Rio Grande do Sul

Educação

Movimento em defesa do direito à educação entrega dossiê contra homescholling 

Entidades estão mobilizadas para que o governo do estado vete o projeto de lei aprovado na Assembleia no último dia 8

Brasil de Fato | Porto Alegre |
Entidades entregaram dossiê na tarde desta segunda-feira (21) - Nabor Goulart/Casa Civil

“Esse projeto atinge a legislação educacional, a qualidade de ensino, a pluralidade de ideias e posturas, o direito de acesso à educação. Um retrocesso inimaginável.” A afirmação é da diretora do Sindicato dos Professores do Ensino Privado (Sinpro/RS), Cecília Farias, uma das entidades que compõe o movimento contra o ensino domiciliar no Rio Grande do Sul.

Aprovado na Assembleia Legislativa, no dia 8 de junho, por 28 votos a favor e 21 contrários, o Projeto de Lei nº 170/2019, de autoria do deputado Fábio Ostermann (Novo), que regulamenta o homescholling no estado, segue agora para sanção do governador. Diante disso as entidades que compõe o movimento entregaram um dossiê ao governador Eduardo Leite (PSDB), sobre os prejuízos da modalidade à educação. 

Caso seja sancionado pelo governador, ou que a Assembleia derrube um possível veto do Executivo estadual, o RS pode ser o primeiro estado a regulamentar a modalidade. Em nível nacional, recentemente a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara aprovou um projeto de autoria da deputada Bia Kicis (PSL-DF) que tem o objetivo de descriminalizar a educação domiciliar. 

Sem regulamentação federal, a proposta permite que crianças e adolescentes sejam ensinados por meio da educação domiciliar, sob o encargo dos pais ou responsáveis. Para os integrantes do movimento o projeto, além de ser uma medida que enfraquece a efetividade do Estado enquanto garantidor de direitos, também tem impactos negativos da sociabilização das crianças e adolescentes. 

“A escola tem duas funções básicas: uma é permitir uma situação permanente e contínua de interação com o outro, que é alguém diferente. A outra é de ser um lugar de compartilhamento de conhecimentos e de conteúdos. Há um tipo de aprendizagem que só acontece no ambiente escolar”, escreveu a deputada estadual Sofia Cavedon, em manifesto entregue essa tarde, juntamente com o dossiê, que reúne posicionamento de diversas entidades, para o governo do estado. 

Entre os documentos entregues que compõe o dossiê, está uma análise do Conselho Estadual da Educação. “A escola tem papel fundamental na formação dos sujeitos, assim como o compromisso de proporcionar ações para a efetivação dos direitos sociais, possibilitar aprendizagem em todas as dimensões do ser humano e oferecer alternativas para a construção da cidadania, por meio da participação e da convivência com a diversidade”, diz o documento. 


Para os integrantes do movimento o homescholling tem impactos negativos na sociabilização das crianças e adolescentes / Foto: Mari Martinez

Para o Comitê Popular Estadual de Acompanhamento da Crise Educacional do RS, o homeschooling é uma medida que enfraquece a efetividade do Estado enquanto garantidor de direitos. “Além disso, sua aprovação simboliza o desincentivo da sociedade em exigir do poder público a redução das desigualdades sociais, o que pode acarretar no aumento da precariedade do ensino público e também o enfraquecimento das instituições”, afirma. 

Na avaliação do Sinpro, em manifesto entregue junto ao dossiê, a entidade destaca que a escola é espaço de socialização e aprendizagem planejada e executada por profissionais com formação adequada a atender às diversas demandas trazidas pelos docentes e que são fundamentais na sua trajetória de vida. “Essa formação é imprescindível, conquistada em cursos de licenciatura em nível superior e, muitas vezes, em pós-graduação, o que qualifica em muito o trabalho desempenhado”, frisa.

No estado, participam do movimento contra o ensino domiciliar, além do Sinpro, o Sindicato dos Professores da rede estadual de ensino (Cpers/Sindicato), o Conselho Estadual de Educação (CEEd/RS), o Sindicato dos Estabelecimentos de Ensino Privado (Sinepe/RS), o Conselho Regional de Psicologia, a União dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime), os conselhos municipais de Educação de Porto Alegre e de Alvorada (CME/POA e CME/Alvorada), a União dos Conselhos Municipais de Educação (Uncme/RS), a União Brasileira dos Estudantes Secundaristas (Ubes), a Faculdade de Educação da Universidade Federal (Faced/Ufrgs) e o Fórum Gaúcho de Educação Infantil (FGEI); além dos mandatos da deputada federal Maria do Rosário, do vereador Jonas Reis, da ex-deputada Stela Farias e da assessoria da Bancada do PT na ALRS.

De acordo com o Chefe da Casa Civil, Jonatan Brönstrup, que recebeu as entidades participantes do movimento e ouviu as manifestações contrárias das entidades, o governador irá estudar profundamente o assunto e se basear nos argumentos técnicos e científicos, mas que ele não iria dar a posição do governo neste momento. O governador deve tomar uma decisão até o dia 1º de julho. Caso não o faça, a lei poderá ser promulgada pela presidência da Assembleia.

Em reportagem do Sul21, a promotora Luciana Casorotto, coordenadora do Centro de Apoio Operacional da Infância, Juventude, Educação, Família e Sucessões do Ministério Público do Rio Grande do Sul (MP-RS), explicou que, caso a legislação seja sancionada pelo governador, caberá ao procurador-geral de Justiça do Estado, Marcelo Dornelles, analisar a constitucionalidade da lei e avaliar se o Ministério Público tomará medidas que entender cabíveis para contestar a promulgação, caso a considere irregular.

Segundo ela, a proposta de regulamentação do homeschooling pela Assembleia é ilegal, defendendo que a regulamentação da matéria poderia ser feita apenas pelo Congresso Nacional. A promotora destaca ainda que o o órgão é “radicalmente contra o homeschooling na forma como está hoje”. “É algo ilegal, que pode, inclusive, ser passível de punição criminal, porque é um abandono intelectual de um filho deixar sem a matrícula na escola regular.”

O Brasil de Fato RS fez também uma reportagem onde ouviu partes contrárias ao modelo de ensino. “Nada justifica o homescholling. É interessante porque os mesmos que hoje querem o homescholling são os que chantagearam o governador para abrir as escolas presenciais ou então não votariam no projeto que definiria o plebiscito ou não [para privatização de estatais] no nosso estado. A incoerência dessas pessoas é algo lastimável”, afirmou a presidenta do CPERS - Sindicato, Helenir Aguiar Schürer. 


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Edição: Katia Marko