A mística é fundamental para manter a humanidade e aceso o fogo revolucionário
“Não são apenas a razão e a teoria que informam o militante revolucionário, que o levam à luta, ao compromisso, ao sacrifício, à dedicação. Mas o que eu chamo de ‘mística’, ou pode ser chamado de paixão (não esquecendo as diferenças das duas expressões). Sem mística, sem paixão não se faz política, ou esta torna-se insossa, desbotada, não-humana.
A mística é o que sustenta a vida, o que a alimenta, o que a recheia, o que a informa do transcendente. O que faz uma bandeira, um gesto, uma ação coletiva serem estimuladores, confortadores, darem um sentido novo e mais amplo ao que foi realizado. O que faz brotar a alegria, a certeza do caminho bem percorrido. O que enche o espírito de satisfação e de vontade de seguir na luta com mais decisão e empenho” (Selvino Heck, em Mística e Política, abril de 1990).
Diz o Papa Francisco na sua Encíclica Fratelli Tutti: “Envolver-se na política é uma obrigação para os cristãos. Nós, cristãs e cristãos, não podemos nos fazer de Pilatos e lavar as mãos. Devemos nos envolver na política porque a política é uma das formas mais elevadas de caridade, porque ela procura o bem comum. A política é um compromisso de humanidade e santidade. Na política há também lugar para amar com ternura. Em que consiste a ternura? No amor, que se torna próximo e concreto. É um movimento que brota do coração e chega aos olhos, aos ouvidos e às mãos. A ternura é o caminho que percorreram os homens e as mulheres mais corajosos e fortes.”
Profetiza ainda o Papa Francisco: “Política é caridade. Trata-se de avançar para uma ordem social e política, cuja alma seja a caridade social. Convido mais uma vez a revalorizar a política, que é uma sublime vocação, é uma das formas mais preciosas de caridade, porque busca o bem comum.”
Em 24 de junho de 1989, há 32 anos, foi fundado o Movimento Fé e Política, como um movimento ecumênico, não confessional e não partidário, com o objetivo de fazer avançar a reflexão política e a vida espiritual dos que estão comprometidos com uma prática política e social. Está aberto a todas as pessoas que consideram a política uma dimensão fundamental na vivência de sua fé, e a fé o horizonte de sua utopia política (Ver Carta de Princípios e outros textos e análises do Movimento Fé e Política em www.fepolitica.org.br. Ver também o livro ‘Fé e Política: uma trajetória’, de Pedro A. Ribeiro de Oliveira, Editora Quatro Irmãos, de julho de 2018).
Escrevi em ‘Ética e Política’: “Trata-se, desde logo, de afastar qualquer sentido moralista a esta dimensão ética da política. Não se faz política de forma moralista. A ética, sim, sempre deve estar sempre junto da política.
Temos uma dupla tarefa: destruir as formas tradicionais de fazer política, bem conhecidas e crescentemente repelidas pela sociedade; e construir uma nova forma de fazer política, onde não se repitam as práticas burguesas, tampouco as esclerosadas e estreitas práticas tradicionais. São-nos colocados novos problemas, desafios que permanecem ao longo do tempo.
Sem dúvida nenhuma, a prática de hoje é garantidora da prática de amanhã. Quem hoje constrói um partido ou a política sem ética, ou na sua prática não leva em conta a ética política e partidária, amanhã, em governos, Parlamentos e espaços públicos, incorrerá nos mesmos erros e equívocos. Não disputamos apenas o Estado, o Parlamento ou o Poder como tal, embora esta seja a disputa principal. Disputamos também a credibilidade, a confiança numa determinada prática e em determinados valores, totalmente subvertidos e liquidados na atual cena política brasileira. Disputamos, enfim, a hegemonia em todos os setores da sociedade” (Selvino Heck, em Ética e Política, abril de 1990).
Nos anos 2020, já com mais de 30 anos de vida e história, na sua perspectiva de futuro, e com o surgimento de muitas Escolas de Fé e Política em todo Brasil, o Movimento Fé e Política tem-se dedicado à construção de uma ‘Rede brasileira de Fé e Política, com uma espiritualidade libertadora a serviço da vida plena. Vida plena é a proposta do BEM VIVER, assumida como referência de cuidado com a Casa Comum, com a natureza e com todos os seres vivos’ (Detalhes em www.fepolitica.org.br).
“A mística é fundamental para manter a humanidade e aceso o fogo revolucionário. São elementos fundamentais da mística na política: ternura e afetividade; a gratuidade: a indignação, a revolta, o inconformismo; a alegria e a generosidade; a busca da verdade; o homem novo, a mulher nova” (Selvino Heck, em Mística e Política, abril de 1990).
Nos tempos atuais, especialmente no Brasil, onde muitas vezes a ética e a política, a mística e a política não caminham juntas, lado a lado, de mãos dadas, os caminhos, a visão de mundo, os valores e as práticas do Movimento Fé e Política continuam vivos na mística da militância e nas vivências de lutadoras e lutadores na construção da utopia do Bem Viver, com democracia, direitos, igualdade, justiça, fraternidade.
* Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.
Edição: Katia Marko