A 15ª edição do anuário produzido pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública apresentado ontem, 15, registra recorde de letalidade policial e o aumento de assassinatos em plena pandemia.
Com base nas estatísticas criminais apresentadas, também houve alta de 21% em crimes de lesão corporal dolosa (1.169); 25% em homicídios (121) e 20% notificações de estupros (88) contra pessoas LGBTQIA+ em 2020.
Uma informação que chama a atenção, no entanto, é a inexistência de dados focados nessa comunidade em sete estados da federação: Rio de Janeiro, Minas Gerais, Mato Grosso do Sul, Maranhão, Ceará, Rondônia e Rio Grande do Sul.
Apesar de verificada a alta na violência contra a população LGBT no país, nesses estados não existem registros sistematizados deste tipo de ocorrência.
No Rio Grande do Sul, por exemplo, em que o governador fez história ao se declarar publicamente gay em rede nacional, a diretora da Divisão do Idoso e Combate a Intolerância da Polícia Civil gaúcha, Andrea Mattos, é transparente: “Nós não tínhamos até uns quatro meses atrás como fazer essa busca pelo nosso sistema como fato individualizado”.
Segundo a delegada, que acumula a função de primeira titular da Delegacia de Combate a Intolerância de Porto Alegre (DPCI), a preocupação da melhor apuração desses números só foi contemplada a partir da criação do Departamento de Proteção aos Grupos Vulneráveis, depois do funcionamento efetivo da divisão do idoso e, principalmente, do surgimento da Delegacia de Combate a Intolerância de Porto Alegre, em dezembro passado.
“Não havia um atendimento individualizado. Agora tem e isto é maravilhoso”, comemora.
A delegada destaca que “mudanças em um sistema informatizado não é uma coisa tão simples”. Mas, segundo ela, hoje os campos homofobia e transfobia, por exemplo, já estão operacionais. “O policial que fizer o registro em qualquer lugar do estado consegue fazer essa classificação”, diz.
Caio Klein, diretor executivo da Somos – Comunicação, Saúde e Sexualidade, comemora os avanços, mas diz que ainda há muito que melhorar no atendimento de segurança à comunidade LGBTQIA+.
Diante de um Congresso que não enfrentou ainda a discussão sobre a penalização aos crimes de ódio voltados a essa população, Klein lembra que o Supremo Tribunal Federal (STF) considera a aplicação da Lei sobre o racismo às vítimas LGBTQIA+.
Além dessa espécie de “gambiarra jurídica”, o dirigente da Somos acrescenta ainda duas questões estruturais.
A primeira se refere a resistência que ainda existe entre os policiais de registrar adequadamente esses crimes de ódio. “É mais ou menos aquela lógica da punibilização da vítima”, fala. “Isso só se vence ao trabalhar a qualificação desses agentes”, entende.
Na segunda questão, Klein, aponta que ainda não existe no sistema policial um espaço onde a vítima possa se identificar como se reconhece. “Eu, como gay, não consigo me categorizar”. Segundo ele, isso, na hipótese de um homicídio de uma travesti, por exemplo, quando os dados forem extraídos, será apresentado o assassinato de um homem, o que geraria de certa forma um desencontro de dados.
A delegada Andrea confirma o declarado por Klein. “Obviamente nós coletamos essa informação no inquérito, mas esse campo ainda está em planejamento para adesão ao sistema”, conclui.
Edição: Extra Classe