A trajetória de luta e compromisso com o povo do MAB continua, 30 anos depois, ‘plantando sonhos’
O MAB, Movimento dos Atingidos por Barragens, pontua, no ano dos seus 30 anos bem vividos, sete consequências da lei que autoriza a privatização da Eletrobras. O MAB defende que a energia “deve ficar a serviço de um projeto energético popular que garanta soberania, distribuição da riqueza e controle do povo. Serão sete as consequências imediatas: tarifaço nacional na conta de luz, desindustrialização, geração de desemprego, destruição da soberania nacional, aumento de apagões, privatização da água, destruição ambiental, violação dos direitos dos atingidos. O povo trabalhador será a grande vítima dessa iniciativa do atual governo” (Brasil de Fato, 14.07.2021).
O final dos anos 1970, início dos 1980 foi de grande efervescência. Era tudo ao mesmo tempo, na luta pela redemocratização do Brasil e por direitos de trabalhadoras e trabalhadores: greves, metalúrgicos do ABC e bancários de Porto Alegre, Oposições Sindicais no campo e na cidade, CEBs (Comunidades Eclesiais de Base), CPT (Comissão Pastoral da Terra), PO (Pastoral Operária), a PJ (Pastoral da Juventude), Teologia da Libertação, ANAMPOS (Articulação Nacional dos Movimentos Populares e Sindical), CONCLAT (Conferência Nacional da Classe Trabalhadora), CRAB (Comissão Regional dos Atingidos por Barragem), fundação do PT, da CUT, MST, Diretas-Já, Constituinte e muitas coisas mais.
Neste contexto, em março de 1983 foi fundada uma ONG, o CAMP, Centro de Assessoria Multiprofissional, para ajudar a construir e consolidar as organizações sociais, reforçar as lutas e a participação popular, com referência na pedagogia libertadora de Paulo Freire.
Cabem aqui referências e declarações encontradas na Revista CAMP, Centro de Assessoria Multiprofissional, 1983-1998, comemorativa dos seus primeiros 15 anos. Está na Revista, nas páginas 4 e 5: “1978/82: COMO PLANTAR SONHOS. Para finalizar, um toque do campo: a luta pela terra e contra as barragens, que começou ainda na década de 70, e contou desde o começo com a presença de João Pedro Stédile.”
Nas palavras de Selvino Heck, na mesma Revista, p. 7: “Na segunda sede na rua São Manoel, o CAMP assessorava o MST e a Comissão de Atingidos por Barragens. Lá conheci o hoje deputado Ivar Pavan (PT). A Secretaria Nacional do MST funcionava dentro da sede do CAMP.”
Diz João Pedro Stédile na Revista, p. 12: “Nesse cenário é que começam a se rearticular os movimentos sociais e em particular o movimento operário, com as Oposições Sindicais, com o trabalho de formiguinha dentro das fábricas e o movimento do campo, com a retomada da luta pela terra, com os sindicatos de trabalhadores rurais, com a luta pelo preço e com o surgimento do Movimento dos Atingidos pelas Barragens.”
Diz ainda a Revista dos 15 anos do CAMP, p. 14: “Projeto DESENVOLVIMENTO PARA A REGIÃO ALTOS DA SERRA: Mas o envolvimento do CAMP com a região não é recente. O primeiro momento desta trajetória começou ainda no final dos anos 80 com o Fórum da Luta pela Terra, quando os movimentos sociais se reuniram para analisar a região. Foi lá também que começou a organização da Comissão Regional dos Atingidos pelas Barragens (CRAB), em 1985.”
Por iniciativa da CPT e movimentos sociais da região, em função da construção de uma barragem entre Machadinho/RS e Itá/SC, criou-se a CRAB, Comissão Regional dos Atingidos por Barragens do Alto Uruguai, envolvendo lideranças e famílias de diferentes municípios da região, e estendendo-se por toda extensão do rio Uruguai, até Itapiranga/SC, na luta contra a expulsão e perda das terras pelos moradores atingidos.
Paulo Freire e a educação popular freireana estavam presentes e visíveis em todo processo de luta e organização social e popular, com uma visão de desenvolvimento com inclusão social, de cuidado com a natureza, a construção de uma sociedade justa, democrática e igualitária, de baixo para cima, com prioridade para as trabalhadoras e os trabalhadores, especialmente os mais pobres, os que não têm direitos e que no Brasil nunca tiveram nem vez nem voz.
O MAB, quando surgiu como Movimento nacional em 1991, assumiu-se como “movimento autônomo, de massas, de luta, com direção coletiva em todos os níveis, com rostos regionais, sem distinção de sexo, cor, religião, partido político ou grau de instrução. Um movimento popular, reivindicatório e político”.
Esta trajetória de luta e de compromisso com o povo do MAB continua, 30 anos depois, ‘plantando sonhos’, na construção de um projeto popular de Brasil. A boa luta continua, pois, contra as privatizações, por direitos, por justiça, por igualdade, por democracia, por soberania.
Em 2021, ano do centenário de Paulo Freire, na boa luta, é preciso ESPERANÇAR, com trabalho de base, com formação na ação, e construir o inédito viável, o cuidado com a Casa Comum, a utopia da transformação, o sonho de um outro mundo possível, urgente e necessário.
Longa vida para o MAB!
* Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.
Edição: Katia Marko