O Rio Grande do Sul registra um aumento de 99,4% nos casos de covid-19 na comparação com a semana anterior. São dados da planilha de hoje (6) do boletim regional de covid-19 da Secretaria de Saúde do RS (SES). Das 21 regiões acompanhadas pelo boletim, 17 estão em alta e quatro em baixa. O destaque negativo é Porto Alegre, onde o avanço atingiu 201,6%.
Nesta quinta-feira, mais 5.363 casos foram confirmados, atestando a escalada. Na véspera, tinham sido 3.464 e, na terça-feira, 2.138.
Ao contrário do que acontece com as infecções, as mortes mantém o padrão de queda. No estado, houve uma diminuição de 22,2% em relação à semana anterior. Das 21 regiões, apenas duas registraram elevação nos óbitos. Até o momento, os hospitais mantém leitos disponíveis para covid-19 e, na metade das regiões, a taxa de ocupação é decrescente.
Esse aumento de casos registrados coincide com o período de festas de final de ano, onde ocorrem maiores aglomerações. Um levantamento da plataforma online Our World in Data, vinculada à Universidade de Oxford, mostra que a variante ômicron já é dominante no Brasil, sendo responsável por 58,33% dos casos de covid-19 sequenciados no país entre 13 e 27 de dezembro.
Mellanie Fontes-Dutra, biomédica, pesquisadora e divulgadora científica pela Rede Análise, alerta que, neste cenário, “se não tomarmos cuidado e nos atentarmos para os isolamentos corretamente de casos e contatos, testagem mais ampla, além do uso adequado de máscaras e medidas de enfrentamento, poderemos ver um pico significativo de casos”.
Em entrevista ao Brasil de Fato RS, Mellanie avalia a atual situação da pandemia, criticando o baixo índice de testagem realizado no país. “Muitos casos podem passar sem a confirmação pelo teste, e esses casos podem ser de ômicrom”, aponta.
A biommédica formada pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul também defende a vacinação infantil, destacando as evidências do benefício da imunização do público de 5 a 11 anos. “Temos dados mostrando que o Brasil é o 2º país com mais óbitos de crianças por covid-19. Sabemos que as crianças recuperadas podem experienciar covid longa”, assegura.
Para ela, é possível evitar um grande impacto dessa possível nova onda. “Precisamos seguir ampliando o máximo que pudermos as coberturas vacinais (para 1ª, 2ª e 3ª doses), além da adesão de toda a população às medidas de enfrentamento. Combinando-as, reduzimos ainda mais os riscos”, defende.
Abaixo, leia a entrevista completa:
Brasil de Fato RS - Com a variante ômicrom tendo chegado no Brasil semanas antes das festas de final de ano, momento de maiores aglomerações, é de se esperar um novo pico de contaminações?
Mellanie Fontes-Dutra - Estamos vendo uma subida de casos em algumas localidades, o que pode sinalizar contatos realizados durante esse período do final do ano. Se não tomarmos cuidado e nos atentarmos para os isolamentos corretamente de casos e contatos, testagem mais ampla, além do uso adequado de máscaras e medidas de enfrentamento, poderemos ver um pico significativo de casos. Também podemos ver algumas pessoas mais vulneráveis (como não vacinados, por exemplo) precisando de hospitalização, trazendo um risco de sobrecarregar o sistema de saúde, pois ainda temos muitas pessoas vulneráveis e/ou não vacinadas/sem o esquema completo.
BdFRS - Uma nova onda no país agora em um contexto de avanço da vacinação deve gerar a mesma situação que tivemos em 2021, com alto número de mortes e superlotação do sistema de saúde?
Mellanie - Graças à vacinação, é bastante possível que reproduza o que estamos vendo em outros países, uma aceleração de novos casos, mas a curva de óbitos não tendo a mesma velocidade de crescimento. Mas é importante que a gente faça a nossa parte para que esse impacto seja o menor possível, ampliando rapidamente a vacinação para os públicos-alvo, além da conscientização quanto às medidas de enfrentamento.
BdFRS - Temos notícias de registros da variante ômicrom em diversos estados, mas em números ainda baixos no comparativo com o todo. O Brasil segue com baixo índice de testagem? Isso interfere na identificação quantitativa de circulação desta nova variante no país?
Mellanie - Infelizmente sim. E sim, interfere, pois muitos casos podem passar sem a confirmação pelo teste, e esses casos podem ser de ômicrom, por exemplo.
BdFRS - Nos últimos dias, temos visto recordes de números de casos de covid-19 em todo o mundo, resultado da variante ômicrom. O que o Brasil poderia aprender para lidar com esta variante tomando os exemplos de outros países que estão puxando esses recordes de contaminação?
Mellanie - Que temos que confiar e aderir no que realmente funciona: vacinas somadas com medidas de enfrentamento. Ninguém quer retroceder no cenário que estamos vivendo atualmente, mas se não quisermos maiores restrições, cada um tem um papel a cumprir nesse enfrentamento, que é um enfrentamento por parte da sociedade.
Outra questão importante que serve como aprendizado é: precisamos de equidade nas coberturas vacinais dentro do Brasil (as da região mais norte são mais baixas em relação a de outras regiões por exemplo), além de não estagnar a velocidade de vacinação, como infelizmente ocorreu em alguns países do Leste Europeu.
BdFRS – O novo debate da pandemia é vacinar ou não vacinar crianças. Já existem estudos que ressaltam a importância da vacinação infantil? Qual sua avaliação a este respeito?
Mellanie - Sim, já temos um conjunto de evidências, aprovações por agências reguladoras reconhecidas por fazer análises robustas, além da recomendação de sociedades médicas brasileiras em prol da vacinação do público de 5 a 11 anos com a vacina aprovada no Brasil atualmente para essa faixa, a vacina da Pfizer.
Precisamos vacinar as crianças. Crianças podem adoecer e hospitalizar e evoluir para casos mais graves.
Temos dados mostrando que o Brasil é o 2º país com mais óbitos de crianças por covid-19. Sabemos que as crianças recuperadas podem experienciar covid longa. O relatório da ONS do Reino Unido, em dezembro, mostra que 20 mil crianças convivem com covid longa há pelo menos um ano. As vacinas reduzem os riscos de tudo isso, principalmente da doença. Além disso, a ampliação para esse público somará numa cobertura vacinal mais alta.
BdFRS - Além da covid-19, temos circulando uma nova variante da gripe, a influenza H3N2. Há relatos de casos de dupla infecção – covid e gripe. Este quadro é preocupante?
Mellanie - Sim, demonstra que há uma falha na adesão de medidas de enfrentamento contra vírus respiratórios, além de termos tido baixas coberturas vacinais para influenza na última campanha. O influenza pode também gerar quadros mais graves, principalmente em populações mais vulneráveis. Portanto, é preocupante, e pode também sobrecarregar o sistema de saúde, somado às consequências da covid-19 e de outras enfermidades.
BdFRS - Na sua avaliação, que medidas devem ser tomadas para evitar uma piora dessas doenças neste período de férias e aproximação do carnaval?
Mellanie - As pessoas precisam entender que não é o momento para aglomerações, infelizmente. Teremos muitos momentos para isso quando resolvermos esse cenário de crise, e só chegaremos mais rápido nesses momentos se aderirmos todos juntos e de forma coesa agora.
Podemos evitar um impacto grande dessa possível nova onda e tomar um caminho diferente do que vimos em outros países. Precisamos seguir ampliando o máximo que pudermos as coberturas vacinais (para 1ª, 2ª e 3ª doses), além da adesão de toda a população às medidas de enfrentamento. Combinando-as, reduzimos ainda mais os riscos.
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Edição: Ayrton Centeno