Em menos de três dias, abaixo-assinado on line já recebeu 4.470 assinaturas até o fechamento da matéria. Lançada pela Associação do Memorial Luiz Carlos Prestes, a campanha busca o apoio da sociedade gaúcha contra a alteração do nome do espaço.
Recentemente, a vereadora Comandante Nádia (DEM) ingressou com uma indicação ao Executivo para que envie um projeto propondo a supressão do nome do líder comunista, mudando para “Memorial Cidade de Porto Alegre”.
Essa não é a primeira vez que vereadores da direita tentam alterar o nome do memorial. No No documento a parlamentar justifica a indicação com um texto do ex-vereador Wambert di Lorenzo que em 2017, às vésperas da inauguração do local tentou mudar o nome do memorial para “Museu do Povo Negro”.
Normalmente as indicações passam pelas comissões e vão direto ao Executivo sem maiores problemas quando não sofrem rejeição, mas esta teve um empate na Comissão de Urbanização, Transportes e Habitação (Cuthab) e por isso irá para votação em Plenária.
Se aprovada, a indicação chegará ao prefeito Sebastião Melo, que poderá ou não enviar um projeto com o conteúdo proposto.
Manifestações de apoio
O abaixo-assinado já conta com assinaturas como do ex-vereador Vieira da Cunha (PDT), autor da lei de criação do Memorial Luiz Carlos Prestes, aprovada pela Câmara Municipal no ano de 1990, logo após o falecimento de Luiz Carlos Prestes (lei de 7 de junho de 1990, processo Nº 1185/90, PLCL 14/90). Em lei complementar (processo Nº 1185/90, PLCL 14/90) de 29 de junho de 1990, a Câmara autorizou o Executivo municipal a “edificar equipamento público de caráter cultural, denominando-o Memorial Luiz Carlos Prestes”, definindo a localização e as medidas do terreno cedido para construção do Memorial. Também assinaram, pelo PDT, Carlos Lupi e Ciro Simoni.
Também já assinaram o ex-deputado Adão Villaverde, e os ex-prefeitos Olívio Dutra e Tarso Genro, do PT. Como destaca o texto da petição, “não há nenhum motivo objetivo para rever as decisões da Câmara Municipal de 1990 e de 2008, bem como as decisões dos prefeitos Olívio Dutra (1990) e José Fogaça (2008) José Fortunati (2010-2016) Nelson Marchezan (2017) que as chancelaram, a não ser a sanha revanchista da proponente que espera com isso fazer publicidade junto à sua base”.
Única obra de Niemeyer em Porto Alegre
Como registrou matéria do Sul 21, quando da inauguração do espaço em 2017, pouco depois de comemorar seu aniversário de 100 anos, cercado de amigos, Oscar Niemeyer sentou-se em casa, em 2008, para escrever um artigo para o jornal Folha de São Paulo, em que explicava o projeto que havia acabado de desenhar naquele verão. Um Memorial ao amigo Luiz Carlos Prestes. Obra, segundo ele, “tão especial, que valia a pena explicá-la um pouco”.
Quando Niemeyer sentou-se para terminar o desenho, em janeiro de 2008, a ideia da homenagem a Prestes já completava uma estrada de quase 18 anos. Ele se dizia satisfeito em entregar um projeto que contribuiria para manter viva a memória de Luiz Carlos Prestes, “um brasileiro que lutou em favor de seu povo, contra a miséria e a desigualdade social”.
“O Memorial tem um tripé: homenagear o patriota, o revolucionário e o comunista. Ele é um espaço não de um grupo de comunistas, mas da cidade de Porto Alegre”, explica Edson Ferreira dos Santos, vice-presidente do Memorial Prestes, que participou das discussões sobre o projeto desde o início.
Segundo ele, a demora que acabou envolvendo o projeto foi causada, principalmente pela falta de verbas. “Em 1990, logo após a morte de Prestes, o então vereador Vieira da Cunha (PDT) apresentou um projeto de lei na Câmara de Vereadores com a proposta de um memorial em sua homenagem e o pedido de doação de um terreno à Prefeitura Municipal. A ideia nasceu entre amigos e pessoas que admiravam Prestes, que foi presidente de honra do PDT até o final da vida. Os únicos votos contrários, no Legislativo, vieram da bancada do PSD (atual PP). Em seguida, o prefeito Olívio Dutra (PT) sancionou o projeto e destinou um terreno na esquina das avenidas Ipiranga e Edvaldo Pereira Paiva para a obra.”
Edson lembra que com a área do terreno em mãos, o próprio Olívio, Vieira e mais um grupo de entusiastas da ideia, bateram à porta de Niemeyer. Amigo de longa data de Prestes, comunista, o arquiteto foi quem acolheu o gaúcho quando saiu da prisão, emprestando sua casa, no Rio de Janeiro, para que ele pudesse morar.
“Imediatamente, Niemeyer abraçou a causa e priorizou o trabalho. O que não era comum ele fazer. Em pouco tempo ele nos entregou o projeto, que se transformou no Memorial”, lembra Vieira da Cunha, contando sobre as reuniões que teve com o arquiteto, no apartamento dele, em Copacabana. “Mas ficou no papel durante muitos anos porque não se conseguiu viabilizar os recursos necessários para executar a obra”.
O projeto só voltou a andar em 2008, por um movimento inusitado. Precisando de um terreno bem localizado para erguer sua sede, a Federação Gaúcha de Futebol (FGF), veio como único meio de viabilizar o Memorial. Em troca de o Memorial Prestes ceder uma parte do terreno à Fundação por 90 anos (com contrato renovável por outros 90 anos), a Fundação bancaria os custos da construção e manutenção do Memorial.
“Como a área é pública, passamos um projeto de lei para a Câmara Municipal, explicamos o motivo, que a partilha se daria com a responsabilidade da FGF de edificar o Memorial”, diz Edson. As obras começaram em 2012 e, apesar de poucos eventos e algumas visitas especiais, como a da ex-presidente Dilma Rousseff (PT), em novembro de 2016, o Memorial teve a data de abertura das portas alterada diversas vezes. Até outubro de 2017.
Segundo Edson, a construção do Memorial não custou um centavo ao erário municipal. “Ele foi construído e gerenciado fielmente conforme os ditames da lei aprovada pela Câmara Municipal, e às intenções do autor do projeto.”
Campanha defende a História
“Sempre tem uma classe do povo gaúcho que, para eles, não interessa ter um espaço que traga a memória, a história, mostrada com fotos, inegáveis do pensamento e da obra de Luiz Carlos Prestes e de Oscar Niemeyer. Recebemos muitos ataques, de algumas pessoas desses segmentos mais violentos, pessoas inflexíveis, que não suportam a opinião diferente da sua”, afirma Goretti Grossi, da direção de arte e cultura da Associação.
Ela conta que, primeiro, foram os ataques ao próprio prédio, e depois começou o ataque de tentar tirar dos prestistas o memorial para entregar a alguém que transformaria o local “em uma loja de vender qualquer coisa”. “Aqui não é um espaço comercial, aqui é um memorial para as pessoas conhecerem um pensamento, uma história, um lugar de encontro, de estudo, de debate”, destaca.
Na época da inauguração o bisneto de Niemeyer, que também assinou o projeto, afirmou que não existiria nenhuma possibilidade de ver o prédio transformado em outra coisa que não uma homenagem a Prestes. “Você pode questionar, mas o museu foi feito especificamente para o Memorial Prestes. Só no Brasil que existe essa propensão ao desrespeito ao que é a História do país.”
O Prestes é uma referência mundial da luta contra o fascismo, da luta pelos Direitos Humanos, da luta pela soberania do Brasil, afirma Goretti. “Neste momento é muito importante a gente conhecer não só a história do Prestes, que é, também, a história da luta da classe trabalhadora brasileira. A gente vê nas fotografias registradas nas paredes do memorial o povo brasileiro na rua comemorando a derrota do fascismo, do nazismo, a gente vê esse povo da periferia, das favelas, das escolas de samba, dos clubes de futebol, esse povo na rua com as suas lideranças políticas lutando e comemorando pela vitória dos avanços da democracia e da igualdade social, da luta pela vida e dos Direitos Humanos”, aponta.
Para Goretti o povo brasileiro que redescobriu Zumbi não faz muito tempo precisa ainda conhecer Luiz Carlos Prestes, que, infelizmente, nos livros de história da escola pública e privada, consta uma ou duas linhas referentes à Coluna Prestes, “uma parte bem pequena diante da grandiosidade do todo que foi a vida e a luta e o pensamento de Prestes”, ressalta.
As fotos que circundam as paredes do memorial registram a trajetória do político, desde a casa dos seus pais, sua juventude como militar, passando pela Coluna Prestes, o período em que viveu na antiga União Soviética, as prisões no governo Vargas e durante a Ditadura Militar, e a atuação política dentro do Partido Comunista. As fotos foram cedidas por Anita Leocácia Benário Prestes, filha de Luiz Carlos e Olga Benário Prestes, morta em uma câmara de gás, durante o nazismo de Hitler, em 23 de abril de 1942. Anita também se manifestou em defesa do memorial em vídeo postado no Instagram.
Para apoiar a campanha, acesse aqui o abaixo-assinado.
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Edição: Katia Marko