Antes da pandemia, num evento no Clube de Cultura de Porto Alegre, encontrei os velhos amigos Eugênio Neves e Celso Schröder. Conversa vai, cerveja vem, coincidimos que não era possível os cartunistas estarem sem um projeto editorial coletivo contra Bolsonaro-Guedes. Algo como o Pasquim, nos anos 1970.
Passou um tempo, tive uma temporada de muito pessimismo, mas os operosos Schröder e Eugênio, não. Continuaram a conversar e articular essa ideia. Tentaram outra publicação, que não prosperou, e então se voltaram para este nosso projeto, com o Marco Antônio Schuster, Bruno Cruz e os Leandros Bierhals e Dóro.
Vem de muitas e coincidentes conversas, o Grifo: sairmos de nossos negócios pessoais e voltarmos a enfrentar o "neoliberalismo tardio" e o fascismo através de um jornal de humor.
Há dez meses reunimos cartunistas, chargistas, ilustradores, artistas plásticos, articulistas, poetas, cronistas brasileiros e estrangeiros para essa empreitada. Sem circulação de dinheiro, diga-se. Ninguém paga, ninguém recebe. Entregamos tempo e arte de graça para realizar algo em que temos muita fé.
Há gente incomodada com o bolsonarismo-guedismo que continua trabalhando nas suas coisas, torcendo que algo aconteça, desde que caído do céu ou das urnas. Outros não têm esperança e paralisaram-se na impotência. Mas há quem acredite que se isso continuar crescendo, não haverá futuro nem condições de sobrevivência. Então, mova-mo-nos (epa!).
Isso é o Grifo, seguidor do bravo jornalismo de resistência, como o Brasil de Fato, e filho do humor impresso dos anos 70/80, um dos tantos momentos em que artistas se reuniram para enfrentar a matriz do cotidiano de desemprego, privatizações, destruição das políticas públicas e do próprio Estado. "Mais por velhos que por diabos", não conseguimos ficar tratando apenas de nossas próprias vidas enquanto a direita destrói o país e o mundo. É como se ela própria nos chamasse para nos envolvermos na disputa por visões de mundo. Omitir-se nesta hora é, literalmente, entregar o ouro para os bandidos.
Não somos um grupo político, nem braço de um partido ou de candidato, isso é outra instância; de ordem pessoal. Em comum temos apenas a rejeição ao fascismo, ao neoliberalismo, à violência, ao preconceito. E nos opomos a quaisquer que o defendam. Vai daí que no Grifo estamos fazendo, com nossas expressões artísticas, uma barreira, pequena que seja, com humor.
Antes de mais nada, o Grifo é um jornal eletrônico de humor gráfico. Necessita de beleza plástica, de qualidade artística. Ao final de cada edição temos registrado o prazer, a felicidade e o orgulho pelo resultado alcançado número a número. E também por estarmos trabalhando com velhos e novos amigos que admiramos.
Na tarefa de edição do Grifo estão diretamente envolvidos o editor chefe Marco Antônio Schuster, Bruno Cruz, Caco Bisol, Celso Schröder, Lú Vieira, Rodrigo Schuster e a voz que vos fala.
Em maio do próximo ano completarei 50 anos de minha chegada à Rádio Continental de Porto Alegre, um marco bem humorado da mudança que a Comunicação produziu para resistir, sobreviver e contribuir para a derrota da ditadura de então. Não deve ser coincidência que, meio século depois, eu tenha voltado a trabalhar em um grupo de humoristas. Porque, contra o fascismo e suas ideias políticas e econômicas, isso é necessário.
* Jornalista, editor-adjunto do Grifo.
** Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.
Edição: Katia Marko