Na manhã desta terça-feira (7), vereadores integrantes da Bancada Negra da Câmara de Vereadores de Porto Alegre foram até a Delegacia de Crimes Cibernéticos para denunciar ameaças de morte recebidas por e-mail.
As ameaças de morte são direcionadas à todos os integrantes da bancada, porém, recebem especial ódio e são citadas primeiramente as vereadoras Karen Santos (PSOL) e Daiana Santos (PCdoB). Uma análise rápida do e-mail contendo as ameaças evidencia um certo padrão.
O texto das ameaças contêm narrativas semelhantes com outros e-mails ameaçadores enviados à outras figuras políticas femininas recentemente. Especificamente, duas afirmações coincidem: o autor afirma ter raiva por estar desempregado e por sua esposa estar com câncer de mama, estando os dois sobrevivendo do auxílio emergencial.
Além disso, outra coincidência é a afirmação de que o autor irá comprar uma arma em um Morro do Rio de Janeiro para matar as vereadoras e depois matar a si próprio:
"Enquanto vocês KAREN e DAIANA SANTOS se elegeram vereadoras e ganham uma fortuna para ficar propagando ideologia de gênero e o racismo contra brancos apenas por ser macacas, eu estou desempregado, minha esposa está com câncer de mama e vivendo do auxílio emergencial. Eu juro, mas eu juro que vou comprar uma pistola 9 mm no Morro do Engenho aqui no Rio de Janeiro e uma passagem só de ida para Porto Alegre e vou matar vocês duas. Eu já tenho todos os seus dados e vou aparecer ai na Câmara [...]", afirma o e-mail.
Além deste caso, também receberam ameaças com teor parecido a primeira vereadora negra eleita em Curitiba, Carol Dartora (PT) e a vereadora mais votada da história de Belo Horizonte, Duda Salabert (PDT).
Estou sofrendo ameaças de morte. Ontem recebi esse e-mail. E pior: o grupo odioso enviou esse mesmo email para a escola em que trabalho e para os donos e para a direção da escola. É uma estratégia não só para me intimidar, como também para forçar que a escola me demita. pic.twitter.com/FaayymIjin
— Duda Salabert 🌳 (@DudaSalabert) December 4, 2020
Grupos de ódio têm utilizado a identidade de uma outra pessoa
Os e-mails enviados para os integrantes da Bancada Negra têm como remetente o endereço "[email protected]", sendo assinado pelo nome Ricardo Wagner Arouxa. Além deste caso, muitos outros e-mails contendo ameaças semelhantes vêm sendo assinados com este nome.
Porém, conforme apurou a repórter Marie Declercq, do TAB/Uol, Ricardo Wagner Arouxa não é um nome falso, é uma pessoa que realmente existe e que vem afirmando nos últimos anos sua inocência com relação à esses muitos casos de ameaças racistas e misóginas.
Segundo afirma a reportagem, Arouxa é um alvo permanente de um grupo de ódio, que utiliza seu nome para praticar as ameaças. O motivo de seu nome ser utilizado se deve, segundo o próprio Ricardo, a uma desavença virtual com um dos líderes do grupo.
"A cada ameaça, ele faz o mesmo procedimento: entra em contato com a vítima para explicar a situação e aconselhar que ela faça queixa na delegacia. 'Já me acostumei', resume Arouxa sobre o trabalho de provar que não é o autor de ameaças e mensagens preconceituosas", relata a matéria.
Soubemos agora que Ricardo Wagner Aroucha, nome que assina o email das ameaças enviadas a mim e a outras parlamentares, é o nome de um rapaz que a princípio tem sido vítima do maior grupo de ódio do Brasil, o dogolachan, na Deep Web. A Polícia Federal está apurando o grupo.
— Talíria Petrone #TemGenteComFome (@taliriapetrone) December 7, 2020
Além da utilização do próprio nome de Ricardo, as informações contidas nas ameaças têm o intuito de incriminá-lo: segundo relata ele mesmo, o referido Morro do Engenho, onde supostamente poderia comprar uma pistola, fica perto de sua casa no Rio de Janeiro. Além disso, conforme relatou a professora Lola Aronovitch, a esposa de Ricardo realmente teve câncer de mama.
Porém, a utilização dessas informações e do nome de Ricardo não provam que é o mesmo grupo ou indivíduo que está por trás das ameaças aos integrantes da Bancada Negra de Porto Alegre. É possível que a estratégia possa estar sendo utilizada para os mesmos objetivos.
Os praticantes desse tipo de violência fazem uso do anonimato oferecido por ferramentas com conexões privadas ("Virtual Private Network" - VPN) ou como navegadores específicos para a camuflagem de rastros na internet. Conforme relataram os parlamentares porto-alegrenses, não é a primeira vez que este tipo de ameaça é feita. Além disso, afirmam que este ataque está inserido em um contexto nacional, onde personalidades que defendem direitos de minorias políticas vêm sendo sistematicamente ameaçados.
“É o aprofundamento da escalada da violência política, sobretudo contra parlamentares negras, que é praticada por grupos organizados da extrema-direita, que tentam se esconder através da internet e que são articulados pra intimidar quem denuncia e busca uma saída para os problemas do país. Os responsáveis devem ser identificados imediatamente”, afirmou a vereadora Karen Santos.
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Edição: Katia Marko