma constante, inclusive, eu entrei com uma medida judicial contra um vereador bolsonarista. Nós não vamos compactuar com esse projeto violento que tira a chance da gente se desenvolver e de pautar o que é fundamental para a nossa existência, para a nossa vida.”
Fernanda Melchionna, deputada federal (PSOL/RS), complementa: “É uma luta necessária para enfrentar o machismo, o patriarcado, as consequências da pandemia e do governo de extrema direita na vida das mulheres. Realidade que tem sido pesada com o aumento da violência doméstica, da diminuição das políticas de proteção. As mulheres são as maiores afetadas pelo desemprego, pelos baixos salários e é pior ainda para as mulheres pretas que sofrem uma dupla opressão, do capitalismo e do machismo. Estamos contra esse desmonte das políticas públicas que esse governo promoveu. Contra esse governo inimigo da vida”.
Em meio a um cenário de retrocessos, muitas mulheres foram às ruas reivindicar seus direitos pela primeira vez. É o caso da diretora do Sindicato dos Servidores Públicos Aposentados e Pensionistas do Estado do Rio Grande do Sul (Sinapers), Zaida Bastos, de 64 anos: “Eu me sinto no dever de endossar esse espaço de mulheres. Eu quero dedicar o meu tempo a essas lutas sociais, que têm um interesse pelo bem estar de todos, seja pela educação, seja pela saúde, e que queiram tirar esse genocida do poder que veio só para nos enterrar vivas. Hoje, eu tenho disponibilidade e uma consciência plena das minhas responsabilidades”, explica a aposentada.
Indagada sobre a sua ida ao ato, a assentada Maria Cruz, de 83 anos, foi enfática ao dizer: “Eu jamais poderia ficar em casa sabendo que tem esse ato maravilhoso, com toda essa luta. É a primeira vez que eu saio depois da pandemia, eu tô realizada”. Moradora de Eldorado do Sul, Maria é integrante do Movimento de Trabalhadoras e Trabalhadores por Direitos (MTD).
Sônia Marisa Ribeiro Martins, moradora do Bairro Nonoai, afirma que esteve presente para apoiar o movimento das mulheres. É a primeira vez que Sônia participa de um ato e trouxe os netos consigo. "Eu trouxe eles para participarem e já irem se acostumando desde pequenos". Sobre o porquê de estar ali, relata que foi convidada pelo Movimento de Mulheres Olga Benário e considerou que seria interessante participar.
Cruzes pelas mulheres vítimas do feminicídio
Em memória às vítimas de feminicídio, mulheres colocaram cruzes na escadaria da Prefeitura de Porto Alegre. Apenas entre março de 2020 e dezembro de 2021, o Brasil registrou 2.451 feminicídios e 100.398 casos de estupro e estupro de vulnerável de vítimas do gênero feminino, de acordo com levantamento realizado pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), divulgado nesta última segunda-feira (7), véspera do Dia Internacional da Mulher.
Segundo o relatório, o Rio Grande do Sul aparece no ranking como o terceiro estado do país que mais registrou estupro por 100 mil habitantes. Em 2019, primeiro ano da gestão de Bolsonaro como presidente, o número de estupros de mulheres e vulneráveis foi recorde, chegando a 69.886 registros.
A agenda foi articulada de forma conjunta e, após quase 12 horas de atividades, culminou em uma marcha que teve início na Esquina Democrática. Mulheres militantes, artistas, jovens, mães, avós, pretas, indígenas - e também aquelas que pela primeira vez vivenciavam uma mobilização - seguiram juntas em caminhada pela Avenida Borges de Medeiros até o Largo dos Açorianos.
Ao longo do trajeto, entoavam palavras de ordem contra o fascismo, o racismo e o capitalismo, e, em uníssono, gritavam: “Ele Não, Ele Nunca Mais.” O encerramento se deu ao som da escola de samba Imperatriz Dona Leopoldina.
Confira a transmissão ao vivo:
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Edição: Katia Marko