Durante a ditadura civico-militar brasileira, para não tombar diante dos horrores e torturas ao qual foi subjugada, Nilce Azevedo Cardoso, via flores, sentia o sol, via a lua. “Só fazendo isso, é que as pessoas ficaram longe do suicídio ou endureceram de vez”, nos contou em 2019, no especial 40 anos da Anistia. Na manhã desta terça-feira (22), chegou a notícia que a combatente e militante nos deixou.
Na primeira conversa que o Brasil de Fato RS teve com Nilce, ela nos recebeu com seu sorriso e seus cabelos ruivos, e na ocasião com o braço fraturado. Por quase duas horas de conversa ela recordou os tempos da ditadura, os impactos que teve sobre sua vida, e sobre o primeiro ano de governo de Jair Bolsonaro e a importância da justiça. “Tem que se fazer justiça para que se possa continuar, pela luta por memória, pela verdade. Tem que construir a história desse país junto com a justiça e a memória. Se não, vem um cara que diz que a violência é que é prioridade, o símbolo é a arminha na mãozinha até das crianças pequenas, acham que está certo torturar, não sabe porque não mataram todos.”
Em um segundo encontro, em 2020, dessa vez com a jornalista Katia Marko e o engenheiro agronômo Leonardo Melgarejo, no programa "Arte, Ciência, Ética e Direitos Humanos", enfatizou que a inércia, a apatia e o medo só serão vencidos pelo movimento, pelas ações. E isso contagia.
🟠 #AOVIVO | "Arte, Ciência e Ética num Brasil de Fato"🟠 #AOVIVO | "Arte, Ciência e Ética num Brasil de Fato" 🌈 A décima primeira edição será com o tema "Arte, Ciência, Ética e Direitos Humanos". Neste mês, nossa homenagem será ao Dia Internacional dos Direitos Humanos, comemorado em 10 de dezembro, data em que a Declaração Universal dos Direitos Humanos foi oficializada, em 1948. Convidada: Nilce Azevedo Cardoso, Professora e psicopedagoga clínica, militante nas questões de Direitos Humanos, principalmente na Educação. Cidadã Emérita de Porto Alegre e Medalha de Honra do Mérito Farroupilha. Anistiada política do Brasil. Participou do Clínicas do Testemunho, para as comissões da verdade estadual e nacional. Mãe de 2 filhos e vó de 4 netas. Mediação: Katia Marko (BdFRS) e Leonardo Melgarejo (MCC)
Posted by Brasil de Fato RS on Thursday, December 3, 2020
O comunicado de sua passagem foi feita pelos seus filhos Semíramis e Paulo, o velório será no cemitério São Miguel e Almas capela "J" das 14 às 19h.
Pelas redes sociais inúmeras mensagens destacaram a militância, e vida de Nilce, entre elas de Suzana Lisboa, que trocou sua foto de perfil por uma imagem de Nilce, do Doutor em Psicanálise Alexei Indursky, que lembrou da atuação de Nilce no Clínicas do Testemunho. “Conheci Nilce Azevedo Cardoso em 2013, quando começávamos a desenvolver o Clínicas do Testemunho, política de reparação psíquica para os afetados pela ditadura civil-militar. Com o auditório cheio, destemida, ela foi uma das primeiras da plateia a tomar a palavra e nos lembrar da enorme responsabilidade que carregaríamos ao escutar os testemunhos de pessoas que, como ela, haviam dado a vida para que as gerações por vir não vivessem sob uma ditadura (...). Nilce foi um sismógrafo de nossos tempos sombrios. Viveu de demasiado perto os abalos que o poder em sua face mais covarde pode impingir aos sujeitos. Mas Nilce fez desses sismos a tarefa de religação através do afeto, da solidariedade, da ética e do amor. E quando seu próprio corpo passara dos limites, Nilce refez-se mulher, mãe, avó, nesse gesto preciso e memorável do abraço.”
Nilce, uma militante dos direitos humanos
Nilce Azevedo Cardoso, professora e psicopedagoga clínica, militante nas questões de Direitos Humanos, principalmente na Educação. Cidadã Emérita de Porto Alegre e Medalha de Honra do Mérito Farroupilha. Anistiada política do Brasil. Participou do Clínicas do Testemunho, para as comissões da Verdade estadual e nacional. Nilce deixou dois filhos e quatro netas.
"O Brasil precisa aprender a virar a página (da ditadura). Não se termina um livro sem virar suas páginas. Mas não a lemos porque ainda faltam pedaços. Muitas lágrimas já foram derramadas e nos atrapalharam na leitura, mas precisaremos delas e, talvez, de mais ousadia, porque precisaremos de justiça”, disse Nilce, ao jornal do Comércio, em 2013, em uma matéria intitulada Carta de uma mãe que pede justiça.
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Edição: Katia Marko